Da escassez de pessoas: breve nota sobre PRR e os próximos anos

Para o acesso a pessoas com talento verifica-se um elevado pessimismo. Pessimismo porque pessoas com talento não são, normalmente, fáceis de encontrar.

Em recente conferência, o senhor ministro da Economia e do Mar, a propósito dos desafios com a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), afirmava: “O nosso conhecimento não está refletido nos processos produtivos. Temos de incorporar mais produto nacional, mais inovação, mais conhecimento. Isso é vital para o nosso crescimento. Temos que capturar e reter talento nas empresas. Investir na qualificação das nossas pessoas.”

O impacto deste excerto não está no seu conteúdo, que não é novo, mas sim no contexto temporal em que é apresentado, este sim novo. Em concreto, o contexto do PRR na sua expetativa de desenvolvimento do produto nacional e para o qual é determinante a participação das nossas pessoas, com talento. Um PRR em que os primeiros 13 contratos das Agendas Mobilizadoras para a Inovação Empresarial foram assinados no passado 23 de julho.

Estes 13 fazem parte dos 51 consórcios selecionados, compostos por 1226 entidades, incluindo 933 empresas e 111 entidades do ensino superior. Em modelo de governo inovador, perspetivam-se soluções transformadoras em áreas como a saúde, floresta, energia, aeronáutica, vinho, plásticos, agroalimentar, automóvel, mobilidade, ferrovia e videojogos.

Um PRR com vários desafios, mas um, em particular, que resulta da disponibilidade, ou não, de pessoas com talento: a obrigatória execução até 31 de dezembro de 2025. A uma distância de três anos e meio podemos percecionar suficiente tempo para a execução.

Perceção arriscada ou mesmo errada, se inventariarmos alguns fatores do contexto atual; como por exemplo a disrupção das cadeias de abastecimento, tornando mais moroso ou mesmo inacessível o acesso a equipamentos e materiais necessários à execução; ou, um outro exemplo, a volatilidade e inflação dos preços dos mesmos equipamentos e materiais, tornando previsões de há um ano, momento em que as entidades submeteram as suas candidaturas ao PRR, desfasadas dos preços atuais.

Para estes, as entidades procurarão soluções de cobertura de risco e garantia de acesso. No entanto, para o acesso a pessoas com talento verifica-se um elevado pessimismo. Pessimismo porque pessoas com talento não são, normalmente, fáceis de encontrar. Pessimismo porque pessoas, com ou sem talento, não têm estado disponíveis no contexto atual.

As dificuldades de recrutamento de pessoas já não estão restritas às funções mais procuradas, como o IT ou a área da saúde. Com uma taxa de desemprego ligeiramente abaixo dos 6%, nos últimos meses, crescem o número de empresas e outras entidades a testemunharem falta de pessoas para funções operacionais. É neste contexto de elevada escassez de pessoas que os investimentos relevantes do PRR se perfilam para serem executados até 31 de dezembro de 2025; um contexto ao qual o PRR vem acrescer uma maior exigência.

Exigência não apenas de pessoas para assegurar, numa primeira fase, a montagem de novas unidades de produção ou centros de serviços, mas sobretudo de pessoas, como referia o senhor ministro da Economia e do Mar, que incorporem o seu conhecimento nos produtos e serviços inovadores que as 1226 entidades ambicionam desenvolver e colocar no mercado até 31 de dezembro de 2025. São três anos e meio que nos parecem curtos para tamanho objetivo.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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