É possível poupar 30% de água em casa. Porque não o fazemos?

A precipitação em Portugal vai reduzir-se 20 a 25% nas próximas décadas. A seca é um problema que não sairá da agenda nacional.

Mas a questão da eficiência hídrica dos edifícios ainda não entrou na agenda.

Quem quiser poupar água em casa tem que investir dinheiro em equipamentos e, no caso das águas cinzentas, não tem incentivos para isso.

Portugal foi pioneiro em algumas coisas, mas nas últimas décadas estagnou. “Estamos com o mesmo chip de há 30 anos.”

Há muitos anos que Armando Silva Afonso anda a pensar nisto. Está neste momento no Laboratório de Hidráulica e Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, junto a uma parede feita de sanitas, autoclismos, lavatórios, canalizações e tenta explicar-nos uma ideia simples: há sistemas que nos permitem, em nossas casas, poupar água. “Os nossos estudos, comprovados pela União Europeia, mostram que poderíamos poupar cerca de 30% em todas as casas.” Bastaria que mais gente se dedicasse a pensar um pouco mais nisto e que algumas regras se tornassem obrigatórias nas novas construções.

“Há imensas soluções novas, mas nós, em Portugal, temos um atraso enorme na sua implementação. Construímos as redes de água de esgoto dos nossos edifícios da mesma maneira que há 50 anos. Não evoluímos nada”, diz o professor catedrático (já aposentado) do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, especialista em eficiência hídrica em edifícios e responsável da Associação Nacional para a Qualidade nas Instalações Prediais (ANQIP).

A situação é curiosa e um pouco mais complexa. Em alguns aspectos, Portugal avançou muito, adiantando-se até aos outros países. Noutros, ficou claramente para trás. Silva Afonso explica: “Fomos o primeiro país europeu a criar para a água uma rotulagem [de eficiência] semelhante à eléctrica. Foi criada em 2007 pela ANQIP, mas só agora é que isso começou a ser valorizado nas políticas públicas.”

E se neste momento já existe, por exemplo, uma estratégia de compras públicas ecológicas que recomenda dispositivos mais eficientes, ela ainda é voluntária. “Ou seja, num país que está sem água, este tipo de políticas continua a ser tratado um bocadinho como secundário”, lamenta. Há uma pedagogia que tem sido feita para a energia eléctrica, mas que ainda não se sente no sector da água.

Na Universidade de Aveiro, o tema é particularmente acarinhado, em grande parte porque “aqui é o centro de gravidade da indústria sanitária em Portugal — num raio de 60 quilómetros em torno de Aveiro há grandes marcas de torneiras, de dispositivos para autoclismos e, portanto, de forma natural houve uma tendência para desenvolver este sector”. A parede junto à qual nos encontramos é uma torre hidráulica que procura simular um edifício de três pisos e mostrar alguns exemplos de estruturas que nos permitiriam poupar mais água se fossem integradas nos edifícios.

O que, segundo Silva Afonso, levou a que Portugal tenha ficado para trás foi “desde logo, o facto de ter parado a investigação neste sector há uns anos”. Se na década de 1980 havia bastante investigação, depois disso “houve um hiato, um grande período temporal em que ninguém se dedicava às questões da hidráulica predial.”

Há, reconhece, uma preocupação com o estado e a gestão das redes públicas de distribuição de água, mas o que tem dificuldade em entender é porque é que continua a olhar-se para estas e a esquecer os prédios. Como se, de alguma forma, as canalizações parassem à entrada destes. “Os edifícios fazem parte do sistema de abastecimento urbano, mas aí ninguém se preocupa com nada e esse é um dos grandes erros que cometemos em Portugal.”

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Alexandra Prado Coelho,Vera Moutinho

Aproveitar cada gota

Na realidade, há quem se preocupe, mas com uma capacidade de intervenção limitada. É o caso da família Catalão. Carlos, Marisa e os quatro filhos, com dois, cinco, seis e dez anos, mudaram-se recentemente de um apartamento para uma vivenda e isso fê-los pensar na água de uma forma diferente.

