A última dança de Adebayo Akinfenwa

Nunca jogou na Premier League, mas foi uma presença carismática e goleadora no futebol inglês das últimas duas décadas. Aos 40 anos, o avançado conhecido como “a Besta” terminou a carreira em Wembley.

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Akinfenwa jogou em 14 clubes diferentes ANDREW BOYERS/Action Images

Um jogo grande no maior dos palcos do futebol inglês. Wembley recebeu Sunderland e Wycombe Wanderers (e respectivos adeptos) para um jogo que vale uma temporada, a final do playoff de promoção ao Championship (segunda divisão). Bancadas cheias para ver jogar duas equipas do terceiro escalão, o suficiente para causar inveja a muitas equipas de primeira em muitas latitudes. Desde cedo, o Sunderland assumiu o comando do marcador e o Wycombe precisa de fazer alguma coisa. Aos 74’, o treinador manda entrar um avançado que irá fazer os seus últimos minutos como futebolista profissional. Será em Wembley que Adebayo Akinfenwa, conhecido no mundo do futebol como “a Besta”, irá ter a sua última dança.

Akinfenwa irá jogar 16 minutos, mais uns quantos de compensação, mas a sua presença em campo não será o suficiente para mudar os destinos deste playoff de promoção. O Sunderland ainda irá marcar mais um para garantir o regresso ao Championship depois de quatro épocas na League One, finalmente um passo em frente para uma equipa que já foi seis vezes campeã de Inglaterra e que tinha entrado em decadência acelerada. Para Akinfenwa, a história não acabou como ele queria, a ser o herói de mais uma promoção, a marcar o golo da vitória. Mas acabou.

Foi em Wembley que acabou a vida competitiva de Saheed Adebayo Akinfenwa, 40 anos, 22 deles a jogar futebol. Foram 14 equipas 233 golos marcados em 793 jogos disputados, numa carreira que passou pela Lituânia e pelo País de Gales e que nunca chegou à Premier League. Sempre a desafiar o estereótipo do futebolista atlético e esguio. Akinfenwa não é nada esguio. É exactamente o contrário, um corpo de 1,85m de altura e 103kg de peso, que fez vida de futebolista durante mais de duas décadas. Como o próprio disse em tempos, “às vezes é bom ser diferente”.

Akinfenwa é tido como o jogador mais forte do futebol mundial, com força nos braços para levantar 190kg. Mas se fosse só isto, ele não teria tido uma carreira tão longa. Ele sabia jogar à bola e sabia marcar golos. “A minha carreira e os meus números falam por si. Dizer que tenho alguma coisa a provar, dizer, ‘olhem, sei jogar, não sou apenas um tipo grande’, não é algo que me motive na vida”, contou.

Nascido em Londres e adepto do Liverpool, Akinfenwa foi um emigrante aos 18 anos, escolhendo como destino um país que desconhecia, a Lituânia, onde aprendeu a relativizar a importância das coisas. Sofreu ameaças de morte por ser negro, até dos adeptos da própria equipa. “Somos produtos dos nossos ambientes e das nossas experiências. Cresci muito na Lituânia, fiquei menos vulnerável. Não podemos controlar a percepção das outras pessoas e, a partir do momento em que nos sentimos confortáveis, ficamos bem. Disseram-me que me queriam matar pela cor da minha pele. Por que é que eu me havia de importar quando dizem que sou gordo?”, contou numa entrevista recente ao The Athletic.

De regresso às ilhas britânicas, Akinfenwa foi ganhando a fama de “Besta”, sempre confortável com a celebridade que o seu imponente físico lhe proporcionava. “Gosto de ser o maior em campo, não de ver outros tipos com braços maiores que os meus”, diz o avançado, que se tornou numa figura de culto nas divisões secundárias do futebol inglês, apesar de nunca ter ido mais acima da segunda divisão e já no final de carreira – foi em 2020, subindo ao Championship com o Wycombe, e até recebeu uma mensagem vídeo de parabéns de Jurgen Klopp, treinador do Liverpool.

“Não peço desculpa por ser quem sou. Sermos fiéis a nós próprios é o mais poderoso que podemos fazer como indivíduos”, declarou ao Guardian o avançado com o peso acima dos três dígitos. “Disseram-me que era demasiado grande para jogar futebol e joguei este jogo durante 22 anos. Não preciso que ninguém me dê palmadinhas nas costas. Sento-me e digo a mim próprio, ‘B, estiveste bem.”

E foi quase em lágrimas que Bayo, a “Besta”, se despediu, ainda no relvado de Wembley, aos microfones da Sky Sports, terminando a conversa com um abraço ao jornalista que o entrevistava. “Nunca pensei que ainda estaria a jogar aos 40 anos, nunca pensei que o meu último pontapé numa bola seria aqui. Se vou continuar? Não, não, não. Os meus joelhos estão a gritar comigo há muito tempo. E agora segue-se o mundo, vou conquistar o mundo.”

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