Votos de “ano novo, vida nova” no ensino superior e ciência

Precisamos de um Ministério da Ciência Tecnologia e Ensino Superior que apoie e reconheça o investimento e empenho de quem ensina e faz ciência, criando-lhes condições de emprego e trabalho dignas.

O início de um novo ano é habitualmente acompanhado de esperança e expectativa, ainda que se saiba muito bem que uma vida nova não começa magicamente quando soam as doze badaladas. Estando as eleições legislativas agendadas para o final do mês de janeiro, reafirma-se a esperança e a expectativa de que, em 2022, se dê mesmo início a uma nova vida das políticas de ciência e ensino superior. É preciso que todos continuemos a defender a importância e a qualidade dos contributos da investigação científica e da formação superior para o desenvolvimento social e económico do país, mas é insustentável que a ação governamental permita e prolongue a deterioração das condições de trabalho e emprego de professores e investigadores. Por isso, efetivar, reconhecer e fortalecer são os nossos três votos de “ano novo, vida nova”.

Efetivar é urgente porque a precariedade contratual afeta a maioria dos investigadores e quase metade dos professores, existindo indícios de que se terá agravado desde o início da crise pandémica. Para conseguirmos caracterizar com mais exatidão estas situações, necessitamos dos dados estatísticos atualizados que os organismos governamentais deixaram de disponibilizar desde há cerca de três anos. E precisamos de políticas governamentais que incentivem e financiem práticas institucionais de estabilização contratual, em vez de se limitarem a mensurar incessantemente resultados das atividades de ensino e investigação sem criar condições adequadas para que os mesmos sejam atingidos.

Reconhecer é imprescindível num momento em que a qualidade do desempenho na ciência e no ensino superior depende sobretudo de cada profissional. Foram docentes e investigadores, sem quaisquer apoios governamentais, que adquiriram equipamentos tecnológicos e mobilizaram recursos fundamentais para o seu trabalho durante os confinamentos. Precisamos de um Ministério da Ciência Tecnologia e Ensino Superior que apoie e reconheça o investimento e o empenho de quem ensina e faz ciência, criando condições de emprego e trabalho dignas da qualidade das atividades que se desenvolvem em Portugal.

Efetivar e reconhecer são requisitos necessários, mas não suficientes, para fortalecer as equipas e as organizações. Precisamos de um governo que cumpra a lei que o obriga a rever o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, como deveria ter acontecido há já dez anos. Importa avaliar os aspetos positivos e negativos desta lei, porque é crucial instituir modos de organização e funcionamento ajustados aos desafios que enfrentamos na atualidade.

É que, como assinalam vários estudos, a pandemia vem exacerbando o individualismo e prejudicando a existência de coletivos fortes que são essenciais para alcançar bons resultados nas atividades de investigação e formação académica relevantes para o desenvolvimento social e económico do país. Acresce que os inquéritos a professores e investigadores realizados recentemente indicam que as equipas e organizações que melhor responderam aos desafios da pandemia foram aquelas em que foi possível um trabalho coletivo estável e uma resposta institucional coordenada.

Quase sempre as resoluções de ano novo vão sendo esquecidas à medida que os dias passam, esvanecendo-se a esperança e a expectativa que marcam cada passagem de ano. Desejamos que, em 2022, efetivar, reconhecer e fortalecer sejam votos a concretizar através de políticas de ensino superior e ciência com futuro, da responsabilidade do Governo que venha a resultar das eleições legislativas de janeiro.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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