Igreja Católica da Nova Zelândia revela abusos “horrendos” de menores

Relatório da Igreja Católica neozelandesa dá conta de milhares de alegações de abusos de crianças e adultos vulneráveis desde os anos 1950 em diferentes instituições. Organização de sobreviventes diz que a dimensão real é muito superior.

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A primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Adern, criou em 2018 uma comissão governamental para investigar abusos nas instituições da Nova Zelândia Reuters/EDGAR SU

A Igreja Católica da Nova Zelândia revelou publicamente esta terça-feira, pela primeira vez, a escala dos abusos “horrendos”, incluindo abusos sexuais, perpetrados desde os anos 1950 pelo clero e outros religiosos. Desde essa altura, 1350 crianças e 164 adultos relataram ter sofrido abusos; e das 1680 alegações incluídas no relatório, quase metade (835) são danos sexuais contra uma criança perpetrados principalmente em instalações educativas ou lares residenciais.

Destes alegados abusos, 75% ocorreram antes da década de 1990. A Igreja neozelandesa admite que 14% do seu clero diocesano foi acusado de abusos por parte de crianças e adultos nos últimos 70 anos.

Os dados fazem parte de um relatório preparado pela Igreja Católica da Nova Zelândia para a comissão governamental criada em 2018 pela primeira-ministra, Jacinda Ardern, para investigar abusos dentro das instituições da Nova Zelândia.

O Cardeal John Dew, presidente da Conferência dos Bispos Católicos da Nova Zelândia, disse numa declaração que estes dados eram “horríveis”. “Algo de que nos envergonhamos profundamente”, frisou.

O relatório foi divulgado poucos dias antes da comissão governamental realizar audições públicas em casos emblemáticos de abuso no seio da Igreja Católica. Num documento preliminar divulgado há dois anos, a comissão avançava que cerca de 250 mil crianças e adultos vulneráveis tinham sido maltratados desde 1950.

Estas audiências centrar-se-ão na Marylands School, um internato para rapazes e deficientes na cidade de Christchurch, e no Hebron Trust para crianças em risco, um centro dirigido por membros da Ordem dos Irmãos de Deus de São João, bem como no orfanato vizinho de São José, dirigido pelas Irmãs de Nazaré.

As alegações ligadas à Marylands School e ao Hebron Trust representam 14% do total das denúncias de abusos no relatório da Igreja Católica, enquanto outros 14% dizem respeito ao Orfanato de São José e ao Lar Nazaré.

Além disso, três dos mais prolíficos alegados abusadores da Igreja Católica trabalharam em Maryland, e um deles fundou o Hebron Trust.

Te Rōpū Tautoko, a organização que elaborou o relatório, admite que os números não representam todos os maus-tratos, que incluem abusos físicos, emocionais, psicológicos e sexuais, bem como negligência, mas apenas os casos que foram denunciados e mantidos em arquivo.

Com base nas informações dos seus membros, a Rede de Sobreviventes dos Abusados por Sacerdotes diz que a escala real dos abusos é provavelmente muito maior – os dados indicam que “apenas um cada 12 relatou abusos”. “A Igreja limitou-se a divulgar as informações que registou e isso não deve ser visto como uma lista abrangente de todos os abusos. A real dimensão dos abusos sexuais é muito difícil de medir”, afirma esta associação.

Apesar de a Igreja admitir o mal que foi feito, não houve mudanças significativas na cultura interna nem nos métodos de treino, sublinha ainda a organização, notando que “no tratamento das denúncias, os processos de investigação [da Igreja] se baseiam no equilíbrio de probabilidades em vez de se centrarem nas vítimas”.

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