“Temos uma casa com 40 anos, por isso não temos nenhuma daquelas modernices que têm alguns amigos que fizeram casas de raiz, aproveitamento das águas cinzentas [as dos banhos ou dos lavatórios], enfim, coisas que fazem todo o sentido”, diz Carlos. “Aliás, acho que em Portugal devia ser proibido fazer construções que não fossem já com este tipo de inovação.”

Mas, com a sua vivenda de 40 anos, a família Catalão tenta soluções um pouco mais artesanais. “No lava-louças temos uma taça que recolhe a água. Vai tudo para ali, despejamos até a água das lavagens da máquina do café. E vai toda para a horta”, descreve Carlos, pegando numa taça cheia e demonstrando como usa esta água para regar as plantas no exterior. Fazem o mesmo na casa-de-banho, recolhendo sempre a água que habitualmente se desperdiça quando se abre a torneira e se espera que aqueça.

“Temos uma consciência diferente do consumo de água quando tem um espaço para regar e vemos outros seres vivos, para além de nós, que precisam de água. Foi um Inverno super-seco e tivemos que regar em Janeiro, que era uma coisa impensável há 20 anos. E começámos a ver a quantidade de água que se gasta”, explicam. Para já, contas feitas de cabeça e por alto, acreditam que com estes pequenos cuidados vão conseguir poupar cerca de 400 litros de água por mês, “no mínimo”. “Há-de ter algum impacto, se não for económico, pelo menos ecológico.”

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Marisa Quental e Carlos Catalão mudaram-se com os quatro filhos de um apartamento para uma moradia. O quintal fez aumentar o consumo de água Rui Gaudêncio

Portugal gastador

A questão do impacto económico é importante. A percepção generalizada é a de que, pelo menos quando comparada com a electricidade, a factura da água está longe de ser a que mais pesa num orçamento familiar. Pedimos a Sara Correia, da associação ambientalista Zero, que nos ajude a decifrá-la. “Se as pessoas analisarem um bocadinho a factura, se calhar vão perceber que não estão a pagar assim tanto de água. Esta acaba por ser um bem relativamente barato quando comparado com outros bens de consumo geral.”

O que estamos, então, a pagar? “São três serviços. Para além do abastecimento, estamos a pagar o serviço de saneamento, ou seja, o tratamento das águas residuais que produzimos, e também o serviço de recolha e tratamento de resíduos e encaminhamento para o destino final.” E gastamos demais? Os números dizem que sim. Em Portugal, cada pessoa gasta em média 189 litros por dia (aqui entra não apenas o consumo doméstico, mas de todos os sectores da economia, divididos pelo número de habitantes). Se olharmos apenas para o consumo nas nossas casas, o valor é de 131 litros diários per capita, o que é excessivo, de acordo com as orientações da Organização Mundial de Saúde, segundo as quais cada pessoa precisa de entre 50 e 100 litros diários para satisfazer as suas necessidades.

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Em Portugal, cada pessoa gasta em média 189 litros por dia (aqui entra não apenas o consumo doméstico, mas de todos os sectores da economia, divididos pelo número de habitantes)

Sara Correia acredita que seria “perfeitamente razoável” reduzirmos o consumo individual até aos 100 litros. “Em minha casa somos três pessoas e temos um consumo médio à volta dos 89 litros, mas sinto que ainda há margem para reduzir um bocadinho mais”. A redução que já conseguiu passa por medidas muito básicas: “São aqueles cuidados de que muitas vezes se fala, por exemplo, os autoclismos, que têm uma descarga entre três e seis litros, encher bem a máquina da louça e a roupa, duches mais rápidos.”

Os tais 30% referidos por Armando Silva Afonso passam, em grande parte, precisamente pela instalação de equipamentos mais eficientes. Gasta-se muito mais para isso? “Não, pelo contrário. Por exemplo, a maior parte dos autoclismos de pequeno volume são mais baratos que os de grande volume. Ao contrário do que acontece com a energia, a eficiência hídrica não é cara.”

Mas seria importante que houvesse legislação a incentivar a poupança. “Os ingleses, que não têm os nossos padrões de alterações climáticas, limitam [o consumo de água] a 110 litros por pessoa”, lembra. “Em Portugal, ouvimos falar muito das perdas nas redes, mas essa é uma pequena parte, nos edifícios pode poupar-se muito mais. Mas ninguém faz um esforço nesse sentido. Não se fala nisso.”

