O que se sabe sobre os casos de hepatite aguda em crianças?

As autoridades de saúde de todo o mundo investigam um aumento de casos graves de hepatite – inflamação do fígado – em crianças. O que se está a passar? Quais são os sintomas?

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Portugal não tem casos conhecidos de hepatite aguda em crianças PAULO PIMENTA

O que se está a passar?

Foram identificados cerca de 190 casos graves de hepatite em pelo menos 12 países. A maioria foi detectada na Grã-Bretanha, que comunicou 111 situações desde Janeiro.

Em Portugal ainda não foram identificados casos, confirmou a Direcção-Geral de Saúde (DGS) ao PÚBLICO, mas as autoridades estão atentas a essa possibilidade e a trabalhar de forma articulada. Espanha é um dos países que já reportou casos desta doença, à semelhança dos Estados Unidos, Dinamarca, Irlanda, Países Baixos ou Israel.

Porque está a causar preocupação?

Casos ligeiros de hepatite em crianças não são inéditos, mas os alarmes começaram a soar depois de na Escócia, a 6 de Abril, terem sido identificados em crianças que estavam muito doentes. Várias precisaram mesmo de transplantes de fígado e uma criança morreu.

A outra preocupação era que os casos não estavam relacionados com os vírus normalmente ligados a esta patologia – hepatite A, B, C, D e E.

“Este é ainda um número muito baixo de casos, mas são crianças, essa é a principal preocupação, e a outra é a gravidade”, disse Maria Buti, uma professora de hepatologia de Barcelona e presidente do comité de saúde pública da Associação Europeia para o Estudo do Fígado, que tem acompanhado de perto o surto com o Centro Europeu de Controlo de Doenças (ECDC, sigla inglesa).

O que está a provocar os casos?

A teoria dominante é de que os casos estão relacionados com uma infecção viral, provavelmente um adenovírus geralmente associado a constipações, entre outras condições.

A estirpe de adenovírus F41 causa geralmente gastroenterite aguda, e tem havido relatos de situações em que causa hepatite em crianças imunocomprometidas, mas nunca anteriormente em crianças saudáveis.

O director do Instituto de Saúde Pública escocês, Jim McMenamin, disse que estava em curso um trabalho para confirmar se o adenovírus envolvido tinha sofrido uma mutação para causar uma doença mais grave, ou se poderia estar a causar os problemas “em conjunto” com outro vírus, incluindo possivelmente o SARS-CoV-2, que causa a doença covid-19.

Ao PÚBLICO, o director do Programa Nacional para as Hepatites Virais, Rui Tato Marinho, disse que esta é uma “hipótese”. No entanto, “ainda é muito cedo para certezas absolutas”.

Também é possível que esteja envolvido um novo agente patogénico ou que tenha existido a exposição a uma toxina, mas a propagação geográfica dos casos sugere que a infecção é uma explicação mais provável, segundo os cientistas.

Foi excluída qualquer ligação às vacinas contra a covid-19, uma vez que as crianças na Grã-Bretanha, onde foi encontrada a maior parte dos casos, não foram vacinadas.

Outros cientistas sugeriram que a imunidade mais baixa, resultante de menor contacto social durante a pandemia, pode ser uma explicação.

“Isto pode ser uma resposta excessiva a um estímulo por parte do sistema imunitário, que não está habituado a um ataque assim... É uma boa teoria”, disse Simon Taylor-Robinson, um hepatologista consultor e professor de medicina translacional no Imperial College de Londres.

Outros advertiram que as infecções por adenovírus poderiam ser coincidentes, uma vez que este tipo de patogénicos circula amplamente nesta época do ano.

O que aconselham as autoridades de saúde?

Os alertas de saúde pública nos Estados Unidos e na Europa pedem aos médicos que estejam atentos à doença, e que testem as crianças para adenovírus caso suspeitem de hepatite.

Os sintomas incluem urina escura, olhos e pele amarelados (icterícia), fadiga, febre, perda de apetite, náuseas, vómitos, dores abdominais, fezes de cor clara e dores nas articulações.

Não existe um tratamento específico para curar a hepatite, mas os medicamentos podem ajudar a reduzir a inflamação e outros sintomas.

Os pais estão a ser aconselhados a ter atenção aos sintomas e a contactar um profissional de saúde, caso estejam preocupados.

Para evitar uma maior propagação, a agência britânica de Segurança Sanitária apelou à lavagem das mãos e a uma “boa higiene respiratória completa”, tal como cobrir a boca ao tossir ou espirrar com lenços.

Os especialistas têm afirmado que o aumento de casos tem sido relativamente lento, mas avisou que é esperado que o número continue a subir.

“Se prestarmos atenção a algo, vemos mais disso”, disse Maria Buti, da Associação Europeia para o Estudo do Fígado.

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