Abrir a porta aos produtores independentes? RTP e SIC dizem que sim, TVI prefere produzir em casa

Director de programas da RTP defende a criação de uma plataforma que agregue conteúdos on-demand das três televisões nacionais, mas os concorrentes privados não se mostram interessados.

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Nuno Lopes em "Operação Maré Negra": RTP com a espanhola Ficción Producciones e a portuguesa Ukbar Filmes para a Amazon Prime VideoO

Depois da pandemia, em que o apoio aos agentes da cultura, incluindo do cinema e do audiovisual, se tornou fundamental, os produtores independentes de televisão tentam retomar a actividade: na estação pública está aberta a consulta de ideias para novos conteúdos, na SIC as “portas estão abertas” porque além do canal generalista e dos temáticos é preciso encher a grelha da plataforma de streaming Opto. Mas a TVI, que tem a produtora Plural, não tenciona recorrer ao mercado e prefere continuar a fazer dentro de portas. Foi isso que admitiu a directora de entretenimento e ficção, Cristina Ferreira, perante a plateia do encontro de produtores independentes de TV que se realizou nesta terça-feira em Lisboa, por ocasião dos 25 anos da respectiva associação de produtores, a APIT.

“Primeiro fazemos nós [na Plural Entertainment] e depois recorremos a eles [produtores independentes]. Trabalhamos muito para nós, temos quatro produtos de ficção feitos pela Plural em antena”, disse Cristina Ferreira, admitindo haver constrangimentos financeiros – um problema apontado por diversas vezes durante uma hora de debate. “Sete episódios de uma série custam o mesmo que uma novela. Gostávamos de poder fazer experiências como a RTP, mas não temos capacidade”, apontou a responsável do canal de Queluz. “Há sempre um fim maior que é no fim do dia ganharmos dinheiro e audiências. Nada do que temos em antena, tanto eu como o Daniel Oliveira [da SIC], é o que sonhávamos ter; é o que temos capacidade para fazer”, afirmou, lembrando os condicionalismos dos canais comerciais.

O seu maior concorrente, o director geral de entretenimento da SIC, operadora que depende da produção externa uma vez que não existe uma produtora participada pela Impresa, foi enumerando os seus principais fornecedores – Shine, Fremantlemedia, Até ao Fim do Mundo, Endemol, Coral, SPI , entre outros mais pequenos. “Procuramos diversificar as fontes de produção, o know-how, a forma de trabalhar, para não nos fecharmos num molde. Temos a preocupação de ser um motor da indústria”, disse Daniel Oliveira, no que se podia ler como uma crítica ao tipo de novelas saídas da quinta de Bucelas.

A RTP, fruto das obrigações de serviço público que estipulam quotas de produção nacional e a promoção da indústria audiovisual nacional , tem mesmo de trabalhar com os produtores independentes. O director de programas não deixou de vincar que o grupo “produz centenas de conteúdos” fora de portas em diversas áreas, do documentário ao entretenimento, passando pela ficção. Será no concurso de consulta de conteúdos aberto actualmente na plataforma da RTP que os directores vão encontrar conteúdos para os anos seguintes.

José Fragoso realçou a necessidade de as televisões trabalharem em parceria com produtores mas também com outros canais estrangeiros. No caso da estação pública, foi esse o modelo por trás de Auga Seca, co-produção com a TV Galicia, que já foi comprada pela HBO; de Crimes Submersos, parceria com a TVE; ou ainda de Operação Maré Negra, desenvolvida para a Amazon Prime com a espanhola Ficción Producciones e a portuguesa Ukbar Filmes.

Foi, aliás, também o responsável da televisão pública que lançou um desafio que não teve acolhimento pelos concorrentes privados: José Fragoso defendeu que se devia estudar a possibilidade de Portugal ter uma plataforma que agregue os conteúdos das três televisões. O director de programas da RTP considera que “não há combate directo entre o streaming e a TV” porque o primeiro permite escolher entre todos os conteúdos em simultâneo à mesma hora ao passo que a TV tradicional oferece apenas um conteúdo. Para além de que um serviço de streaming não têm conteúdo para todos os gostos.

Cristina Ferreira recusou liminarmente a ideia: lembrou que as televisões não se conseguem entender nem para uma “entrega de prémios conjunta”. E argumentou: “Podia ser estudado. Seria bom para o público em geral; não sei se seria bom para as operadoras de televisão”. Daniel Oliveira também rejeitou, dizendo que os produtores independentes também não costumam juntar-se para projectos “em grande” e até lembrou que o Sporting e o Benfica nunca aceitariam uma ideia pré-Euro 2004 de construírem um estádio comum. “Tem a ver com a identidade. Cada televisão é distinta.”

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