Pessoas com diabetes de tipo 2 são mais propensas à doença de Parkinson

As pessoas jovens que têm diabetes apresentam um risco aumentado em quase 400% de virem a desenvolver a doença de Parkinson.

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O investigador Hugo Vicente Miranda DR

Cientistas portugueses descobriram num estudo que pessoas com diabetes de tipo 2 são mais propensas a desenvolverem a doença de Parkinson devido ao aumento da glicação no cérebro, que agrava, antecipa ou até induz sintomas típicos desta doença degenerativa.

A investigação, publicada esta segunda-feira na revista npj Parkinson's Disease, do grupo da Nature, foi realizada por cientistas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, em colaboração com o Instituto de Medicina Molecular, o Instituto de Tecnologia Química e Biológica (​ITQB) e a Universidade de Goettingen (Alemanha), e pretendeu avaliar a relação entre a diabetes de tipo 2 e a Parkinson, uma doença muito debilitante, caracterizada por várias alterações motoras, como os tremores, e não motoras.

No estudo, iniciado há quatro anos, os investigadores procuraram explorar a relação entre uma consequência da diabetes de tipo 2, a glicação (reacção entre açucares e proteínas), e a doença de Parkinson, disse à agência Lusa o coordenador da investigação, Hugo Vicente Miranda.

O investigador da Universidade Nova de Lisboa explicou que, embora cerca de 10% dos casos sejam de origem genética, a causa da doença não é clara, sendo por isso “muito relevante estudar factores não genéticos que possam aumentar o risco de Parkinson”.

A diabetes de tipo 2 é um destes factores de risco, disse, exemplificando que pessoas jovens que desenvolvem esta doença têm um risco aumentado em quase 400% de desenvolver Parkinson. “Embora a genética explique muito poucos casos, uma das pistas que nos deu incide sobre a proteína alfa-sinucleína, que é expressa no cérebro, e que na doença se torna tóxica e leva à morte de neurónios que produzem a dopamina no cérebro”, o que justifica vários dos problemas motores característicos de Parkinson, uma vez que a dopamina é um neurotransmissor muito importante para o controlo motor.

Para o estudo, foi explorado um modelo de ratinho que expressa a alfa-sinucleína humana no cérebro, tendo-lhes sido administrado directamente no cérebro um açúcar com elevado poder glicante (metilglioxal).

O que verificaram foi que os ratinhos desenvolvem alterações comportamentais típicas de Parkinson como “um agravamento bastante notório” da sua capacidade motora.

“O mais interessante é que algumas destas manifestações não costumam ocorrer na idade em que avaliámos estes animais. Por exemplo, estes animais desenvolvem problemas olfactivos (um dos sintomas iniciais da doença de Parkinson que surge dez a 15 anos antes dos problemas motores), obstipação e até alguns problemas cognitivos”, salientou.

Os investigadores quiseram ir mais longe na investigação para compreender o que estava a acontecer, analisando várias áreas do cérebro dos ratinhos. Constataram que a alfa-sinucleína se encontrava mais patológica, e perceberam que ocorre o aumento de uma sinalização neuronal (glutamatérgica) que pode resultar na morte de neurónios.

“O estudo permite concluir que a glicação no cérebro induz alterações que podem estar na origem do desenvolvimento de Parkinson e podem assim explicar porque é que os diabéticos têm maior risco de desenvolver Parkinson”, destacou. Conhecemos quais são os mecanismos e proteínas alteradas pela glicação, o que nos coloca numa situação privilegiada para vir a desenvolver novas estratégias terapêuticas para a doença de Parkinson”, salientou Hugo Vicente Miranda.

Nesse sentido, os investigadores estão já a avaliar de que forma é que os medicamentos tipicamente usados para o controlo da diabetes de tipo 2 podem ser reposicionados para o tratamento da doença de Parkinson, principalmente por prevenir a glicação no cérebro.

Para a investigadora Ana Chegão, autora principal, o estudo é “um passo em frente” no campo da Parkinson. “Ter esta aceitação para publicação numa revista especializada é muito importante para nós. É um reforço de que estamos no caminho certo”, disse a cientista, esperando que a investigação possa “vir a abrir muitos caminhos para dar no futuro um pouco de esperança a todos os doentes que sofrem da doença de Parkinson”.

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