Marcelo recorda massacre de Santa Cruz e admite que a descolonização portuguesa não correu bem

O Presidente passou o dia em Timor para assistir à investidura de José Ramos-Horta e trocar condecorações com o anterior presidente timorense, Francisco Guterres Lú-Olo.

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O Presidente visitou a campa do jovem Sebastião Gomes LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Em visita a Timor-Leste, para a cerimónia de investidura de José Ramos-Horta, que tomou esta quinta-feira posse como presidente do país, Marcelo Rebelo de Sousa passou pelo cemitério de Santa Cruz, na cidade de Díli, 31 anos depois do massacre perpetrado pelas tropas indonésias que aí teve lugar, onde recordou como esse momento histórico “acordou as opiniões públicas” e admitiu que alguns aspectos do processo de descolonização português “não correram bem”.

“De repente, certo tipo de realidades são uma espécie de faísca que desperta as consciências em Portugal e no mundo. O que se passou foi espantoso. Aquele povo que tinha a nossa solidariedade, mas estava muito isolado ao nível de grandes potências mundiais, acordou as opiniões públicas”, afirmou o Presidente, salientando como através das imagens registadas a 12 de Novembro de 1991 pelo jornalista Max Stahl “todos os portugueses que tenham mais de 50 anos” têm hoje memória do massacre de Santa Cruz, onde mais de 200 pessoas morreram.

Para o Presidente, foram essas imagens que permitiram acelerar o processo de independência do país, que “chegaria sempre à independência”, diz, mas poderia ainda ter passado por “resistência, mortes, sacrifícios, prisões de dominação” sem a divulgação da CNN do assassinato dos timorenses que se refugiaram no cemitério para escapar ao ataque dos militares indonésios.

Deixando uma nota sobre como o povo timorense “resistiu e venceu” contra a invasão da Indonésia, apesar de “todos os argumentos, toda a geopolítica, da localização geográfica” e “de estar em condições de isolamento no mundo”, Marcelo referiu ainda que o apoio prestado pelos portugueses no processo de ocupação de Timor e na transição para a independência poderá ter servido de “redenção” face ao processo de descolonização português, anos antes, em que alguns aspectos “não correram bem”.

“Uma espécie de redenção, ao menos parcial, do nosso país e do nosso povo quando, compreendendo os erros cometidos, alinha ao lado do povo timorense, sem uma dúvida, sem uma hesitação”, defendeu, acrescentando que esta foi a “única causa que teve o apoio de 100% dos portugueses em tantos anos de democracia”.

Relembrando os relatos que chegaram no dia seguinte a Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa considerou também que a “afirmação em língua portuguesa” do povo timorense, à data da independência, foi uma “maneira de rejeitar a língua do invasor, a imposição cultural do invasor”.

Na visita, o Presidente terá visitado a campa de Sebastião Gomes, jovem de 18 anos assassinado no decorrer de um ataque à igreja de Motael, em Outubro de 1991 e em cuja homenagem se deu o massacre, no seguimento de protestos contra as autoridades indonésias.

Também estiveram presentes o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Gravinho e a vice-presidente da Assembleia da República, Edite Estrela.

Depois da visita ao cemitério, a cerimónia no Palácio Presidencial, na capital de Timor, contou com uma troca de altas condecorações de Estado entre Marcelo e o ex-presidente timorense, Francisco Guterres Lú-Olo. O chefe de Estado português terá recebido o Grande-Colar da Ordem de Timor-Leste, ao passo que o presidente cessante de Timor foi distinguido com o Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique. Com Lusa

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