A Educação como elevador social: a importância da escolha

O cheque ensino seria a melhor arma contra a discriminação. O financiamento das pessoas em vez das instituições conduziria a uma melhoria generalizada no desempenho das escolas, reduzindo as assimetrias de qualidade existentes.

Em Portugal, existe um regime de escolaridade obrigatória que é universal e gratuito. A escolaridade obrigatória é organizada em três ciclos de ensino que são servidos por instituições de ensino público, privado e cooperativo. Acontece que em Portugal existe uma grande heterogeneidade no desempenho das escolas. Em particular, as escolas da rede pública têm desempenhos muito assimétricos e estão usualmente arredadas dos melhores lugares nos rankings de desempenho.

As famílias de poucos recursos só têm acesso a escolas “gratuitas” que são obrigatoriamente (1) estabelecimentos da rede pública, (2) na área geográfica da morada de residência do aluno (geralmente, com desempenhos inferiores) e (3) desde que existam vagas.

Se a escola desejada não for uma escola da rede pública, então os custos com as propinas ficam a cargo do encarregado de educação ou aluno.

O mesmo se passa no Ensino Superior, onde um aluno que pelas mais diversas razões, nomeadamente baixa nota de acesso, não aceda a uma Instituição de Ensino Superior pública, terá que custear os seus gastos com propinas no ensino concordatário ou privado.

Pessoas que não tenham acesso ou não escolham a rede pública de ensino pagam duas vezes a sua educação. Pagam os seus impostos (e convém lembrar que Portugal tem uma carga fiscal acima da média do conjunto dos países da OCDE) e pagam as propinas. A situação é iníqua também para os contribuintes em geral, pois os custos médios por aluno das escolas públicas são superiores aos custos dos melhores colégios privados em Portugal.

E o que acontece a quem não pode pagar duplamente para ter escolhas? Um estudante com poucos recursos terá necessariamente que “escolher” uma escola da rede pública, independentemente da sua qualidade, onde a probabilidade de obter um bom desempenho é menor, e consequentemente terminará o Ensino Secundário com uma média mais baixa. Essa média mais baixa dificultará o seu acesso aos cursos com mais saídas profissionais, que são também aqueles cujas médias de entrada são menos acessíveis.

Quando terminar o seu curso, a sua empregabilidade será mais baixa e, consequentemente, as suas oportunidades de trabalho implicarão salários mais reduzidos. Agora, imaginem o que acontecerá aos seus filhos.

Para a Educação concretizar o seu papel de elevador social, é necessário garantir que as famílias de menores e maiores recursos possam escolher em pé de igualdade a escola da sua preferência.

Manuel Carvalho, no PÚBLICO, defende que a escolha no ensino é uma ilusão perigosa, devido à diversidade de contextos (geográfico, de acesso à informação, etc.) em que as pessoas tomam decisões.

Se é certo que a falta de igualdade de condições para fazer escolhas introduz imperfeições nestes processos, não é menos válido que em Portugal, em 2021, já existe a possibilidade de escolha no que respeita ao ensino. Pelo menos para alguns. Para os que podem pagar impostos e ainda assim pagar as propinas das instituições de ensino privado.

Neste artigo defende-se que a solução para o facto de não estarmos todos igualmente capacitados para fazer escolhas é chamar o Estado a decidir por nós. Ora se assim é, porquê parar nas instituições de ensino se essa desigualdade persiste noutras questões? Porquê deixar as pessoas escolherem os seus cursos e profissões futuras? Com base neste argumento, todas as decisões das pessoas deveriam ser deixadas para o Estado. A perigosidade deste argumento é autoexplicativa.

Neste artigo é referido o receio de que os bons alunos tomem de assalto as boas escolas privadas, gerando uma situação de discriminação face aqueles que não são bons alunos. Em contrapartida, parece existir concordância tácita com esse mesmo assalto, desde que feito pelos alunos que as podem pagar e independentemente do seu mérito. Em que é que a discriminação dos alunos menos bons é pior do que a discriminação dos que têm menos recursos, como hoje acontece? Neste aspeto o cheque ensino seria a melhor arma contra a discriminação. O financiamento das pessoas em vez das instituições conduziria a uma melhoria generalizada no desempenho das escolas, reduzindo as assimetrias de qualidade existentes.

A escolha no ensino não é uma ilusão perigosa. A escolha no ensino em Portugal é já uma realidade. Pelo menos para quem a puder pagar.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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