Quem não quer ter direitos fundamentais?

Estudos efectuados nos Estados Unidos e no Reino Unido revelam que menos de uma em cada cinco mulheres se declara feminista. As mulheres continuam a justificar um sistema que as maltrata, práticas sociais que as injustiçam e continuam a rejeitar tentativas feministas de mudança social.

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Por que razão continuam mulheres a suportar e racionalizar sistemas que as maltratam, negando as desigualdades de género que as rodeiam?

Apesar de as mulheres enfrentarem diariamente desvantagens sociais e políticas, estudos efectuados nos Estados Unidos e no Reino Unido revelam que menos de uma em cada cinco mulheres se declara feminista. As mulheres continuam a justificar um sistema que as maltrata, práticas sociais que as injustiçam e continuam a rejeitar tentativas feministas de mudança social.

Este efeito intitula-se justificação de sistema e ocorre quando membros de grupos desprivilegiados adoptam crenças e atitudes que justificam as desigualdades sociais e perpetuam o status quo, contra os seus interesses pessoais e colectivos. Este é um fenómeno que interroga investigadores e activistas. Os membros de grupos privilegiados tendem igualmente a perpetuar o status quo, porém, no seu caso, esse comportamento não é contraditório, uma vez que vai a favor dos seus interesses.

Já no caso de grupos oprimidos, como as mulheres, é um comportamento que impede o progresso colectivo e que desfavorece as mulheres enquanto grupo. A grande maioria dos estudos em psicologia social que se debruçaram sobre as relações intergrupais defendem que os grupos sociais procuram atingir uma imagem positiva e favorecer o seu grupo. Porém, quando mulheres culpam outras mulheres, que foram vítimas de violência, estão activamente a prejudicar o seu próprio grupo e a favorecer o seu agressor.

Os estudos prévios sobre o fenómeno de justificação de sistema são escassos, apesar de ser uma tendência tão antiga quanto as próprias dinâmicas de dominação e subjugação. Na história da humanidade contam-se mais períodos de conformismo do que de revolução, contudo, estudou-se muito mais a revolução do que o conformismo.

Uma investigação recente indica que quanto maior for a desigualdade de género numa sociedade, maior é a tendência das mulheres para negar a existência desta desigualdade. Assim, a justificação de sistema é, acima de tudo, um mecanismo de coping.

Esta negação por parte das mulheres promulga a ilusão de um sistema justo e coloca um obstáculo não só no seu percurso, mas no percurso de todas as mulheres na luta por direitos igualitários. As medidas mais frequentemente adoptadas para combater esta questão têm sido a educação e a sensibilização para a igualdade de género. Contudo, perante uma atitude peremptória que é, acima de tudo, emocional, as acções de sensibilização são pouco eficazes.

Temos tendência a preferir aquilo que nos é familiar, mesmo que seja contraproducente. A mudança social é difícil de alcançar, é desconhecida, incerta e aterradora. Os melhores momentos para as revoluções sucedem quando o sistema se mostra frágil e propenso à ruptura. São também estes os momentos em que membros de grupos oprimidos ganham coragem e voz.

Frequentemente, as mulheres que negam a necessidade de medidas de igualdade de género não têm falta de informação, apenas não estão prontas para reconhecer os abusos e a exploração a que têm estado submetidas, não estão prontas para aceitar que têm sido cúmplices de um sistema tirano e não estão prontas para aceitar que a sociedade não as respeita tanto como a um homem.

Finalmente, não estão prontas para aceitar a necessidade de mudança, nem para sentir dor, injustiça ou medo, pois uma mulher consciente de que vive num mundo feito por homens e para homens, é uma mulher que vive com medo, mas que decide lutar.

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