E para quem, mesmo assim, quiser avançar por esse caminho, existem apoios? O AQUA+ do Programa de Apoio a Edifícios Mais Sustentáveis, ligado ao Fundo Ambiental (cuja fase de candidaturas terminou em Abril), apoia particulares que “substituam dispositivos de uso de água na habitação por outros com classificação hídrica ‘A’ ou superior”, “instalem soluções que permitam a monitorização e controlo inteligente dos consumos de água” e “instalem sistemas de aproveitamento de águas pluviais”.

Aplica-se a edifícios em projecto, construção, uso e reabilitação, com uma taxa de comparticipação de 85% a fundo perdido para investimentos que podem ir até aos 7500€ por moradia ou apartamento. Há técnicos disponíveis para explicar as medidas de eficiência hídrica que podemos implementar nas nossas casas, mas, por agora, não existe qualquer obrigatoriedade — o sistema é voluntário.

Aguardam-se novidades do PENSAARP 2030, o Plano Estratégico para o Abastecimento de Água e Gestão de Águas Residuais e Pluviais, do Ministério do Ambiente e Acção Climática, que deverá traçar as grandes linhas orientadoras do sector para a próxima década, mas que neste momento se encontra em fase de análise da consulta aberta, que terminou em Maio.

Três caminhos

Para termos uma casa com maior eficiência hídrica, temos três caminhos possíveis a percorrer — que podem ser acumulados. Um é o da instalação de equipamentos que reduzam o caudal de água (torneiras) ou a quantidade (autoclismos, máquinas de lavar); o segundo é o reaproveitamento das águas cinzentas; e o terceiro é o aproveitamento das águas da chuva.

“Para mim, o aproveitamento da água da chuva é, em Portugal, muito mais interessante e deve ser prioritário, tem menores custos, nomeadamente de manutenção, e menores riscos sanitários”, defende Armando Silva Afonso. “É uma solução que tem várias vantagens, que devia ser quase obrigatória em urbanizações novas. Eu sei que o nosso clima não é muito favorável, mas o que conseguirmos aproveitar é bom para fins não potáveis. São sistemas que se pagam num tempo curto e que têm a vantagem de contribuir também para minorar as cheias nas ruas, que é o que se passa em São Paulo e noutras cidades.”

Isto, diz, responde “a dois fenómenos que vamos ter em Portugal num futuro próximo, devido às alterações climáticas”: uma redução muito significativa da precipitação, e chuvadas muito intensas, em períodos de tempo curtos. “Temos que poupar a nossa água potável e aproveitar esta que vem do céu. Ela pode ser usada não só em autoclismos como em máquinas de lavar. Já existem máquinas com duas entradas diferentes, uma delas para as águas da chuva.”

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Armando Silva Afonso é especialista em eficiência hídrica em edifícios e responsável da Associação Nacional para a Qualidade nas Instalações Prediais DR

No Laboratório de Hidráulica da Universidade de Aveiro foi instalado um reservatório para aproveitar a água da chuva. “Vem do telhado, directamente”, mostra Silva Afonso. É muito simples. “Tem um filtro, para reter folhas e outros detritos. Recolhemos aqui uns 8 a 10 metros cúbicos da primeira chuva que cair. Ficam aqui em vez de irem para a rua. Se houvesse uma generalização destes sistemas, isso poderia contribuir para amortecer os picos de cheia, que vamos ter de forma crescente.”

O problema de Portugal é que precisamos de reservatórios maiores do que nos países do Norte da Europa. “Temos que armazenar durante mais tempo e isso prejudica a rentabilidade do sistema”. Carlos e Marisa têm andado a pensar nessa possibilidade para a sua vivenda. “Estamos a pensar nisso, mas passo a passo”, diz Marisa. “Há uns recipientes próprios que podem ficar no exterior e debaixo da terra, junto a uma caleira, e que captam a água. Há uns com valores mais avultados, outros mais baixos, estamos ainda a estudar o assunto.”

Água potável na sanita: um absurdo

Em Campo de Ourique, na loja, café e cabeleireiro Pikikos, Natasha von Muhlen optou pelo segundo caminho das possibilidades de poupança, o do reaproveitamento das águas cinzentas, que é também o mais complexo. Quer mostrar que é possível ser sustentável e amiga do ambiente e, para isso, criou um sistema que permite aproveitar para a sanita as águas das lavagens dos cabelos.

