Leiria quer medidas de segurança para sítio onde foi descoberta a criança do Lapedo

Anabela Graça, vice-presidente da Câmara de Leiria e vereadora da Cultura, vai reunir-se com o director-geral do Património Cultural para encontar uma solução que assegure a segurança do local. “Casa roubada, trancas à porta”, comenta a oposição social-democrata.

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O Abrigo do Lagar Velho visto do portão que dá acesso à propriedade privada onde se encontra rui gaudêncio

A Câmara de Leiria, presidida pelo socialista Gonçalo Lopes, defendeu esta segunda-feira a adopção de medidas para a segurança do sítio arqueológico onde foi descoberta a criança do Lapedo, após saber-se que o local sofrera actos de vandalismo.

A vice-presidente da autarquia, Anabela Graça, afirmou na reunião do executivo municipal que iriam ser tomadas medidas visando a segurança “em torno de um dos mais emblemáticos sítios que integram o património arqueológico de Leiria, e que é reconhecido internacionalmente”. O PSD caracteriza a intenção como um exemplo de “casa roubada trancas à porta”.

No sábado passado, o município anunciou que o sítio arqueológico Abrigo do Lagar Velho, em Santa Eufémia, classificado em 2013 como Monumento Nacional –​ local onde foi descoberto o esqueleto do chamado “Menino do Lapedo”, classificado em 2021 como Tesouro Nacional, juntamente com os artefactos arqueológicos a ele associados –, tinha sofrido actos de vandalismo. Foi feita uma queixa junto da GNR e a situação foi relatada à Direcção-Geral do Património Cultural e à Direcção Regional de Cultura do Centro.

“O acesso ao sítio arqueológico está vedado ao público por um obstáculo natural” que condiciona a passagem (uma ribeira) e por “dois portões, um fechado à chave e outro com uma fechadura e uma corrente de cadeado”, descreveu Anabela Graça, que tem também o pelouro da Cultura, acrescentando que desde 1998, quando se iniciaram as escavações, o sítio nunca registara “qualquer acto desta natureza”.

A vereadora da Cultura diz aguardar agora uma reunião com o director-geral do Património Cultural “no sentido de perspectivar, em termos de futuro, o que é que se pode e deve fazer”, considerando fundamental a parceria com “as entidades competentes” para a resolução do problema de segurança do local.

“Toda esta área é propriedade privada e, portanto, há que ter em conta vários condicionalismos, mas esta situação acabou por fazer com que se reflectisse sobre a segurança daquele sítio”, reconheceu, referindo que as autoridades competentes terão de, com a autarquia, “encontrar uma solução, porque têm essa responsabilidade”.

A autarca realçou ainda que “os danos causados pelo vandalismo” não danificaram a criança do Lapedo, mas antes um troço de parede que conservava fragmentos de osso, instrumentos em pedra e outros vestígios arqueológicos com cerca de 25 mil anos.

Apesar dos obstáculos naturais e artificiais inventariados por Anabela Graça, o vereador social-democrata Álvaro Madureira assinalou que “só não entrava na zona de escavações e na zona sensível quem não queria”. E embora se tenha servido do dito popular “casa roubada trancas à porta” para sugerir que as medidas de segurança eram já tardias, defendeu, ainda assim, que a situação agora ocorrida servisse de aviso para se começarem a tomar medidas.

“Não podemos deixar aquilo sem protecção. Temos de fazer uma intervenção quanto antes para protegermos o local”, insistiu, lembrando que os vereadores do PSD têm preconizado um plano a médio e longo prazo, “com reforço de meios humanos e financeiros” no estudo, na protecção e na promoção deste património.

Álvaro Madureira sustentou ainda a necessidade de “um centro de interpretação adequado” e condigno, e não “contentores como os que estão lá há 20 anos”.

A mensagem de humanidade revelada pelo achado arqueológico da criança do Lapedo, um esqueleto com cerca de 29 mil anos descoberto em 1998, inspira a candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura em 2027.

A descoberta marcou a paleoantropologia internacional, quer por se tratar da única sepultura de uma criança datada do Paleolítico Superior até hoje escavada na Península Ibérica, quer porque a criança em causa, embora pertença à nossa espécie, Homo sapiens, apresenta algumas características do Homem de Neandertal, sugerindo que tivera antepassados de ambas as espécies, hipótese que a ciência só veio a confirmar em 2010.

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