Sofia Couto e Sérgio Antunes contam os segredos escondidos que o Open House Lisboa quer revelar

Uma conversa com os comissários do Open House Lisboa, que a 14 e 15 de Maio abrirá portas de diversos edifícios para revelar uma “arquitectura invisível”. O podcast No País dos Arquitectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. Subscreva nas plataformas para podcast.

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Verride Palácio de Santa Catarina Francisco Nogueira

No 39.º episódio do podcast No País dos Arquitectos, Sara Nunes, da produtora de filmes de arquitectura Building Pictures, conversa com os arquitectos Sofia Couto e Sérgio Antunes, do atelier Aurora Arquitectos, sobre o Open House Lisboa (OHL), do qual são comissários este ano.

Na sua 11.ª edição, o Open House Lisboa regressa mais cedo do que o habitual e realiza-se já neste fim-de-semana, a 14 e 15 de Maio. Sofia Couto e Sérgio Antunes foram rebeldes ao ponto de quererem dar visibilidade a uma arquitectura invisível, por isso o tema proposto para este ano é “A Rebeldia do Invisível”.

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O principal objectivo é explorar o que se esconde por detrás das fachadas, que não deixam antever os seus interiores: “A nossa ideia começou por procurar esta cidade mais anónima, mas acabamos por ir parar também a alguns edifícios de excepção, nomeadamente a alguns palácios. (...) Temos, inclusive, situações que já vêm detrás que revelam as adaptações que os interiores precisam de sofrer para se irem adaptando aos novos usos”, começa por esclarecer Sofia Couto.

Como existe essa capacidade da arquitectura se transformar ao longo dos anos, os arquitectos procuraram trazer para este evento espaços que, de certa forma, representassem essa metamorfose: “A maior parte dos edifícios que nós trazemos aqui são edifícios que ilustram esta questão, que ilustram este desfasamento entre o exterior e o interior. (...) Eu não queria fazer nenhum moralismo a partir da ideia de coerência entre interior e exterior. Aliás, acho até muito interessantes esses contrastes de tempo, muitos dos edifícios que nós temos aqui expõem esse contraste. Eles atacam, usam e brincam com esse contraste, entre os dois tempos”, explica Sérgio Antunes.

Entre palácios icónicos e projectos arquitectónicos concluídos recentemente, destacam-se vários espaços da cidade de Lisboa e Almada: o Palácio do Manteigueiro, onde é possível apreciar a escadaria nobre; o Palácio Ratton, hoje património do Tribunal Constitucional; o Palácio Verride, convertido num “hotel de cinco estrelas, que cumpre uma série de exigências”; a Casa dos Gessos, do Museu Militar de Lisboa, “um segredo muito bem guardado”, com o molde desenhado no século XVIII de uma das maiores estátuas do país, a imagem do rei D. José I; a Igreja de Nossa Senhora da Oliveira, também conhecida por “Oliveirinha”, “que substitui uma igreja pré-pombalina”, o Edifício Manchester, do RAR.Studio e o Cardiff 28, um edifício que conservou a fachada original do início do século XX.

O evento aposta em espaços privados, que normalmente estão inacessíveis ao público e é para todos – profissionais, curiosos, estudantes, famílias – os que reconhecem na arquitectura um mundo fascinante. Fomentando o diálogo e a partilha, o Open House é um dos eventos que mais aproxima as pessoas à arquitectura.

Durante a entrevista, os arquitectos lembram que o atelier Aurora já tinha participado no Open House em edições anteriores. Olhando em retrospectiva, ambos consideram que essa partilha era “um momento especial”, não só porque permitia o contacto com o público, mas também lhes dava oportunidade de saírem do seu “círculo mais ou menos fechado”: “Era um momento incrível porque as pessoas diziam coisas sobre o que fazíamos. Diziam coisas boas, coisas más e coisas inesperadas. E isso é uma forma de nos devolverem aquilo que fazemos. Uma forma directa. Ou seja, um espelho directo. Nada de muito complicado. Era sempre incrível”, recorda Sérgio Antunes.

