E tudo o vento levou

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Selznick/MGM/Kobal/REX/Shutterst

Há um filme dentro de O Exército das Sombras (1969) de Jean Pierre Melville. É E Tudo O Vento Levou (1939), mas não o vemos. Dele, o cineasta francês mostra um cartaz — Clark Cable debruçado sobre Vivien Leigh — um letreiro colorido em Londres e o eco, brevíssimo, do famoso Tara’s Theme que Max Steiner, austríaco judeu emigrado nos EUA, compôs para banda sonora do filme. Quem de facto contempla a oscarizada obra de Hollywood são duas personagens — resistentes franceses — uma das quais, findada a sessão, dirá à outra: “Para os franceses, a guerra acabará quando virem este maravilhoso filme”. Interpretada à luz dos acontecimentos que marcaram a segunda metade do século XX, a frase não é controversa. De facto, quando a Segunda Guerra Mundial terminou, os franceses puderam acolher e amar o cinema de Hollywood. Hoje, e sob o peso de leituras mais coevas, a sequência — que chega a ser onírica — entrega-se a análises mais instáveis e complexas. É difícil dar-lhe um sentido unívoco e ou categórico. Afinal, aquela melodia é transformada por Jean-Pierre Melville em prelúdio da libertação da opressão e da injustiça. Terá ponderado o cineasta sobre esta apropriação? Com que fim? Longe dos motivos e das intenções, quase sempre imperscrutáveis, experimento a música. Põe-me sob o feitiço de Hollywood, mas não absolutamente. Liberta-me da fragmentação do tempo, oferece-me um instante eternamente novo e reconcilia-me, se não com a História, comigo mesmo.

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