Lixo marinho dos Açores vai ser transformado em têxteis: “É uma necessidade, não uma tendência”

Para além do lixo marinho, será trabalhada uma alga invasora identificada nos Açores pelo centro Okeanos, da Universidade dos Açores.

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Um consórcio que reúne empresas e investigadores quer transformar lixo marinho e algas infestantes dos Açores em fios, telas ou membranas, que darão origem a uma colecção têxtil.

“Com este projecto, iremos desenvolver o nosso próprio fio, feito a partir de desperdícios do mar, desenvolver uma tela ou uma membrana que poderá servir ou de isolamento ou de protecção solar e, com isso tudo, fazer uma colecção têxtil e integrar todos estes produtos numa cabana que será feita a partir de barcos descaracterizados ou parados na nossa orla costeira”, avançou à Lusa, a empresária Nieta da Ponte Rocha.

Natural de Angra do Heroísmo, nos Açores, a arquitecta viveu duas décadas em Guimarães, mas há três anos regressou a casa e instalou-se no Parque de Ciência e Tecnologia da Ilha Terceira (Terinov).

Desde 2015 que a empresa Circular Blue, detentora da marca Nieta Atelier, cria cabanas ecológicas e o seu mobiliário, a partir de materiais sustentáveis. “Apenas trabalhamos com espécies endémicos ou infestantes, desperdícios têxteis ou excedentes de qualquer indústria têxtil”, explicou a empresária. “É uma necessidade, não é uma tendência”, sublinhou.

O projecto Azores EcoBlue, apresentado no Terinov, vai colocar a empresa a trabalhar novas matérias-primas, retiradas do oceano ou de zonas costeiras. Para além do lixo marinho, será trabalhada também uma alga invasora identificada nos Açores pelo centro Okeanos, da Universidade dos Açores.

Segundo Nieta da Ponte Rocha, o lixo será “recolhido em parceria com autarquias locais, associações de armadores, mulheres de pescadores e escolas”. “Iremos tentar integrar ao máximo a sociedade. É o nosso principal objectivo”, salientou, acrescentando que estão previstos workshops e sessões de sensibilização.

O projecto-piloto vai arrancar nas ilhas de São Miguel, Terceira e Faial, mas o objectivo é expandi-lo para outras ilha e “além-fronteiras”. O consórcio, liderado pela Circular Blue, integra ainda o Terinov, o Okeanos, a Universidade do Minho, a empresa Visual Thinking, o Centro Internacional de Investigação do Atlântico (Air Centre), a Associação Empresarial de Portugal (AEP) e o Centro de Inovação da Islândia.

Financiado pelo EEA Grants e pela Direcção-Geral de Política do Mar, o projecto orçado em cerca de 680 mil euros, será desenvolvido até 2024.

Presente na apresentação, o secretário regional do Ambiente e Alterações Climáticas dos Açores, Alonso Miguel, destacou a importância deste tipo de iniciativas no combate a um problema “muito significativo” para a região. “Todos os projectos que surgirem e que possam olhar para lixo marinho como uma matéria-prima, como um novo produto de valor ecológico, naturalmente são projectos extraordinariamente importantes e espero que o Azores EcoBlue possa ser precursor de muitos outros projectos desta natureza”, adiantou, em declarações à Lusa.

Apesar de “grande parte do lixo” encontrado na orla costeira dos Açores não ser “produzido localmente”, desde 2015, foram recolhidas na região “cerca de 62 toneladas de lixo marinho”, em 336 campanhas de limpeza. “A sensibilização e a consciencialização das populações estão na base de todo este processo que temos de fazer para uma economia circular e para uma economia azul. Para além disso, é preciso apostar na inovação e na tecnologia para ganhar capacidade de transformação de um resíduo numa matéria-prima ou num produto de valor ecológico”, frisou Alonso Miguel.

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