Convém informar que o programa se estende, pela segunda vez consecutiva, até à margem sul do Tejo e explora, em conjunto, as cidades de Lisboa e Almada. A iniciativa envolve aproximadamente 70 espaços para visitas gratuitas, bem como um conjunto de percursos urbanos e passeios sonoros: “Eu diria que o menos importante na cidade é a sua estrutura física. O mais interessante é aquilo que se cola aos edifícios. É a meta-informação da cidade. E é isso que eu espero que todas estas visitas nos tragam. É este aspecto de nos interrogarmos: o que é que eu não vejo aqui?”, sublinha Sérgio Antunes.

O Open House é organizado pela Trienal de Arquitectura de Lisboa, que tem desenvolvido um trabalho determinante na divulgação e promoção da arquitectura. O programa consiste em três tipos de visitas aos espaços: visitas livres sem acompanhamento, visitas por voluntariado e visitas por especialista. No caso destas últimas, os arquitectos informam que, normalmente, as visitas a edifícios com intervenções recentes são feitas pelos arquitectos, autores do projectos, mas nos edifícios mais icónicos como o Palácio Ratton ou o Palácio do Manteigueiro, são “as pessoas que trabalham no local ou que, de alguma forma, têm ligação ao local” a servir de guia para que assim os visitantes possam ficar com outra percepção sobre a história do lugar. A par destas visitas, Sofia Couto e Sérgio Antunes convidaram ainda várias pessoas para fazer percursos urbanos acompanhados com arquitectos (Paula Melâneo, Flávio Lopes e Lucinda Correia) e jornalistas (Joana Stichini, Vítor Belanciano). Já o passeio sonoro Do Cais do Sodré ao Rossio será feito pelo artista Daniel Blaufuks. Tal como os passeios das edições anteriores, ficará disponível no SoundCloud e Spotify do Open House Lisboa.

Com o propósito de orientar os milhares de visitantes, a Trienal conta sempre com uma equipa de voluntariado. Esta participação é determinante não só para o visitante, que vem à descoberta da cidade, mas também para os próprios voluntários que acabam por fazer parte de uma família e experienciar a arquitectura de outra forma. Perante esse universo de possibilidades, Sérgio Antunes revela também outra forma de olhar para os edifícios, fazendo uma analogia com o Fernando Pessoa: “Não devemos ter opiniões fechadas e fazer grandes moralismos sobre qual é o ponto certo da reabilitação, da relação entre o interior e o exterior e da ‘verdade’ dos edifícios. Era uma coisa que eu já suspeitava. Isso da verdade tem muito que se lhe diga e acho que sai reafirmado por mim, sem dúvida. Outra lição é esta questão de que os interiores são... Muitas vezes, usávamos esta analogia com Fernando Pessoa... Tu vias o Fernando Pessoa na rua e ele era um senhor igual aos outros todos, compostinho, com o chapelinho, mas depois tinha uma grande explosão interior. O que nos fez ver tantos destes edifícios é isso mesmo: há muitos edifícios de explosão interior”.

Se por um lado, os interiores sofrem alterações para se adaptarem às novas tipologias, por outro, existe uma “preocupação muito grande e que é legítima relativamente à identidade exterior dos edifícios”. Sofia Couto reflecte sobre isso mesmo, partilhando ainda algumas das aprendizagens que este evento lhe proporcionou: “O facto de eu ter de estar um período tão intensamente a estudar e a procurar estas situações, deu-me um grande sentido de partilha e há um lado muito positivo. É que as pessoas estão mesmo preocupadas com a forma como se deve intervir, do que isso significa e do resultado que depois se consegue obter a partir daí. Há diversas respostas, mas existe uma linha de pensamento que eu acho que é muito comum a todos os arquitectos”.

Para saberem mais sobre a 11ª edição do Open House Lisboa, comissariado pelos Aurora Arquitectos, ouçam a entrevista na íntegra. Já agora, convém informar que o mesmo evento tem lugar na Invicta – Open House Porto (OHP) – e realiza-se nos dias 2 e 3 de Julho. O objectivo, mais uma vez, é o mesmo: celebrar a arquitectura.


No País dos Arquitectos é um dos podcasts da Rede PÚBLICO. Produzido pela Building Pictures, criada com a missão de aproximar as pessoas da arquitectura, é um território onde as conversas de arquitectura são uma oportunidade para conhecer os arquitectos, os projectos e as histórias por detrás da arquitectura portuguesa de referência.

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