Descoberto antepassado dos polvos com 328 milhões de anos. E foi baptizado em honra de Biden

O Syllipsimopodi bideni tinha um corpo em forma de torpedo e dez braços.

Reconstituição artística do <i>Syllipsimopodi bideni</i>
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Reconstituição artística do Syllipsimopodi bideni Christopher Whalen
Reconstituição artística do <i>Syllipsimopodi bideni</i>
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Reconstituição artística do Syllipsimopodi bideni Christopher Whalen

Assim que vemos as suas formas agora reconstituídas (como se pode ver na imagem principal deste artigo), não temos grandes dúvidas: parece-se mesmo com um cefalópode. Tem aquele corpo alongado com vários braços e ventosas. Mas este organismo agora revelado na revista científica Nature Communications tem à volta de 328 milhões de anos e é ainda primo – até agora, o primeiro de todos – dos polvos e da lula-vampira-do-inferno. Chama-se Syllipsimopodi bideni e foi assim baptizado em honra do Presidente dos Estados Unidos Joe Biden.

O protagonista desta história é um fóssil bem preservado encontrado nas colecções do Museu Real de Ontário, no Canadá. Este exemplar foi originalmente descoberto no actual Montana, nos Estados Unidos, e doado a esse museu em 1988.

Christopher Whalen e Neil Landman, ambos do Museu Americano de História Natural (em Nova Iorque), olharam para esse fóssil ao pormenor e perceberam que fazia parte do ramo dos Vampyropoda, que engloba polvos e a lula-vampira-do-inferno. Dentro deste ramo, estão cefalópodes de corpos moles que tipicamente têm oito braços. Como têm falta de estruturas mais rijas, esses organismos não têm estado muito bem representados no registo fóssil.

O Syllipsimopodi bideni vem quebrar essa ausência. Este fóssil pertence a uma espécie e um género completamente novos para a ciência. Mas, embora traga essa novidade, é já bem velhinho: tem entre 330 e 323 milhões de anos, o que o torna o mais antigo membro do ramo Vampyropoda e faz recuar o registo fóssil desse grupo mais de 80 milhões de anos. Pensa-se que seja mesmo o antepassado mais antigo dos polvos e da lula-vampira-do-inferno. Até agora, pensava-se que esse estatuto pertencesse a um fóssil chamado “Germanoteuthis” com cerca de 242 milhões de anos e descoberto na Alemanha.

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Fóssil do cefalópode descoberto no Montana Christopher Whalen

Apesar da idade, ficou bem preservado e agora dá-nos boas pistas da vida há cerca de 328 milhões de anos. Com um corpo em forma de torpedo, media 12 centímetros de comprimento. Possuía também um longo gládio, uma estrutura interna triangular que é um vestígio semitransparente de uma concha interna.

Quando tinham dez braços

Uma das suas características mais curiosas são os seus dez braços com ventosas ainda bem conservadas. “O número de braços é uma das características definidoras que separam a linhagem das lulas de dez braços e dos chocos da linhagem dos polvos e lulas-vampiras-do-inferno de oito braços. Já tínhamos percebido há algum tempo que os polvos começaram a ter oito braços [a uma certa altura, mas que antes deveriam ter mais]”, nota Christopher Whalen, num comunicado sobre o trabalho. O investigador diz ter percebido isso através dos dois filamentos que a lula-vampira-do-inferno possui e que são braços vestigiais (ou seja, desapareceram com a evolução das espécies). “Contudo, anteriormente, os fósseis do ramo Vampyropoda descobertos até agora preservavam apenas os oito braços. Este fóssil é, provavelmente, a primeira confirmação da ideia de que todos os cefalópodes ancestrais possuíam dez braços.”

Vale a pena ainda destacar outro pormenor sobre este cefalópode. Dois dos seus dez braços eram mais longos do que os restantes. Os investigadores especulam que o cefalópode deveria usar esses dois braços maiores para capturar presas – talvez mais pequenas e até com concha – e que os braços mais curtos serviriam para as prender.

“O Syllipsimopodi é especialmente importante porque é muito mais velho do que qualquer outro membro do ramo Vampyropoda e porque as suas características únicas têm um grande impacto na filogenia dos cefalópodes (o mapa das inter-relações evolutivas)”, resume ao PÚBLICO Christopher Whalen. “Tem sido extremamente difícil reconstituir as inter-relações dos cefalópodes apenas com base na genética. Fósseis como este são cruciais para resolver esse problema.”

Portanto, agora este fóssil vem sugerir que a linha evolutiva dos polvos é muito mais antiga do que se pensava e que os parentes mais antigos desses cefalópodes tinham dez braços – e não oito – e se assemelham às lulas modernas.

O nome científico que lhe foi atribuído (Syllipsimopodi bideni) é um misto entre uma descrição deste cefalópode com milhões de anos e uma homenagem a uma personalidade dos nossos dias. O nome do género – Syllipsimopodi – deriva do grego “syllípsimos”, que significa preênsil, e “pódi” que é pé. Já o nome escolhido para a espécie – bideni – é uma homenagem a Joe Biden. Aliás, o artigo científico sobre este cefalópode foi aceite logo após a tomada de posse de Joe Biden. “Queríamos de alguma forma marcar esse momento positivo e virado para o futuro”, conta Christopher Whalen. “Fiquei motivado com os planos do Presidente Biden para combater as alterações climáticas e pela sua posição geral de que os políticos deveriam ouvir os cientistas.”

Christopher Whalen está também motivado para continuar a estudar cada vez com mais pormenor o Syllipsimopodi bideni e compará-lo com outros fósseis de antigos cefalópodes.

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