New York Times publica provas sobre execução de civis em Bucha

O cruzamento entre imagens de vídeo, fotografias, documentos e testemunhas oculares reconstrói os últimos momentos de vida de um grupo de civis ucranianos, mortos por soldados russos no início de Março.

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A descoberta de valas comuns e cadáveres nas ruas de Bucha chocou o mundo OLEG PETRASYUK / EPA

Um trabalho de investigação do New York Times revela, pela primeira vez, imagens que mostram a execução de civis ucranianos em Bucha por militares russos.

O jornal norte-americano teve acesso a vídeos gravados por moradores e por câmaras de videovigilância a 4 de Março em que é possível ver um grupo de nove homens em roupas civis a caminhar em fila indiana forçados por militares russos que lhes apontavam armas. As imagens mostram que os homens são levados para um pátio ao lado de um edifício que estaria a ser utilizado pelas forças russas como sede das operações nos arredores de Kiev.

Ouvem-se tiros e os ucranianos nunca mais voltam a sair do pátio. O jornal recorreu a imagens captadas por um drone do Exército ucraniano que sobrevoou Bucha no dia seguinte em que é possível discernir corpos caídos no mesmo pátio para onde os civis tinham sido levados. Combinando com fotografias captadas semanas depois quando a cidade foi abandonada pelas forças russas, confirma-se tratar-se de civis executados a tiro.

A revelação de corpos e valas comuns em Bucha e noutras localidades próximas de Kiev, após a retirada do Exército russo, foi recebida como um choque por grande parte da opinião pública mundial, merecendo ampla condenação. Esta semana, o Tribunal Penal Internacional anunciou o envio de uma equipa de peritos para a Ucrânia para recolher provas e indícios de crimes de guerra cometidos durante a invasão iniciada a 24 de Fevereiro.

O Governo russo não respondeu aos pedidos de comentário a estas revelações feitos pelo New York Times, mas o Kremlin tem negado as acusações feitas pela Ucrânia de que executou civis durante o período em que ocupou parte dos arredores da capital. Segundo Moscovo, todas as imagens que foram sendo divulgadas não são mais do que uma “encenação” para prejudicar a imagem internacional da Rússia. As provas recolhidas e divulgadas pelo jornal reforçam a acusação de que foram cometidos crimes de guerra pela Rússia em Bucha.

Ao longo de várias semanas, os repórteres do diário norte-americano conseguiram reconstituir o processo que levou à execução de nove ucranianos em Bucha, e identificar cada um deles, recorrendo a informação nas redes sociais, testemunhas e relatórios de médicos legistas.

Todos eles estavam integrados nas Forças de Defesa Territorial, uma unidade composta por civis que apoiam o Exército na defesa e segurança de infra-estrutura crítica. Ivan Skiba, um operário da construção civil de 43 anos, era um deles e estava entre um grupo que foi capturado pelos militares russos em Bucha.

Depois de terem passado uma noite escondidos num armazém próximo do checkpoint em que estavam estacionados, os homens foram capturados e levados para a base improvisada das forças russas. Foram interrogados e revistados, até que um deles confessou que eram milicianos voluntários. O homem foi libertado e, segundo o Times, está a ser investigado por “alta traição”.

Os soldados russos decidem então executar os civis ucranianos, de acordo com os testemunhos de Skiba e de outras pessoas que também estavam a ser interrogadas. “Vamos livrar-nos deles, mas não aqui para que os corpos não fiquem espalhados”, disse um dos militares, segundo Skiba.

Os homens foram levados para o pátio e baleados, incluindo Skiba. Porém, a bala entrou e saiu pelo abdómen, não o ferindo mortalmente. O ucraniano permaneceu imóvel enquanto ouvia os militares russos a balearem alguns dos civis que ainda se mexiam. Skiba fingiu estar morto até deixar de ouvir as vozes dos soldados e fugiu. O Times confirmou a versão acerca do ferimento de Skiba junto de médicos que o trataram.

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