Parece simples, mas não foi fácil. Para Natasha, a informação que existe é “bastante insuficiente”. “Eu fui à procura dela, mas a maioria das pessoas tem que conseguir ter a informação sem precisar de procurar muito.” Pesquisou até encontrar quem lhe fizesse a instalação, de escala pequena, necessariamente, e lá conseguiu montar um sistema que, com a ajuda de uma pequena bomba, faz seguir a água das lavagens para um depósito, ligado depois ao autoclismo. Para explicar aos clientes o que aqui se passa, colou peixinhos que indicam o percurso feito pela água. Admite que o investimento venha a ser compensado pela redução da conta (apesar de a bomba significar um pequeno gasto adicional de energia eléctrica), mas não foi essa a principal motivação. “Conseguimos poupar mais ou menos 50 mil litros de água por ano. Não temos as contas certas porque depende do movimento que tivermos. A longo prazo acho que conseguimos poupar algum dinheiro, mas o investimento é grande, sim.” Fê-lo, em grande parte, para “sensibilizar os clientes” para a necessidade de poupar água e para o absurdo que é usarmos água potável para despejar na sanita.

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Sistema de aproveitamento de água da lavagem de cabelos para a sanita no cabeleireiro Pikikos, em Campo de Ourique Rui Gaudêncio
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Natasha von Muhlen teve dificuldade em encontrar informação sobre como montar um sistema de aproveitamente de águas cinzentas

Há, contudo, riscos na reutilização destas águas cinzentas – não são grandes se tudo se passar numa casa só e o utilizador for o mesmo, mas são consideráveis se passarmos para a escala de um edifício e as águas cinzentas de várias casas se concentrarem para serem depois redistribuídas. Nesse caso, terão que passar por uma estação de tratamento, uma mini-ETAR, o que implica custos, não só de instalação, mas também de manutenção. Daí que, para Silva Afonso, a reutilização “seja uma tecnologia com interesse”, mas que “talvez não seja prioritária neste momento em Portugal”.

“Tem que haver normas que regulem a utilização dessa água, que tem que ter um critério de qualidade para ser reutilizada”, reforça Sara Correia, da Zero. “Isso acontece com a legislação para as águas que são tratadas nas ETAR, mas não existe ao nível doméstico. É preciso regulamentar essa questão.”

Existe um Regulamento Geral dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais, que data de 1995 e ainda está em vigor. Já foi feita uma actualização, que contempla precisamente a questão das águas cinzentas, mas há seis anos que essa versão actualizada está na gaveta, à espera. “Nós [ANQIP] fizemos a revisão desse regulamento para integrar essas mudanças, novas soluções, novos conceitos, mas está há seis anos para publicar”, conta Silva Afonso, que diz ignorar a razão desta demora. “Está à espera de aprovação”, confirma Sara Correia. “Era importante [que entrasse em vigor] para que as pessoas pudessem usar estes sistemas de reutilização de água, que é sempre uma poupança importante.”

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Água + ar = poupança?

Mais facilitado está o caminho de quem quer apenas comprar equipamentos que ajudem a poupar. Nas lojas da Ikea, por exemplo, todas as torneiras que estão à venda têm já integrado um redutor de caudal, explica a directora de comunicação Cláudia Domingues. “A nossa abordagem é não obrigar o consumidor a escolher entre o que é mais sustentável e o que é menos sustentável. É uma transformação radical na forma como toda a nossa gama é pensada.”

Na loja existe uma casa modelo criada para um jovem casal que quer ser mais sustentável, poupando nas contas da luz, da água e da alimentação. A ideia foi construir um caso real para facilitar a comunicação. “A linguagem da sustentabilidade é muito complexa”, sublinha Cláudia Domingues.

Por isso, enquanto outras lojas (como a Leroy Merlin, por exemplo) permitem a escolha entre torneiras com diferentes tipos de redutor (e, portanto, com diferentes níveis de poupança de água), na Ikea não é preciso escolher. “Todas as torneiras poupam mais, essa foi uma decisão estratégica. A sensação é igual a uma torneira normal, mas na realidade [corre] menos água, porque é misturada com ar.” O resultado? “Uma redução de aproximadamente 40%”.

