Factores ambientais e humanos na origem da extinção do lagarto-gigante de Cabo Verde

Três espécimes conservados em museus foram usados para estudar a alimentação do réptil extinto, assim como a existência de parasitas no seu canal digestivo.

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Espécimes estudados de lagarto-gigante tinham em média 23 centímetros de comprimento Michel Dagnino/Museu Oceanográfico do Mónaco

Uma combinação de factores ambientais e da actividade humana, relacionados com o uso excessivo de recursos, podem estar na origem da extinção do lagarto-gigante de Cabo Verde, revela um estudo que envolveu investigadores da Universidade do Porto, publicado nesta quarta-feira na revista PLOS ONE.

O trabalho debruça-se sobre a dieta e as causas da extinção do lagarto-gigante de Cabo Verde (Chioninia coctei), espécie que foi vista pela última vez no seu habitat natural em 1912. “O estudo de espécimes de museu é frequentemente a única maneira de desvendar informações sobre espécies que se extinguiram recentemente”, explica um comunicado divulgado pelo Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio-Inbio) da Universidade do Porto. Estes exemplares ajudaram a revelar quais foram as características do réptil e as ameaças à espécie que estiveram relacionadas com o seu desaparecimento, explica o comunicado. Além disso, o estudo pode dar pistas para conceber medidas de conservação para outras espécies, principalmente no contexto da biodiversidade das ilhas.

A investigação permitiu concluir que aquele réptil se extinguiu devido a uma “combinação” de factores ambientais e antropogénicos (originados pela actividade humana), “provavelmente” relacionados com a sobreexploração, isto é, o uso excessivo de recursos.

O estudo recorreu a métodos moleculares de sequenciação de alto rendimento que permitiram estudar os conteúdos do estômago e intestino de três espécimes de lagarto-gigante. Métodos estes que são “raramente explorados para estudar a ecologia de espécies já extintas”, segundo o comunicado relativo a este estudo, que, além de investigadores do Cibio, o estudo contou com a colaboração do Museu Oceanográfico do Mónaco, do Museu de História Natural de Paris e da Universidade de Valência.

Os investigadores identificaram parasitas gastrointestinais do género Tachygonetria, da ordem dos oxiúros. Sabe-se que este género de parasitas está associado a répteis que se alimentam de plantas, o que sugere que as plantas eram importantes recursos alimentares para o lagarto. Esta hipótese foi confirmada pela abordagem genética usada, que “também identificou plantas e, adicionalmente, invertebrados, apoiando a hipótese de uma dieta generalista do lagarto”, disse a coordenadora do estudo, Raquel Vasconcelos, investigadora daquele centro, citada no comunicado.

Do mesmo modo, a ausência de vertebrados nos conteúdos digestivos “pode indicar o declínio das aves marinhas nas ilhas Desertas de Cabo Verde”, salientam os autores do estudo, notando que tal pode ter “contribuído para a debilitação do lagarto-gigante, já infligido pela perseguição e secas intensas”.

“Este estudo representa um passo significativo para o conhecimento do papel nos ecossistemas desta enigmática espécie já extinta e enfatiza a necessidade de desenvolver planos de conservação holísticos para espécies insulares ameaçadas”, salienta a cientista.

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