Manjericos, quadras, cascatas. O São João já está na rua com o seu nome

A Rua de São João, no Porto, já está vestida a rigor para os santos populares. Uma iniciativa do Centro Social Paroquial S. Nicolau que envolve utentes, moradores e comerciantes da zona.

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António Barbosa, utente do Centro S. Nicolau e Andreia Oliveira, assistente social, nos últimos preparativos. Nelson Garrido

Já se anuncia o São João - e não é com o cheiro da sardinha assada. Triângulos coloridos, duas cascatas e dezenas de quadras festivas coladas em cerca de 80 manjericos de papel, trazem de volta à Rua de São João, junto à Ribeira do Porto, as cores dos santos populares. A iniciativa do Centro Social Paroquial S. Nicolau, sediado na rua, uniu utentes, moradores e comerciantes locais com o propósito de trazer de volta a tradição.

A decoração foi inaugurada esta sexta-feira, o culminar de um mês de preparação. Na véspera, o PÚBLICO assistiu aos arranjos finais.

Com pouco jeito para escrever quadras, como o próprio confessou, Serafim Silva dedicou-se à construção de ornamentos de madeira. Dentro da sede do centro social, o utente terminava de colar os elementos na cascata, uma tradição muito antiga que retrata “as características do Porto”, explica Andreia Oliveira, assistente social. Trata-se de uma maquete de um “aglomerado de casas”, sendo obrigatório que tenha “sempre um elemento de água”, outro relativo aos santos populares, um religioso e “uma banda a tocar”.

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A ajudar de forma entusiástica estava Joaquina Pinto, que vive para estas festividades. Era para se chamar Maria João Porto, porque nasceu às 0h00 do dia 24 de Junho de 1954, e recorda com nostalgia as tradições de outros tempos: “Havia a corrida dos sacos, a subida ao poste untado de sebo, a travessia do rio com a vela, havia muitos jogos. Agora...”.

Vergado sobre uma mesa junto às escadas, António Barbosa afinava mais umas rimas para adornar os manjericos: “Tenho o manjerico à janela / Que dá vida à minha rua / A fogueira faz-se na viela / Vai o sol e vem a Lua”. “Esqueceu-se de uma [quadra] em casa”, revelou Andreia Oliveira, assistente social, “e fez esta agora à pressa (risos)”.

Cá fora, debaixo de um sol abrasador e do olhar atento de quem passava, Ireneu Oliveira ajudava a afixar os manjericos nas paredes das casas “com todo o gosto”. O morador de 74 anos, nascido e criado na Rua de São João, tem “saudades dos tempos em que a Ribeira era uma festa muito bonita, com cascatas, ornamentações”. “Depois foi morrendo”, lamenta.

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“Que a Rua de São João volte novamente a ter vida” é o desejo de Fátima Pinto, coordenadora técnica do Centro. A criação das decorações, que envolveu “entre 40 a 50 pessoas”, é “uma questão de promover a tradição do Porto e, sobretudo, de transmitir as tradições das gerações mais antigas para as novas”. “É por isso que os meninos do centro de apoio ao estudo, do 5º ao 9º ano, também participam”, explica a coordenadora.

A ideia surgiu em 2021 quando, por causa da pandemia, foram impedidos de fazer o habitual arraial popular de São João. Ao invés de fazerem ajuntamentos, espalharam enfeites pela rua graças à contribuição de moradores e comerciantes, angariando um total de 200 euros que permitiu adquirir o material.

A “dinâmica foi de tal ordem interessante”, diz Fátima Pinto, que este ano “vai ser replicada” e o material reutilizado, porque há também “uma preocupação” com a “pegada ambiental”. Acredita a coordenadora que esta é agora uma tradição “que se calhar nunca mais se vai perder”.

Inês Gonçalves, de 26 anos, trabalha na Garrafeira Soares, mesmo em frente ao Centro S. Nicolau, e diz que para os comerciantes, também envolvidos no projecto, esta “tem sido uma óptima iniciativa que tem trazido também cada vez mais gente”.

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A decoração vai estar exposta na Rua de São João até 16 de Setembro e vai ser o cenário do arraial organizado pelo Centro, a 3 de Junho, sempre no espírito descrito por António Barbosa: “Toda a gente tem conforto / Vamos todos para a brincadeira / O São João é no Porto / Bem no centro da Ribeira”.

Texto editado por Ana Fernandes

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