Valor da bitcoin desaba no meio da derrocada das criptomoedas

Preço da principal moeda digital está abaixo dos 20 mil dólares, tendo caído 70% desde o pico de Outono passado. Tal como o mercado accionista das tecnológicas, as criptomoedas sofrem com o espectro da recessão.

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Reuters/DADO RUVIC (Arquivo)

Quem julgava as criptomoedas um tipo de activo blindado contra efeitos económicos como a inflação pode estar a mudar de ideias. Só no fim-de-semana passado, o mercado mundial de moedas digitais passou a valer menos 190 mil milhões de euros e a derrocada continua. Após mais uma semana de contínua desvalorização, a principal criptomoeda mundial, a bitcoin, atingiu neste sábado o seu valor mais baixo desde Novembro de 2020. O preço chegou a cair 9%, para os 18.732 dólares (17.847 euros), enquanto a Europa dormia, tirando o sono a investidores que consideram o preço de 20 mil dólares (19.56 euros) um limiar de referência.

Alguns analistas acreditam que, abaixo deste limiar, o risco de liquidação de investimentos em criptoactivos com base em crédito aumenta de forma muito significativa. Nos últimos anos, o mundo fez investimentos avultados em criptomoedas, na ordem dos biliões de dólares, especialmente durante a pandemia. A falta de rentabilidade de outras classes de activos levou muitos investidores a “parquear” dinheiro em criptomoeda e outros activos que prometiam retornos maiores, por serem mais arriscados, como os "meme stocks", a arte digital e os non-fungible tokens, ou NFT.

Muitas ordens de compra são feitas em criptomoeda, mas também as há com recurso a crédito. Até à subida das taxas de juro, este era mais barato e o gasto não se sobrepunha ao lucro esperado pela valorização da bitcoin e de outras moedas digitais. Entre o início da pandemia, em Março de 2020, e Novembro de 2021, a moeda de referência viu o seu valor multiplicar-se por 12, atingindo os 64.400 dólares no último Outono. Tudo parecia correr bem, apesar de avisos antigos contra os riscos vindos de lados tão diferentes como o FMI.

Mas a subida das taxas de juro anunciadas pelos bancos centrais na Europa e nos EUA encarece o crédito e, com as moedas digitais em queda, esse investimento deixa de ser rentável. A ordem de compra com outras criptomoedas também encarece já que todas as moedas digitais têm vindo a perder valor. Investidores assustados com uma possível recessão fogem de tudo o que seja activo especulativo. Em economês, chama-se a isso rebentar a bolha. Os sinais de risco abundam.

A plataforma CoinGeck, que reúne informação sobre criptomoedas, contabiliza o valor de mercado das moedas digitais, neste sábado, em 900 mil milhões de dólares, o que significa que este mercado perdeu dois terços do seu valor desde o final de 2021, quando valia três biliões de dólares.

No início desta semana, um importante “banco” de criptomoedas, a sociedade Celsius Network (sediada em Nova Jérsia), proibiu o levantamento de moeda ou transferência entre contas, justificando a decisão com “condições extremas do mercado”. Empresas como esta ou a Babe Financial, que seguiram o mesmo caminho, actuam sem supervisão regulatória e escapam às regras da banca tradicional, por exemplo.

Isso permite-lhes aceitar “depósitos” com a promessa de retornos substancialmente acima do que é habitual. A taxa de juro pode chegar aos 20%, dependendo do tipo de activo que é “depositado”. Estas instituições fazem depois dinheiro “emprestando” esses activos a outros: cobram entre 5% e 10% de comissões e embolsam a diferença entre a taxa de juro prometida ao depositante e a taxa de juro cobrada a quem pediu emprestado.

Acontece que a bitcoin – que acaba por ser uma referência para todo o mercado das moedas digitais – perdeu 59% do seu valor desde Janeiro e 70% desde o máximo atingido no Outono passado. Outra moeda, a ether, já desvalorizou 73% este ano.

Em Maio, a moeda luna entrou em colapso e perdeu 99% do seu valor num só dia, de 20 mil milhões de dólares a quase zero em 24 horas. Há quem lhe chame "o momento Lehman Brothers” das criptomoedas. Houve poupanças de uma vida que “evaporaram” numa fracção de tempo. Há quem exija uma investigação criminal nos EUA.

O fundo de cobertura (hedge fund) Three Arrows Capital confirmou na sexta-feira que sofreu um duro golpe com esta derrocada. Falhou a devolução de depósitos, o pagamento de juros e está sem dinheiro para cobrir as perdas. Estará à procura de ser resgatado, segundo o Wall Street Journal.

Tal como sucede no mercado accionista, onde as grandes tecnológicas estão a perder valor bolsista por causa do receio de uma recessão induzida pela política monetária restritiva imposta para controlar a inflação, no planeta das criptomoedas também se assiste a uma debandada de investidores. Empresas como a Coinbase Global Inc, a Gemini e a Blockfi já anunciaram que vão despedir milhares de pessoas.

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