FMI revê PIB português em alta, mas mantém-se mais pessimista que Bruxelas

Bem mais preocupado com os efeitos da pandemia e da guerra na economia portuguesa que a Comissão Europeia, FMI vê o PIB a crescer 4,5% este ano, com a inflação a chegar aos 6%.

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FMI está precocupado com os efeitos retardados da crise pandémica que ainda possam vir a fazer-se sentir na economia portuguesa Yuri Gripas

Apesar de ter revisto em alta as suas previsões para o ritmo da retoma, o Fundo Monetário Internacional continua a ser mais pessimista que o Governo relativamente ao crescimento da economia portuguesa este ano e a apontar para uma escalada da inflação significativa, ficando muito distante das estimativas de variação do PIB muito forte e de inflação relativamente moderada que, também esta segunda-feira, foram apresentadas pela Comissão Europeia para Portugal.

No final da missão que realiza anualmente para analisar a evolução da economia portuguesa (em cumprimento do artigo IV da instituição), a equipa do FMI que visitou Lisboa apontou, numa declaração publicada esta segunda-feira, para um crescimento do PIB este ano de 4,5% e de 2% em 2023.

A previsão de 4,5% para este ano representa uma melhoria face aos 4% que o FMI tinha projectado há menos de um mês nas suas projecções de Primavera para a economia mundial. No entanto, esta melhoria das expectativas que deverá resultar da taxa de variação surpreendentemente forte do PIB português entretanto dada a conhecer para o primeiro trimestre do ano pelo INE – não é suficiente para que o FMI continue a ser uma das entidades menos optimistas em relação ao desempenho no curto prazo da economia portuguesa.

Ao prever um crescimento de 4,5% este ano, o FMI não só continua a apontar para um abrandamento face ao resultado de 2021, como fica abaixo da projecção de 4,9% feita pelo Governo na proposta de Orçamento do Estado para 2022. E ainda mais notória é a diferença de expectativas face à Comissão Europeia que, também esta segunda-feira, reviu fortemente em alta as suas previsões de crescimento para a economia portuguesa para 5,8% este ano e 2,7% no próximo.

No que diz respeito à taxa de inflação, que em Abril tinha dito que ficaria nos 4%, o Fundo estima agora que pode chegar aos 6% este ano, bem mais do que os 4% projectados pelo Governo no OE e que os 4,4% estimados esta segunda-feira pela Comissão Europeia.

As principais diferenças entre as expectativas do Fundo e as da Comissão Europeia parecem estar, por um lado, no impacto que se estima que a guerra na Ucrânia possa vir a ter na economia portuguesa e, por outro, nos efeitos negativos de médio prazo que se calcula que a pandemia ainda possa vir a ter, principalmente nas empresas.

No que diz respeito à guerra na Ucrânia, enquanto em Bruxelas se destaca o facto de Portugal estar entre os países menos afectados, o FMI insiste, na declaração feita no final da missão ao país, que há motivos para pensar que o ritmo de crescimento será fortemente afectado.

“Embora as ligações directas com a Rússia e a Ucrânia sejam limitadas, o contágio da guerra através de preços mais altos na energia, maiores estrangulamentos na oferta, confiança mais fraca, procura externa reduzida e condições financeiras mais apertadas vai pesar na recuperação e fazer subir os preços”, dizem os técnicos do Fundo, lembrando que as suas actuais previsões de crescimento para 2022 e 2023 “representam uma diminuição acumulada de um ponto percentual relativamente ao período pré-guerra”.

Depois, é notória a preocupação do FMI com alguns efeitos retardados da crise pandémica que ainda poderão fazer-se sentir na economia portuguesa. Para além da possibilidade de “novas ondas do vírus” e de o facto de a dívida pública, embora a descer, ter atingido níveis muito elevados, o Fundo alerta que os “efeitos do fim das moratórias de crédito ainda não se materializaram totalmente e podem eventualmente expor insolvências mais altas, reduzindo o investimento e o capital dos bancos”.

É por isso que, entre as prioridades de política económica recomendadas a Portugal pelos técnicos do FMI, está uma normalização dos processos de insolvência em Portugal que permita accionar os mecanismos de capitalização que foram criados no decorrer da pandemia.

Outra recomendação é a de manter uma “monitorização apertada da qualidade do crédito dos bancos”, devido não só às moratórias, como também à subida dos preços do imobiliário. O Fundo diz mesmo que “o Banco de Portugal pode considerar a possibilidade de introduzir uma almofada de capital contracíclica ou uma almofada sectorial sistémica contra potenciais riscos macrofinanceiros criados pela exposição dos bancos ao imobiliário”.

O FMI recomenda também que, depois da forte intervenção do Estado durante a pandemia, de deve iniciar, “a partir de 2023, um ajustamento orçamental gradual”, para que se “reconstrua um espaço orçamental, se encarem as pressões na despesa relacionadas com o envelhecimento, se aumente o investimento público e se reduzam os riscos relacionados com a dívida”.

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