Os “vistos gold” e o branqueamento de capitais

O processo de controlo da aquisição de imobiliário é muito superior ao de uma aplicação financeira.

Com enorme e inusitada frequência, representantes de alguns partidos políticos de esquerda, asseveram que os “vistos gold” (VG), através da modalidade de compra de imóvel é o meio ideal para branquear capitais. Será?

Quase sempre, pedindo a revogação do projeto, referem situações passadas, mas na verdade nunca as identificam. A razão parecerá óbvia - não há nenhum caso julgado que tenha confirmado a prática criminosa.

Ora, comparemos então o compliance de uma aplicação de capitais versus a compra de um imóvel para se compreender qual das operações é objeto de maior escrutínio.

Um qualquer investidor, nacional ou internacional, se efetuar uma transferência para um banco nacional é sujeito ao compliance do banco para onde enviou a transferência e, em determinados casos ou para montantes acima de um determinado limiar e proveniência, poderão também ser supervisionados pelo Banco de Portugal. Cumpridos os formalismos, o dinheiro fica à disposição do cliente.

Numa transação imobiliária, o compliance é manifestamente maior. Vejamos qual é o processo concreto, recorrendo a um exemplo simples e corrente:

O Cliente A, pretende adquirir um imóvel com financiamento parcial da transação, recorrendo a mediador para procura do ativo.

Começa por contactar um ou vários mediadores imobiliários identificando a sua necessidade, pedindo em retorno que lhe enviem propostas. Uma vez qualificada a oferta, o Cliente A deverá preencher o KYC (“Know Your Client”) fornecendo um conjunto diverso de informação. Só após conclusão deste processo, a agência deverá aceitar o cliente (nota: se o processo violar as disposições legais, o mediador poderá ser objeto de sanções múltiplas e graves). De acordo com a lei, o mesmo processo deverá ser realizado pelo vendedor, ou seja, pelo dono do ativo e mais tarde, aquando da escritura de compra e venda e do registo, será ainda escrutinado pelo notário e pelo conservador do Registo Predial. E, dado ser obrigatório realizar o pagamento por cheque ou transferência efetuada através de prestadores de serviços de pagamento oficial, tanto o pagamento em capital próprio como o demais, resultante do crédito, cumpriram antes o compliance junto do(s) banco(s).

Ou seja, há um compliance bastante maior, no caso de uma venda imobiliária versus uma aplicação financeira.

Por fim, dois aspetos complementares a referir. Se o VG fosse um meio privilegiado para branquear capitais, o valor médio por imóvel comprado seria notoriamente muito superior ao mínimo. Ora, o valor nunca superou em termos médios os 620.000 euros em 2017 e desde então tem descido.

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Figura 1

Figura 1

A segunda constatação é que o valor médio do VG (conforme resulta da Figura 1) tem descido desde 2018 atingindo cerca de 541.500 euros, logo, ao contrário do que se passou em Lisboa em particular e Portugal em geral, em que os preços cresceram substancialmente nos últimos anos.

Deste modo, a conclusão é insofismável: o VG não é um meio apropriado para branquear capitais e, ao contrário do que se afirma, não é certamente o causador da subida dos preços do imobiliário em Portugal.

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