Uma Volta a França com bicicletas, mas sem “comboios”

Era comum a presença de várias equipas na tentativa de levarem os seus “comboios” até perto da meta, para um final ao sprint em pelotão compacto. Em 2022, essa foi uma imagem rara, mas com explicações lógicas.

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Jaspes Philipsen venceu a etapa 15 num sprint em pelotão compacto EPA/YOAN VALAT

A Volta a França 2022 tem sido apontada por muitos como a mais animada e interessante dos últimos anos. Os motivos são variados, mas há um que indirectamente poderá espoletar esta noção particular de espectáculo – a falta de finais em pelotão compacto. Este Tour acabou com quatro finais em pelotão compacto com sprint entre velocistas – já tinha havido três e houve também na última etapa, em Paris.

A viagem do PÚBLICO por registos do site Procyclingstats obrigou-nos a ir até ao já longínquo ano de 2002 para encontrar uma edição tão pobre em finais com os chamados “comboios” das equipas com ciclistas mais rápidos.

Nesse ano, na corrida ganha por Lance Armstrong, foram quatro etapas com finais deste tipo: duas arrebatadas por Robbie McEwen, uma por Erik Zabel e outra por Óscar Freire.

De resto, foi um suplício para os velocistas, tal como foi esta edição de 2022 – ficará na história o sprint solitário de Fabio Jakobsen numa chegada em alto, para evitar, por poucos segundos, chegar fora do tempo de controlo e ser desclassificado.

Porquê tão poucos sprints?

As explicações para este fenómeno poderão ir além de uma simples anomalia estatística e não criada por factores específicos.

O motivo mais evidente é o desenho das etapas. Acusada durante muitos anos de proporcionar muitas jornadas sonolentas e com acção só nos últimos metros, a organização do Tour tem tentado, à semelhança de italianos e espanhóis, evitar as etapas 100% planas – algo que seduz ciclistas de vários predicados a tentarem a sua sorte em fugas ou ataques a alguns metros da meta (Christophe Laporte, na antepenúltima etapa, foi o último exemplo disso).

Também as novas regras da UCI sobre descidas e subidas ao World Tour obrigam várias equipas – sobretudo as que mais precisam de pontos – a serem mais ofensivas e audazes na estrada. É nas “grandes voltas” que mais valem os triunfos em etapas e esses pontos podem fazer a diferença entre a “piscina dos grandes” ou uma descida de divisão.

Por fim, outro factor poderá ser a nova fornada de ciclistas menos dados à resignação. Wout van Aert, Mathieu van der Poel, Julian Alaphilippe, Matej Mohoric, Biniam Girmay, Tom Pidcock, Lennard Kämna ou mesmo voltistas ofensivos como Tadej Pogacar ou João Almeida são alguns dos que correm, em 2022, diferente do que se corria em 2005, 2010 ou mesmo 2015. Os ciclistas estão diferentes e o ciclismo, por extensão, muda com eles.

Este factor vai até ao encontro de um dado curioso que sai do levantamento acerca dos finais em pelotão no Tour: desde 2017, o número de finais sprint compacto reduziu todos os anos – dez em 2017, depois nove, oito, sete, seis e três em 2022.

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