Projecto cultural da cidade de Aveiro não resiste à pandemia e Cine-Teatro Avenida volta a fechar

Avenida Café-Concerto fecha portas a 10 de Junho. Promotores estão empenhados em encontrar uma alternativa, mas assumem que será difícil ter um projecto com a mesma dimensão.

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O Avenida tinha reaberto em 2018 ADRIANO MIRANDA

O emblemático Cine-Teatro Avenida, de Aveiro, vai voltar a encerrar ao público. O projecto cultural que ali tem estado a ser dinamizado não resistiu aos efeitos da pandemia, sendo já garantido que, a 10 de Junho, o Avenida Café-Concerto – foi este o nome com o qual a sala foi baptizada nesta nova fase da sua vida – termina. A dois meses de poderem voltar a soprar as velas, os promotores do projecto têm de fazer as malas e sair. E ainda que estejam a tentar encontrar uma alternativa, têm consciência de que será difícil ter um projecto que consiga abranger tantas vertentes artísticas como as que têm vindo a dinamizar.

“A bomba caiu-nos em cima há dois meses”, explica Hugo Pereira, um dos promotores do projecto que, em Agosto de 2018, surpreendeu os aveirenses com a reabertura da sala de espectáculos que faz parte da história da cidade e do país – o Avenida serviu de palco, em Abril de 1973, ao III Congresso da Oposição Democrática. Ainda que tivessem um acordo verbal para o pagamento das rendas referentes aos meses de confinamento, em que a sala de espectáculos esteve fechada, os agentes culturais foram confrontados com o aviso do senhorio: “Ou pagávamos todas essas rendas já ou íamos embora com o perdão total da dívida”, contam. Não havia muito a decidir. “Com o contrato de arrendamento a acabar em Abril do próximo ano e com o investimento ainda por recuperar, não havia outra forma”, lamentam.

Hugo Pereira, Patrícia Surrador e Daniel Fernandes não escondem que a dor é grande. Os dois primeiros - o terceiro sócio, só entrou no projecto mais tarde, apoiando a reabertura do espaço após o segundo confinamento - lembram-se bem de como encontraram aquela casa em 2018. Aquela parte do imóvel inaugurado em 1949 tinha estado fechada durante vários anos, obrigando-os a investir na reconstrução e requalificação do espaço. “Dói por todo o investimento que fizemos aqui e que agora não conseguimos recuperar. Íamos fazer quatro anos, mas na realidade só estivemos a trabalhar dois anos”, lamentam.

O Avenida Café-Concerto vai, assim, ao fundo, vítima da pandemia e com o empurrão da especulação imobiliária. Depois de verem algumas lojas do edifício a fechar portas, os promotores do projecto receiam que possa haver o interesse de vender o imóvel ou arranjar novos inquilinos. Seja como for, o último concerto com a marca “café-concerto” acontece a 10 de Junho e será protagonizado pelos Holocausto Canibal. “Achámos que a melhor maneira de sair era aos berros”, referem, aludindo ao estilo musical da banda (grindcore) a quem caberá fechar a casa.

Futuro pode passar por um clube

Hugo Pereira, Patrícia Surrador e Daniel Fernandes admitem estar à procura de um outro espaço na cidade de Aveiro, conscientes de que o novo projecto não poderá ter a dimensão do Avenida Café-Concerto. Será muito difícil encontrar outro espaço no centro da cidade com bar e auditório com capacidade para 400 pessoas. “O futuro deverá passar por um clube de música, do género do Maus Hábitos ou do Musicbox”, revelam.

De fora terão de ficar todas as outras vertentes artísticas que o Avenida Café-Concerto foi abraçando desde Agosto de 2018, parte delas resultantes de parcerias com outros agentes e projectos culturais, de que é exemplo o Shortcutz, PortoFemme ou o Samba na Ria, entre outros. “Alguns deles podem ter espaço no futuro projecto. Danças, teatros e circo, é que terão de ficar de fora”, lamenta Hugo Pereira.

Resta, agora, saber o que o futuro reserva a este projecto da cidade candidata a Capital Europeia da Cultura 2027. Os promotores garantem já ter solicitado o apoio da autarquia, mas ainda aguardam respostas. “O que pretendemos nem é apoio financeiro, é uma ajuda para encontrar um espaço ou agilizar licenciamentos que venham a ser necessários numa outra localização”, asseguram.

Ao PÚBLICO, o presidente da câmara, Ribau Esteves, reconheceu a relevância do projecto. Contudo, tratando-se de propriedade privada, no seu entender, a autarquia nada pode fazer. “Há um destino novo para o edifício e o proprietário tem esse direito”, revelou, assegurando não ter ainda conhecimento, em “definitivo”, dos planos para o imóvel.

Só este ano, o Avenida Café-Concerto já recebeu mais de 40 eventos. No primeiro ano de funcionamento, pré-pandemia, aquela casa presenteou a cidade com 115 concertos, 11 sessões de cinema, 12 festas, seis exposições, quatro performances de dança e sete peças de teatro.

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