A questão pode não ser tão simples, nota mais uma vez Armando Silva Afonso, lembrando que a ANQIP criou rotulagem que muitas vezes não é utilizada pelos vendedores dos equipamentos. “A questão do redutor dá para uma tese de doutoramento”, brinca. “O caudal depende da pressão. Posso ter um redutor que funciona muito bem em minha casa, que é muito confortável, mas posso levá-lo para outra casa e [por causa da pressão] ele funciona mal, não dá água que chegue.”

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Para explicar aos clientes da Pikiko como são reutilizadas as águas, Natasha colou peixinhos que indicam o percurso feito pela água

Vejamos um exemplo prático: num lavatório devemos ter entre dois e quatro litros por minuto. “Abaixo de dois é desagradável porque a pessoa não consegue lavar bem e vai ficar mais tempo, acima de quatro já está a gastar água a mais. Em rigor, se uma pessoa quisesse comprar um redutor devia ver qual o melhor para a pressão que tem em casa. Claro que ninguém faz isso, infelizmente, até porque se perguntarmos às entidades gestoras, elas também não sabem dizer. Isto é só para mostrar que o processo é mais complexo do que parece.”

Mas a complexidade não pára aí. É preciso pensar, por exemplo, que “se reduzirmos muito o caudal do chuveiro, a pessoa fica mais tempo no banho e acaba por não poupar água nenhuma”. Além disso, “se se reduzir muito o volume dos autoclismos pode-se ter problemas de arrastamento, de entupimento na área dos esgotos”.

O que só vem comprovar, mais uma vez, a necessidade de olhar para o sistema como um todo integrado, com a parte pública e a parte predial a serem pensadas em conjunto. “Não podemos, como até aqui, pensar só nas casinhas, que é uma coisa que ninguém controla, ninguém verifica projectos, nada.” É necessária uma mudança de olhar, defende Silva Afonso. “Temos que mudar o chip. Andamos com o mesmo chip há 30 anos. Tem que se começar pela casa, depois pelo condomínio, depois pelo bairro.” O ideal será que a água da chuva recolhida em vários prédios possa ser reutilizada dentro do próprio bairro, para rega de jardins, por exemplo.

Há, por fim, outro factor que tendemos a esquecer, e que é relevante quando se sabe que a sensibilidade para a poupança de energia eléctrica é maior: é que, recorda o responsável da ANQIP, “quando se poupa água, poupa-se energia”. Todo o sistema, em que a água é captada, bombada, tratada, etc., utiliza energia.

“Aqui em Aveiro, por exemplo, cada metro cúbico que entra em minha casa utiliza 0,8 quilowatts por hora. Ao descarregar o autoclismo, você gasta cerca de 18 watts/hora. Se pensar numa lâmpada de três watts acesa durante seis horas, é a mesma coisa. Portanto, imagine que quando descarrega o autoclismo, aparentemente não gastou energia nenhuma, mas na realidade gastou 18 watts. Se as pessoas tivessem uma lâmpada que acendesse cada vez que carregam no botão do autoclismo eram capazes de se preocupar mais com a eficiência hídrica.”

O que falta, afinal? Mais incentivos? Mais sensibilização? Legislação mais eficaz? Obrigatoriedade de adoptar soluções mais eficientes? “Eu acho que aí vivemos muito dependentes da União Europeia”, conclui Armando Silva Afonso. “Quase não se faz nada se não houver fundos europeus. E a União Europeia não está muito preocupada com a água, esse é um problema dos países do Sul, embora vá chegar mais acima. Neste momento, a Holanda, a Dinamarca, a Suécia, não têm propriamente falta de água. A UE esqueceu completamente esse problema dos países do Sul, talvez por não ser um problema de todos.”

Mas, quando sabemos que a precipitação em Portugal vai reduzir-se 20 a 25% nas próximas décadas e que a seca é um problema que não sairá da agenda nacional — o Governo prepara-se para, nas próximas semanas, lançar uma campanha de sensibilização para a poupança de água —, como se justifica que não haja uma maior preocupação com a eficiência hídrica dos edifícios em que vivemos?

Com Vera Moutinho