Unidades russas sofrem grandes perdas e abandonam a Ucrânia, revelam os serviços de informação militar britânicos

Ministério da Defesa britânico alerta para que é provável que a Rússia continue a compensar a sua reduzida capacidade de manobra terrestre com “artilharia maciça e ataques com mísseis”. Pentágono diz que movimentos russos consistem mais num reposicionamento do que num recuo ou retirada da guerra. “Devemos estar preparados para assistir a uma grande ofensiva contra outras áreas da Ucrânia”, afirma.

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Tropas russas em Mariupol, Ucrânia ALEXANDER ERMOCHENKO/Reuters

Algumas unidades russas que sofreram grandes perdas na Ucrânia foram forçadas a regressar à Rússia e à vizinha Bielorrússia, revelam os serviços de informação militar britânicos, um dia depois de a Rússia ter prometido reduzir as operações militares em Kiev e noutra cidade.

O Presidente ucraniano, Volodimir Zelenskii, reagiu com cepticismo à oferta feita pela Rússia durante as negociações em Istambul com o objectivo de atenuar um conflito que vai já na quinta semana.

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Tanque russo destruído por militares ucranianos na região de Sumy EPA/ROMAN PILIPEY

As suas forças travaram a invasão na maioria das frentes e alguns analistas observaram que a promessa da Rússia de reduzir os combates abrangia principalmente áreas onde já vinha a perder terreno, mesmo com os civis a permanecerem presos em cidades sitiadas no Sul e no Leste do país.

Grandes perdas e a retirada de algumas tropas estavam a afectar as operações russas, disse o Ministério da Defesa britânico.

“Tal actividade está a pressionar ainda mais a já tensa logística da Rússia e demonstra as dificuldades que a Rússia está a ter para reorganizar as unidades em áreas avançadas dentro da Ucrânia”, disse o ministério numa nota divulgada nesta quarta-feira.

É provável que a Rússia continue a compensar a sua reduzida capacidade de manobra terrestre com “artilharia maciça e ataques com mísseis”, acrescentou.

“Os ucranianos não são pessoas ingénuas”

A Rússia não conseguiu capturar nenhuma grande cidade durante a sua invasão, que dura há mais de um mês, enquanto as forças ucranianas fizeram avanços, recapturando território às tropas russas nos arredores de Kiev, no Nordeste e no Sul.

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Destruição provocada pelos soldados russos EPA

Uma área recapturada numa estrada em direcção à vila de Rusaniv estava repleta de tanques queimados e pedaços de uniformes russos. As casas ali à volta foram destruídas.

A Rússia chama à sua invasão uma “operação especial” para desarmar e “desnazificar” a Ucrânia. Já o Ocidente diz que a Rússia lançou uma invasão injustificada. O maior ataque a uma nação europeia desde a Segunda Guerra Mundial matou ou feriu milhares de pessoas, forçou quase quatro milhões a fugirem para o exterior e atingiu a economia da Rússia com sanções.

O vice-ministro da Defesa russo, Alexander Fomin, disse que a oferta de reduzir algumas operações militares foi um passo de construção de confiança para as negociações em vigor com autoridades ucranianas em Istambul.

“A fim de aumentar a confiança mútua e criar as condições necessárias para novas negociações e alcançar o objectivo final de concordar e assinar (um) acordo, foi tomada a decisão de reduzir radicalmente, por uma grande margem, a actividade militar nas direcções de Kiev e Chernihiv, disse o vice-ministro da Defesa russo, Alexander Fomin, aos jornalistas.

Fomin não mencionou outras áreas que foram palco de grandes combates, incluindo Mariupol, no Sudeste, Sumi e Kharkiv, no Leste, e Kherson e Mikolaiv, no Sul.

“Os ucranianos não são pessoas ingénuas”, disse o Presidente Zelenskii na noite de terça-feira. “Os ucranianos já aprenderam, durante estes 34 dias de invasão e nos últimos oito anos de guerra no Donbass, que a única coisa em que podem confiar é num resultado concreto”, acrescentou.

