Não houve milagre na Volta a França

No contra-relógio deste sábado, Vingegaard só precisava de gerir, mas prestou-se ao risco (e apanhou um valente susto na parte final do percurso), para mostrar que é tão bom ou melhor do que Pogacar em qualquer terreno.

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Vingegaard em acção no Tour EPA/GUILLAUME HORCAJUELO

Tadej Pogacar venceu a Volta a França 2020 fruto de um desempenho tão incrível como inesperado no contra-relógio final da prova. Na altura, “roubou” a camisola amarela a Primoz Roglic, escrevendo uma das páginas mais notáveis e inusitadas da história do Tour.

Para este sábado, alguém esperava façanha semelhante? Provavelmente, ninguém. E Jonas Vingegaard e Tadej Pogacar trataram de o justificar. O dinamarquês partiu para o “crono” com 3m26 de vantagem para o esloveno, o que significava que teria de perder cinco segundos por quilómetro para acabar o dia sem a amarela. Isso esteve longe de acontecer e, no fim do dia, a diferença não só não foi reduzida como até cresceu ligeiramente.

Esta é uma forma detalhada de dizer algo bastante simples: caso não tenha nenhum azar, Jonas Vingegaard é o novo campeão da Volta a França.

Líder arriscou

Para a etapa deste sábado foi dito que Vingegaard teria de ter pelo menos um minuto de vantagem para Pogacar, sob pena de a camisola amarela ser “roubada” pelos melhores predicados do esloveno na luta contra o cronómetro. Mas talvez não seja bem assim.

Neste “crono”, Vingegaard só precisava de gerir sem qualquer risco (e apanhou um valente susto na parte final do percurso), até porque para ficar sem a amarela teria de perder uns bizarros cinco segundos por quilómetro.

Apesar de saber disso, o dinamarquês prestou-se a uma “luta de galos”, procurando mostrar que: 1) é melhor na montanha; 2) é tão bom ou melhor no contra-relógio; 3) não precisa da poderosa Jumbo para estar a par ou acima de Pogacar – algo também muito veiculado nos últimos dias.

Não só não houve milagre com um eventual golpe de teatro neste sábado como a própria vitória de Vingegaard esteve longe de ser um milagre. E esta intenção ofensiva do dinamarquês pode ser vista como o início do Tour 2023, na medida em que Vingegaard quer mostrar que não é apenas na montanha que é um adversário à altura – vai obrigar Pogacar e demais rivais a atacarem mais forte nas subidas, não podendo contar com o contra-relógio como palco garantido para ganho de tempo.

Há quem não concorde que a última etapa seja de consagração do vencedor e que ninguém possa atacar o líder, mas, neste caso, nem se coloca a polémica: com ou sem ataque (e não vai, por certo, fazer a mínima tentativa), Pogacar não vai conseguir tirar este título a Vingegaard.

Van Aert, outra vez

Se a luta pela amarela não trouxe qualquer surpresa, o mesmo pode dizer-se da luta pela etapa. Não é difícil prever quem arrebatou o contra-relógio, já que foi o homem que venceu a etapa 4. E a 8. E ficou em segundo lugar em mais quatro dias.

Foi também quem levou a camisola verde. E, a talhe de foice, foi igualmente quem “rebocou” colegas de equipa, quem partiu grupos em terrenos montanhosos e quem andou em fuga sempre que pôde. No fundo, quem venceu este contra-relógio foi a grande figura desta Volta a França.

No contra-relógio, Wout van Aert rodou em 47m59,86s, menos 19 do que Vingegaard, menos 27 do que Pogacar e menos 42 do que Filippo Ganna – e tirar este tempo ao bicampeão do mundo é algo que roçava a quimera se fosse dito antes da etapa.

Se é para sprintar em pelotão, Van Aert vai. É sprint em grupo reduzido? Provavelmente, a etapa é dele. Há montanha para subir? O belga presta-se a isso. E não se corta a rolar em ritmo de comboio na luta contra o relógio. E esta foi a sexta vitória da Jumbo-Visma nesta corrida.

Nota ainda para Nélson Oliveira, que fez o 56.º melhor tempo, um registo modesto para o especialista português.

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