Eu levo o Feminismo muito a sério

Feminismo é uma luta por justiça, igualdade e acima de tudo não-discriminação. E, por igualdade, entenda-se igualdade social, económica e política.

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Na teoria, as mulheres podem votar em todo o mundo, mas na prática não o fazem Daniela Martinez/Unsplash

Todos vemos o mundo à nossa medida e os problemas apenas ao alcance do nosso olhar. Todos sabemos isso, e é importante que se reconheça com a mesma força que se desconstrói. Sendo que para alguns importa ainda relembrar que Feminismo é uma luta por justiça, igualdade e acima de tudo não-discriminação. E, por igualdade, entenda-se igualdade social, económica e política. Em todas as lutas, há extremismos que contaminam as boas causas, mas o que mais me preocupa nem é tanto isso, é mais a injustiça perante uma luta que pretende ser pela justiça num mundo tendencialmente melhor, mas ainda com crueldades gritantes.

O que vejo, o que leio, o que ouço é um Feminismo de caviar, infelizmente quase só feito por mulheres, o que está inquinado à partida pois a luta por justiça é uma luta moral, de valores, e tem que ser de toda a sociedade, homens inclusive, mas acima de tudo, critico porque penso que foge ao essencial.

Não vou referir o que tanto se ouve por parte dos Feministas e me parece menos prioritário, porque já sei que muita gente vai ficar melindrada, mas vou enumerar alguns pontos que deveriam ser o cavalo de batalha da luta pela igualdade, mas que por vezes, parece que ninguém lhes liga, e como tal, poucos combatem.

Acesso à escola
A desigualdade ainda é brutal. Apenas 49% dos países do mundo atingiram a igualdade no acesso à escola primária. Há 130 milhões de meninas que não vão à escola no mundo. Pobreza, violência, casamentos infantis e favorecimento dos rapazes, são as causas principais. Não ir à escola é uma condenação para a vida.

Violência Sexual
Os números no mundo dos ricos são assustadores. Por exemplo nos EUA 20% das mulheres já foram violadas na forma tentada ou concretizada. Mas, em países mais pobres e em guerra os números são bem mais preocupantes, como por exemplo na República Democrática do Congo, onde cerca de 70% das mulheres já foram violadas.

Mortalidade materna
Alguns países conseguem chegar ao número mágico de zero mortes por 100.000 nascimentos, mas no geral oscila entre 5-15 mortes por 100.000 nascimentos nos países ricos, sendo que, por exemplo, no Sudão do Sul são cerca de 1100 mortes maternas por 100.000 nascimentos. Além da constatação de que a probabilidade é ~100 vezes superior, percebe-se que 99% desta mortalidade do Sudão do Sul seria prevenível se tivessem acesso a cuidados de saúde. As causas principais são hemorragias, infecções e os abortos não medicamente assistidos. Sei que é eticamente discutível e eu compreendo bem alguns argumentos dos quais discordo, mas é também por isto que quem se dedica à saúde das mulheres nos países mais pobres luta também pela descriminalização do aborto.

Casamento infantil
O casamento antes dos 18 anos é uma violação fundamental dos direitos humanos, ainda assim é o destino de 12 milhões de raparigas por ano, sendo que em algumas regiões de África atinge 40% das raparigas, com a pobreza e os costumes como os maiores culpados.

Religião
As religiões de uma forma geral são machistas, pois machista é o Homem. É impossível não falar da discriminação levada a cabo por algumas culturas muçulmanas à cabeça, em países como o Afeganistão, Paquistão, Arábia Saudita, entre outros. A religião é aquilo que as pessoas querem que ela seja, até porque Maomé, fundador do Islão casou com uma mulher mais velha, empresária e independente no ano 600 d.C.. Que nunca permitamos, que a alegada palavra de Deus repetida pelo homem seja discriminadora de uma mulher, é a única coisa que me ocorre dizer.

Acesso ao voto
Na teoria, as mulheres podem votar em todo o mundo, sendo que há países onde ninguém vota, e há locais do planeta onde embora as mulheres possam votar, na prática não o fazem por repressões culturais duríssimas, por exemplo, em algumas zonas do Paquistão.

Mutilação genital feminina (MGF)
Significa a excisão parcial ou total do clitóris, sendo que tem inúmeras variações e pode ir ao ponto de se fazer a sutura da vagina. Quase sempre feito desde a nascença até aos 15 anos, pode pôr em risco a vida da menina/mulher no procedimento; e aquando de uma gravidez também compromete o recém-nascido. Há mais de 200 milhões de meninas e mulheres no mundo que foram submetidas a MGF e que estão vivas. É estúpido, cruel e criminoso.

Valor da vida humana
Há questões que vão do abstracto ao concreto e que são repugnantes para a humanidade. Mulheres que não podem guiar, fazer desporto, olhar um homem nos olhos, beber ou fumar, mostrar o cabelo ou a cara, sorrir, decidir sobre a sua vida, ter passaporte, assinar o consentimento informado de uma cirurgia (e morrem por isso), ou até mesmo leis costumeiras onde o valor da vida de uma mulher é de 50% da do homem.

Podemos ter várias causas e lutar por todas elas. Podemos em cada causa lutar por todas as suas subdivisões, mas que nunca percamos tempo em futilidades quando ainda há tanto do essencial por conquistar, e a luta pela igualdade é um tema que vincula todos os seres que pensam e sentem.

E, por isso, eu levo o Feminismo muito a sério.

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