Ryanair deixa cair polémico teste em afrikaans após protestos de passageiros sul-africanos

É falada por menos de 15% da população da África do Sul e não é exigência oficial de nenhum país. No entanto, a Ryanair estava a impor o preenchimento de um questionário em afrikaans a quem viaja na Europa com passaporte sul-africano. Presidente da companhia justificou medida com “passaportes falsos” mas assumiu que “não faz sentido”.

ryanair,viagens,fugas,africa-sul,europa,
Fotogaleria
Depois da polémica das últimas semanas, Ryanair decide deixar cair teste em afrikaans Reuters/NACHO DOCE
ryanair,viagens,fugas,africa-sul,europa,
Fotogaleria
Michael O'Leary durante a conferência de imprensa Reuters/YVES HERMAN

A polémica começou a estalar no final do mês passado, depois de vários sul-africanos terem partilhado nas redes sociais que tinham sido obrigados a responder a um questionário sobre o seu país em afrikaans para embarcar em voos da Ryanair na Europa (a companhia aérea de baixo custo não voa a partir de ou para destinos na África do Sul).

A língua, associada à minoria branca que liderava o país durante o regime de segregação racial apartheid, é apenas uma das 11 línguas oficiais do país, falada por cerca de 12% dos 58 milhões de habitantes da África do Sul.

No entanto, segundo a BBC, a Ryanair nunca explicou a escolha do afrikaans como única língua utilizada para redigir um questionário de cultura geral sobre a África do Sul, imposto antes do embarque aos passageiros portadores de um passaporte sul-africano nos voos da transportadora aérea na Europa, com o objectivo de identificar quem viajasse com um documento falso.

Esta terça-feira, o presidente executivo do grupo Ryanair, Michael O'Leary, justificou a realização do teste com o facto de existirem “muitos problemas com passaportes falsificados” que a companhia aérea “não vai tolerar mais”, citando o aumento dos passaportes sul-africanos falsos detectados numa rota entre a Turquia e a Irlanda, durante uma conferência de imprensa em Bruxelas, à margem de reuniões com os sindicatos belgas e para discussões sobre as novas regras para o regime de comércio de licenças de emissão da União Europeia.

Na semana passada, o governo sul-africano tinha-se mostrado “consternado” e “surpreendido” com o teste de conhecimento geral sobre a África do Sul em afrikaans imposto pela Ryanair, que apelidou de “sistema de avaliação retrógrado”, sublinhando que o inquérito não é uma exigência oficial de nenhum país. “Fomos surpreendidos com a decisão da companhia aérea, porque o Ministério do Interior comunica regularmente com todas as companhias aéreas sobre como validar os passaportes sul-africanos”, disseram fontes do executivo.

Na conferência de imprensa, O'Leary rebateu as acusações, que classificou como “lixo”, afirmando que “o governo sul-africano reconheceu que há um problema com o grande número de passaportes sul-africanos falsos ou falsificados”, escreve a Reuters. No entanto, a transportadora irlandesa anunciou que vai deixar cair o inquérito.

“A nossa equipa criou um teste em afrikaans com 12 perguntas simples, como qual é o nome da montanha nos arredores de Pretória. Eles não têm qualquer dificuldade em completar isto, mas também achámos que não era apropriado”, reagiu. “Então, vamos parar com o teste em afrikaans, porque não faz sentido nenhum.”

Entre os viajantes que divulgaram publicamente a sua indignação estava um estudante que voou de Portugal para o Reino Unido e que se submeteu ao exame - de duas páginas e disponível apenas em afrikaans - sob a ameaça de não receber o cartão de embarque se não respondesse a todas as perguntas, mesmo tendo uma autorização de residência britânica, conta a agência Lusa.

Segundo a BBC, quem falhasse a prova veria o seu embarque recusado e seria reembolsado do custo do bilhete. Inicialmente, a Ryanair defendeu a medida ao afirmar que recebia uma multa por cada passageiro que viajasse com um passaporte falso, acrescenta a cadeia televisiva britânica.

Durante o apartheid, o afrikaans tornou-se obrigatório e uma das línguas oficiais do sistema educativo, juntamente com o inglês, gerando protestos por parte da comunidade negra sul-africana um pouco por todo o país. A imposição nas escolas foi o principal motivo da revolta do Soweto em 1976, recebida com brutalidade policial, provocando a morte de, pelo menos, 170 pessoas, na sua maioria crianças em idade escolar.

O regime de segregação racial da África do Sul chegou ao fim em 1994, com as eleições multirraciais e democráticas que elegeram Nelson Mandela como o primeiro presidente negro da África do Sul. Actualmente, o afrikaans não é de ensino obrigatório nas escolas, embora se mantenha opcional, e é uma das 11 línguas oficiais do país, juntamente com inglês, zulu, isixhosa, sepedi, setswana, sesotho, xitsonga, siswati, tshivenda e ndebele.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários