Caso BES: Ricciardi falha depoimento, mas deixa promessas aos lesados

Ricciardi deveria ter sido ouvido esta terça-feira, enquanto testemunha de defesa de um dos arguidos, no âmbito da fase de instrução do processo Universo Espírito Santo, mas a sessão acabou por ser adiada.

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José Maria Ricciardi Nuno Ferreira Santos

A fase de instrução do processo Universo Espírito Santo arrancou a pouca velocidade. Num dia em que estavam agendadas sessões com quatro testemunhas chamadas por um dos arguidos deste processo, só duas foram concretizadas. As outras, incluindo a sessão com José Maria Ricciardi, acabaram por ser adiadas, mas o antigo presidente do banco de investimento do Grupo Espírito Santo (GES) ainda teve tempo para trocar algumas palavras com representantes dos lesados do papel comercial. E prometeu-lhes: “Testemunharei ao vosso lado quando alguma vez me solicitarem isso”.

As diligências de instrução do processo que pretende apurar responsabilidades criminais no colapso do universo Espírito Santo arrancam com mais de dois meses de atraso em relação ao calendário inicialmente previsto, devido ao problema de saúde súbito que afectou o juiz Ivo Rosa. Para esta terça-feira, estavam marcadas quatro audições de testemunhas arroladas por João Martins Pereira, antigo director do Banco Espírito Santo (BES), onde foi responsável pelo departamento de compliance e que é acusado de três crimes de burla qualificada.

Entre as quatro testemunhas estava José Maria Ricciardi, antigo presidente do Banco Espírito Santo de Investimento (BES), que chegou ao Campus de Justiça, em Lisboa, à hora marcada para o seu depoimento, pelas 17h00. Poucos minutos depois de ter entrado para ser ouvido, contudo, voltou a sair, informando que a sua sessão tinha sido adiada, não havendo ainda uma nova data marcada.

Mesmo assim, o ex-banqueiro teve tempo para se dirigir aos jornalistas e a um pequeno grupo de representantes de investidores do papel comercial da Espírito Santo International (ESI) e da Rioforte, que se encontravam no Campus de Justiça para questionar os advogados de antigos administradores do GES. As perguntas destes cinco lesados foram as mesmas para todos os antigos responsáveis do banco que conseguiram interpelar “Foi feita uma provisão, por Ricardo Salgado, de 1837 milhões de euros? E para onde é que ela transitou?”

Em causa está uma provisão que tinha sido criada pelo BES, precisamente no valor mencionado por estes lesados, para cobrir as obrigações para com os detentores de papel comercial que foi vendido aos balcões do BES até 2014. Até 30 de Junho de 2014, esta provisão estava contabilizada em 1837 milhões de euros no balanço do BES, mas passou para 455 milhões no balanço a 31 de Dezembro desse ano (nesta altura, quando o BES já tinha passado a Novo Banco), ou seja, parte da provisão foi anulada.

Há já vários anos, aliás, que a utilização desta provisão na sua totalidade como forma de ressarcir os lesados do papel comercial é proposta por várias entidades. Foi o caso, por exemplo, de Carlos Tavares, antigo presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que, em 2015, propôs à Assembleia da República a “reposição das provisões destinadas à compensação de clientes de retalho que foram anuladas nas contas de 31 de Dezembro de 2014”.

Ricciardi não comentou o facto de esta provisão ter sido anulada e falou apenas sobre o que testemunhou. “Esta é uma situação muito triste e devia ser a prioritária. Para além disso, fui testemunha viva de que se fez uma provisão absolutamente integral, para vos pagar na integralidade, aquilo que vos era devido e que resultou da vossa confiança num nome que, infelizmente, apesar de ter sido muito credível durante muitos anos, foi destruído”, respondeu directamente aos lesados.

E reforçou: “Sou testemunha de que foi constituída a provisão e testemunharei a vosso lado quando alguma vez me solicitarem isso”.

Questionado depois pelos jornalistas, Ricciardi disse não saber quais as questões que lhe seriam dirigidas durante a audição que acabou por ser adiada e garantiu apenas que, quando os factos relativos à gestão do BES começaram a ser conhecidos, reportou-os às autoridades. “Aquilo que se passou foi que havia um conjunto de factos importantíssimos que foram ocultados. Havia pessoas que sabiam e pessoas que não sabiam. E houve pessoas que reportaram às autoridades e outras que não reportaram. Quando tive conhecimento, reportei, como era a minha obrigação”, afirmou.

O antigo banqueiro voltou ainda a assegurar que pretende criar um banco para “limpar” o nome da sua família, tal como já tinha revelado em entrevista ao PÚBLICO, mas, desta vez, com a presença dos lesados do papel comercial, aproveitou para desvendar mais um dos objectivos que procura alcançar com a criação desta nova instituição. “É muito difícil, mas vou tentar fazê-lo com dois objectivos. Um é tentar limpar o nome que foi destruído, que tinha 150 anos e que fez estes senhores investirem. O segundo é, se tiver algum sucesso, e se eu ainda puder ajudar, ressarcir uma parte das perdas que estes senhores sofreram”, concluiu.

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