Mantas e comida na relva para celebrar a vizinhança e a cidadania, em Aveiro

Grupo nascido no Facebook para apoiar a comunidade, no início da pandemia, juntou-se finalmente no Parque da Cidade de Aveiro num piquenique. Na próxima vez querem atrair pessoas das cem nacionalidades que vivem no concelho

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Os Vizinhos de Aveiro nasceram durante a pandemia, e querem perdurar para lá dela Nelson Garrido

Mantas estendidas na relva, cestas atestadas com comida e umas dezenas de convivas à volta. O Parque da Cidade de Aveiro serviu de palco, este domingo, a um convívio que tinha tudo para ser um piquenique igual a tantos outros, não fosse o facto de grande parte dos seus participantes só se conhecerem virtualmente. Os Vizinhos de Aveiro, grupo criado em Março de 2020 para responder às necessidades da comunidade local em contexto de pandemia, trocaram as redes sociais e a Internet pelo contacto presencial, durante um par de horas. Um verdadeiro convívio de vizinhança, que deixou bem vincada a ideia de que a importância de uma comunidade não se esgota num contexto de pandemia.

Marieta Duarte foi das primeiras a chegar ao parque, acompanhada da amiga Maria Arminda Sousa. Na cesta trazia “vinho Alentejano, uns aperitivos, uma salada e água”, desvendou, já depois de se ter apresentado aos dinamizadores do grupo nascido no Facebook logo no início do primeiro confinamento motivado pela Covid-19. “O grupo foi muito importante. Gerou aquele espírito de vizinhança que já não tínhamos, uma vez que só olhávamos para o nosso umbigo”, avaliou a oficial de justiça, já reformada, a propósito da comunidade à qual se associou desde a primeira hora.

Oito mil adesões num dia

“Num só dia tivemos oito mil pessoas a aderir ao grupo”, recordou José Carlos Mota, um dos dinamizadores dos Vizinhos de Aveiro, comunidade que fez toda a diferença na vida de pessoas como Nélia Neves. Estava há poucos meses na cidade, ainda a integrar-se em Aveiro, quando, de repente, todas as portas se fecharam. “Este grupo foi muito importante para a integração”, testemunhava, já depois de ter espalhado a fruta, os rissóis, a água e as batatas fritas em cima da manta. Veio com a amiga Raquel Morais, também ela pertencente aos Vizinhos de Aveiro desde o primeiro momento.

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Nelson Garrido

Se durante as épocas mais críticas, nomeadamente, durante os dois confinamentos, o grupo serviu para a partilha de informações sobre apoios aos cidadãos ou necessidades da comunidade – além do Facebook e do website, também foi criada uma linha telefónica para apoiar os cidadãos que não tivessem literacia digital –, noutros momentos os Vizinhos de Aveiro protagonizaram iniciativas inéditas. Disso é exemplo o Cidadania Lab, que foi, em Portugal, o primeiro laboratório cidadão municipal criado a partir da iniciativa da comunidade. O Cidadania Lab conseguiu, inclusive, obter o reconhecimento do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, numa mensagem em formato vídeo que chegou nas vésperas do Dia de Portugal. Destaque, também, para a dinamização de um ciclo de entrevistas aos candidatos à Câmara de Aveiro nas Autárquicas de 2021, emitidas através do Facebook e com direito a perguntas por parte dos cidadãos.

Neste momento, o grupo já conta com cerca de 30.000 participantes e parece ter vindo para ficar. “É curioso como hoje em dia o grupo vai ajudando a resolver pedidos de ajuda tão simples, mas ao mesmo tempo tão úteis, como ‘alguém conhece um sapateiro’? ou ‘conhecem alguém que faça obras’?”, repara a “vizinha” Raquel Morais. Interpelações típicas de uma vizinhança, uma ou outra vez com direito a “zangas”, reconhece José Carlos Mota, a propósito de alguns casos em que as pessoas se mostram mais intolerantes – à semelhança do que acontece na vizinhança física. Não foi o caso do convívio deste domingo, onde não faltou boa disposição e alegria.

Foi o primeiro de vários piqueniques dos Vizinhos de Aveiro, estimando-se que as próximas edições possam ser ainda mais interculturais. “Temos 65 países representados no grupo Vizinhos de Aveiro e seria muito interessante se conseguíssemos ter essa interculturalidade bem presente nos nossos encontros presenciais”, destacou Alexandra Ataíde, outra das dinamizadoras do grupo. O desafio já tinha sido lançado para este primeiro encontro, mas ainda não foi desta que os “vizinhos” conseguiram juntar o “meio mundo” que vive em Aveiro – na cidade residem pessoas de cem nacionalidades. “Não vamos desistir”, anunciou Alexandra Ataíde, prometendo futuras iniciativas e encontros.

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