110 Histórias, 110 Objectos: a maquete da Ponte da Arrábida

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.

No podcast 110 Histórias, 110 Objectos, um dos parceiros da Rede PÚBLICO, percorremos os 110 anos de história do Instituto Superior Técnico (IST) através dos seus objectos do passado, do presente e do futuro. Neste 35.º episódio do podcast, conhecemos a história da maquete da Ponte da Arrábida.

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A 22 de Junho de 1963 era lançado sobre o rio Douro um recorde mundial em forma de ponte, naquela que viria a ser a segunda ligação rodoviária entre o Porto e Vila Nova de Gaia. Nascia a Ponte da Arrábida, obra de arquitectura e engenharia assinada por Edgar Cardoso (1913-2000) e que inclui elementos escultóricos assinados por Salvador Barata Feyo e por Gustavo Bastos, que se assumia como a ponte com o maior arco em betão armado de todo o mundo.

Pelo IST, onde Edgar Cardoso foi também uma das grandes referências no ensino de Pontes e Estruturas, passou e ficou – pelo menos a partir dos anos 70 – a maquete da ponte, que representa uma versão intermédia da obra. “Eu não sei exactamente a origem, mas lembro-me ainda como aluno, portanto estamos a falar dos anos 70, de a ver nos corredores do pavilhão central do Técnico. Imagino que deve ter sido uma maquete oferecida pelo professor Edgar Cardoso, que era aqui professor da disciplina de Pontes e Estruturas Especiais”. Quem percorre a memória é Fernando Branco, professor catedrático do IST, no departamento de Engenharia Civil, Arquitectura e Georrecursos.

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A maquete remonta ao período de início das obras de construção da ponte, a partir de 1957. “As maquetes habitualmente são feitas para as pessoas verem a ponte que vai ser realizada. Esta maquete deve ter sido feita depois de estar já concebida”, explica. Depois de ter estado longos anos nos corredores do pavilhão central do campus da Alameda, encontrou finalmente espaço no Museu de Civil, inserido do pavilhão de Engenharia Civil, inaugurado em 1993.

“Estamos a falar de uma época – anos 70 - em que o Técnico já denotava alguns problemas de conservação. Todo o ensino da Engenharia Civil era feito no Pavilhão Central, em salas em que as janelas não abriam nem fechavam, em que as carteiras estavam com poucas condições. Do que me lembro, a maquete estava bastante deteriorada na altura. A maquete é metálica e eu tenho ideia de a ver verde, nem estava sequer pintada, estava relativamente deteriorada”, complementa Fernando Branco. A maquete foi, entretanto, retocada e pintada, provavelmente quando foi mudada para o edifício de Engenharia Civil.

Informação mais específica tem Carlos Ferraz, actual representante da empresa Edgar Cardoso, Laboratório e Estruturas, e que muito colaborou com o professor: “A ponte foi estudada no princípio dos anos 50 - porque a avaliação depois da solução que foi mesmo a concurso é de 1954. Portanto, esta é uma hipótese de ponte, porque existira uma solução também em metal e estrutura metálica. Duas em betão, uma pré-esforçada e era apenas um pórtico, a de betão era praticamente igual a esta, assim como também de alvenaria, de pedra, de granito. A opção que veio a ser executada é muito parecida com esta ou quase igual, mas de betão armado. A razão para isso foi a escolha sobre os materiais, preferindo-se os materiais nacionais”.

Edgar Cardoso, com um trabalho “exigente” e “rigoroso”, de acordo com Carlos Ferraz, raramente fazia uma obra igual à anterior. “Estava sempre a estudar e a fazer coisas novas”. E acompanhava de perto todas as suas obras. Por exemplo, no caso das obras da Ponte da Arrábida, “todas as semanas se ia ver os trabalhos da ponte e reunia com cerca de 20 pessoas”.

As obras preferidas de Fernando Branco são a Ponte São João, também no Porto, e duas pontes construídas no então Ultramar, em Moçambique, no Save e no Tete, onde utilizou pela primeira vez, de forma pioneira, o sistema das pontes suspensas mas de múltiplos vãos. “Se pensarmos que aquilo foi construído em África sem tecnologias nenhumas e com meios muito complicados. Para mim aquelas pontes são, digamos, as mais notáveis que foram feitas”, defende.

Edgar Cardoso foi também pioneiro no recurso a modelos de ponte, com secções desenhadas à escala, para lhe colocar sensores e medir extensões, deslocamentos, testando a sua resistência. “Começou a usar modelos com instrumentação mecânica, para estudar os esforços equivalentes na ponte ou no próprio modelo final, no protótipo. Na altura não havia, ele próprio desenhou esses instrumentos para poder medir os deslocamentos, as flechas, as extensões, tudo isso”, recorda Carlos Ferraz. “Isto foi a grande inovação que ele trouxe. Até ter começado a usar os modelos, basicamente os projectos eram feitos com modelos planos, ou seja, não havia a terceira dimensão nas pontes”, complementa Fernando Branco.

As obras de Edgar Cardoso destacavam-se ainda pelo forte pendor estético. “As obras dele são sempre anormalmente belas. O produto das coisas que ele fazia é de facto muito bonito. São obras de engenharia, mas que tem a beleza de uma escultura”, descreve Fernando Branco. Mas será que Edgar Cardoso se via como um artista. Carlos Ferraz nega-o. “Via-se como uma pessoa que trabalhava muito”.

O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.

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