“Grande ofensiva” noutras áreas da Ucrânia é possível

A Rússia começou a afastar um número muito pequeno de tropas das posições ao redor de Kiev, num movimento que consiste mais num reposicionamento do que num recuo ou retirada da guerra, disse o Pentágono nesta terça-feira.

“Todos nós devemos estar preparados para assistir a uma grande ofensiva contra outras áreas da Ucrânia”, disse o porta-voz John Kirby, em conferência de imprensa. “Isso não significa que a ameaça a Kiev acabou.”

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O famoso Z usado pelas forças russas na Ucrânia EPA/SERGEI ILNITSKY

O Ministério da Defesa britânico disse anteriormente: “É altamente provável que a Rússia procure desviar o poder de combate do Norte para a sua ofensiva nas regiões de Donetsk e Lugansk, no Leste.”

A Reuters não conseguiu verificar imediatamente as alegações feitas por ambos os lados.

A autoproclamada República Popular de Donetsk, apoiada por Moscovo, no Leste da Ucrânia, pode considerar juntar-se à Rússia assim que controlar toda a região de Donetsk, segundo o seu líder citado pela Reuters. Kiev disse que tal acção não teria base legal.

No porto ucraniano sitiado de Mariupol, milhares de civis podem ter morrido, disse a chefe da missão de direitos humanos da ONU à Reuters na terça-feira.

Aqueles que lá permanecem estão em sofrimento. “Somos oito pessoas. Temos dois baldes de batatas, um balde de cebolas”, disse Irina, uma engenheira, no seu apartamento, onde as janelas foram todas partidas.

Na cidade de Mikolaiv, no Sul, um míssil abriu um buraco no principal prédio administrativo. As autoridades disseram que pelo menos 12 pessoas morreram e 33 ficaram feridas.

O Exército russo acusou as forças ucranianas em cidades sob fogo de usarem os cessar-fogos para restabelecerem a sua prontidão de combate e estabeleceram postos de tiro em hospitais e escolas, segundo a agência de notícias Interfax.

Os líderes da Alemanha, Estados Unidos, França, Reino Unido e Itália concordaram num telefonema, na tarde de terça-feira, em continuar a pressionar a Rússia para um cessar-fogo e para a retirada das suas tropas da Ucrânia, disse um porta-voz do Governo alemão.

O Presidente russo, Vladimir Putin, e o seu homólogo francês, Emmanuel Macron, discutiram os desenvolvimentos da situação na Ucrânia, incluindo a última ronda de negociações Rússia-Ucrânia em Istambul, num telefonema na terça-feira, disse o Kremlin.

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, e o vice-conselheiro de segurança nacional dos EUA para a Economia, Daleep Singh, visitarão a Índia para tentar fazer alguma pressão em Nova Deli, que apelou a um cessar-fogo mas que se recusou a condenar explicitamente Moscovo.

“Ainda temos um longo caminho a percorrer”

Os negociadores ucranianos disseram que, de acordo com as suas propostas, Kiev concordaria em não se juntar a alianças ou hospedar bases de tropas estrangeiras, mas teria a sua segurança garantida em termos semelhantes ao “artigo 5.º”, a cláusula de defesa colectiva da aliança militar transatlântica da NATO.

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Material de guerra russo destruído pelas forças ucranianas

As propostas, que exigiriam um referendo na Ucrânia, mencionavam um período de consulta de 15 anos sobre a situação da Crimeia, anexada pela Rússia em 2014.

O destino da região do Donbass, que a Rússia exige que a Ucrânia ceda aos separatistas, seria discutido pelos líderes ucranianos e russos.

As propostas de Kiev também incluíam uma de que Moscovo não se oporia à entrada da Ucrânia na União Europeia (UE), disse o principal negociador da Rússia, Vladimir Medinski. A Rússia opôs-se anteriormente à adesão da Ucrânia à UE e especialmente à NATO.

Medinski disse que a delegação da Rússia irá estudar e apresentar as propostas ao Presidente Putin.

Em relação a um eventual acordo de paz, Medinski disse, mais tarde, à agência de notícias Tass: “Ainda temos um longo caminho a percorrer.”

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