Esquecimentos: os mais novos desvalorizam, os mais velhos entram em pânico

O que há tempos uma neurocientista me disse e que me tem ajudado é que muitas vezes não se trata de esquecer, porque na realidade não chegámos a registar a informação.

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"O cérebro não consegue fazer bem várias coisas ao mesmo tempo" @designer.sandraf

Mãe, mãe...

Ai, esqueci-me do que ia dizer! Tinha uma birra mesmo boa mas evaporou-se-me!

Ontem, tive uma sequência de esquecimentos absolutamente incrível. Pus um jantar a descongelar no microondas, duas horas depois lembrei-me que o tinha lá deixado! Mas antes de lá chegar, esqueci-me. Juro. À hora de jantar fiquei em pânico porque não havia jantar então — repare nisto! — fui ao minimercado comprar coisas para o fazer!! E felizmente quando já estava no carro, de volta, lembrei-me de que o jantar estava no microondas....

É verdade que estava com uma violenta enxaqueca mas, enfim, já me resignei. Esqueço-me e pronto.

E por aí?


Ana, que alegria!

Quer dizer não rejubilo nem com a tua enxaqueca, nem com os teus esquecimentos, mas quando faço coisas parecidas atribuo imediatamente à velhice e tenho a certeza absoluta de que são sinais de demência.

Confesso-te, sem te querer deprimir, que se tudo isso me tivesse acontecido a mim a esta hora estava a pedir a eutanásia. É que a grande diferença está aí: enquanto os mais novos desvalorizam os esquecimentos e passam adiante, os mais velhos associam-nos imediatamente à senilidade, e só isso provoca uma ansiedade que só pode agravar o desempenho dos neurónios.

O que há tempos uma neurocientista me disse e que me tem ajudado é que muitas vezes não se trata de esquecer, porque na realidade não chegámos a registar a informação. Por exemplo, estávamos com a cabeça noutro lado quando nos disseram o nome da médica, e por isso não o apreendemos — daí que quando precisamos dele e o tentamos recordar, a tarefa é impossível porque não ficou lá nada. Idem aspas para todas aquelas rotinas que desempenhamos sem pensar.

Ana, isto é importante porque revela que não é propriamente um problema de memória, mas sim de concentração. É uma boa notícia que pode levar não apenas a desdramatizar a “branca” que nos deu, como a perceber que temos de prestar mais atenção ao que queremos realmente reter.

O que liga com a outra coisa que me disse: o multitasking é um barrete. O cérebro não consegue fazer bem várias coisas ao mesmo tempo — até se pode safar, mas é sempre porque baixa a qualidade dos desempenhos. As mulheres são, de facto, peritas em apagar muitos fogos, que remédio, mas o que as distingue é a capacidade de organizar o tempo e as prioridades — será daí que resulta a eficiência e não da simultaneidade das tarefas.

Bem, mas vamos ver as coisas pelo lado positivo, pelo menos ficaste com o jantar para hoje e deste uma grande felicidade à tua mãezinha.


No Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. Mas, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. Facebook e Instagram.

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