Espelho meu, espelho meu, haverá avatar mais belo do que o meu?

Hoje os avatares ganham um destaque diferente enquanto nossos representantes no mundo digital e redes sociais. Os avatares são agora uma digitalização do nosso estilo, forma de estar, ego e muito mais.

Em 2009 James Cameron presenteou-nos com a ficção científica de Avatar que continua hoje a ser o filme com mais vendas na história do cinema. O termo “avatar” solidificou-se no léxico geral, tipicamente associado aos personagens azuis que viviam em Pandora. Hoje os avatares ganham um destaque diferente e mais promissor enquanto nossos representantes no mundo digital e redes sociais. Os avatares são agora uma digitalização do nosso estilo, forma de estar, ego e muito mais.

Todos temos uma imagem que nos representa nas redes sociais, tipicamente uma fotografia da cara, mais ou menos visível, uma paisagem, algo abstrato ou uma simbologia. Esta imagem é o nosso avatar, a nossa representação no mundo digital, seja ele nas redes sociais, numa conta de subscrição de um jornal digital ou numa conferência. Ao nosso avatar está associado um nome, que pode ser o nosso real, uma alcunha ou algo simbólico. Assim foi durante várias décadas e ainda é.

Mas tudo está a mudar, hoje mais do que um nome e uma imagem temos uma personagem com vida própria que nos representa nos novos mundos digitais e que nos transporta para o metaverso. Tem óculos, roupa, acessórios, estilo, atitude. Esta conversão representa um impacto profundo na projeção digital da realidade, no significado do avatar e nas oportunidades de negócio que rodeiam esta evolução.

O negócio do retalho evoluiu há 25 anos para o comércio eletrónico e desde aí passou por várias fases, algumas delas apenas recentemente chegaram a Portugal, desde a venda direta por redes sociais (social commerce) até à desintermediação do retalhista para entrega direta do produtor ao consumidor (dropshipping) em modelos que usam por vezes especialistas de marketing intermédios (direct-to-consumer). Nos últimos dez anos surgiram várias marcas puras digitais (DNVB - Digitally Native Vertical Brands) e mesmo várias empresas de venda apenas de ativos digitais, p. ex., empresas de jogos de consola, música, aplicações para telemóvel ou livros em áudio.

Estamos agora numa nova fase de evolução da história do retalho e da relação entre fabricantes, vendedores e cliente final – desta vez, e pela primeira vez na história, é o cliente final que muda. Uma fase em que o cliente deixa de ser o “eu” real e passa a ser o “eu” avatar (D2A - Direct-to-Avatar). Existem já várias marcas que nasceram apenas com este propósito e outras, das maiores do mundo, que evoluíram para esta oferta. O avatar complementa assim o “eu” real e passa a ser uma entidade de consumismo e materialismo digital. As opções estão apenas limitadas à imaginação, desde óculos escuros com luzes, a camisas de flores em relevo, a luvas de boxe fluorescentes, a casacos de alta costura francesa, a relógios digitais e a chinelos de pompons até a umas simples calças de ganga com uma t-shirt. Todos estes produtos têm níveis de raridade diferentes e conhecidos, podem estar ou não associados a produtos existentes no mundo físico e são comprados através de NFT (Non Fungible Token) que lhes dão valor, liquidez, segurança e utilidade. Estima-se que em 2022 este mercado D2A valha já 50 mil milhões de dólares.

Na última semana de Março foi a estreia da Semana da Moda do Decentraland, a contraparte digital das famosas semanas da moda de Paris, Milão ou Nova Iorque, onde dezenas de marcas como Dolce & Gabbana, Franck Muller ou Jacob & Co apresentaram os seus produtos desenhados para avatares em passagens de modelos e em dezenas de lojas digitais que foram criadas apenas para o evento. Marcas como a Forever 21, a Philipp Plein ou a Estée Lauder inauguraram ainda as suas lojas permanentes no Decentraland. Tudo isto condimentado com dezenas de oradores e festas de fim de dia com nomes como Bob Sinclair.

Na primeira semana de Abril, Lisboa juntou na “Non Fungible Conference” os artistas, especialistas em tecnologia e investidores de todo o mundo que estão a criar esta vaga. E o que de melhor se faz no mundo supera mesmo a nossa imaginação, desde bonés físicos com mensagens magnéticas que se podem mudar e também vivem no digital (The Magnetic Patch Cap), a artistas de rua que atuam apenas em ruas digitais (The Crypto Graffers), a joalharia de luxo virtual (Nebetah), a esculturas para decorar casas virtuais (Hermine Bourdin) ou mesmo garrafas de vinho em pares virtuais e reais (The Safe Box).

Não estamos a falar de possibilidades, nem de tecnologias desconhecidas e mundos perdidos pensados em noites de alucinação. Estamos a falar de realidades vivas e presentes em 2022 e de um movimento massivo quer das maiores e mais estratégicas marcas quer dos milhões de pessoas que ocupam já estes espaços através dos seus avatares. Estamos a falar de algo que já aconteceu, de uma nova audiência que já existe.

Este mundo é estranho à primeira vista e curioso e intrigante mais à frente. Nasceu de tecnologia, de jogos de computador e de colecionáveis e está a entrar em todos os sectores de atividade representando oportunidades únicas. Também já vai muito para lá da moda e da competição entre quem tem o avatar com mais estilo. Tem atraído os melhores responsáveis de marketing de empresas globais que olham para o assunto como se de um novo Renascimento se tratasse e ajustam as suas estratégias de investimento. Bem-vindos à Era dos Avatares!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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