Governo alemão divide-se quanto ao Nord Stream 2

SPD e Verdes têm posições diferentes sobre se uma acção militar russa na Ucrânia poderia ter consequências sobre o gasoduto. Ministra da Defesa defende sanções a Putin, que não deve poder continuar “a ir às compras aos Campos Elísios”.

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Sede da Nord Stream 2 em Zug, na Suíça: até ter sede na Alemanha a certificação está suspensa ARND WIEGMANN/Reuters

Uma das questões que mais divide os parceiros do Governo alemão é a Rússia, e o cenário de uma acção militar na Ucrânia levou já a respostas diferentes do chanceler, Olaf Scholz, do SPD, e do vice-chanceler, Robert Habeck, dos Verdes, sobre o que pode acontecer ao gasoduto Nord Stream 2, que leva gás directamente da Rússia à Alemanha, caso a Rússia ataque a Ucrânia.

Na semana passada, o chanceler Olaf Scholz, do Partido Social Democrata (SPD), disse que não via um cenário em que fosse possível uma nova decisão política sobre o gasoduto, que levará mais gás directamente da Rússia à Alemanha, sem passar pela Polónia ou Ucrânia, e está pronto a operar – uma decisão com base numa questão burocrática fez com que o gasoduto não possa começar já a operar este Inverno.

Um porta-voz do Governo repetiu esta segunda-feira que o gasoduto “não tem dimensão política”, mas depois especificou que estava a falar do processo de certificação pelo regulador alemão de energia, que exige sede na Alemanha (a sede do Nord Stream 2 é na Suíça). Esta mudança deverá levar alguns meses, ou seja, o gasoduto não estará operacional ainda este Inverno.

Os EUA têm pressionado a Alemanha para dizer claramente que o gasoduto não operará caso a Rússia se decida por um ataque à Ucrânia, com o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, a dizer à margem do G7 que não via como no caso de uma invasão poderia passar gás no Nord Stream 2. Os EUA, tal como a Polónia ou os países Bálticos, vêem o gasoduto como um meio de a Rússia poder exercer pressão usando o gás.

Dos Verdes, têm surgido várias vozes a defender que não pode haver uma exclusão da operação do Nord Stream 2 caso a Rússia leve a cabo uma acção ofensiva.

Numa entrevista ao Frankfurter Allgemeine Sonntagszeitung, o vice-chanceler e ministro da Economia dos Verdes, Robert Habeck, disse que uma acção militar na Ucrânia “não pode ficar sem consequências pesadas”, e em relação ao Nord Stream 2, não se pode excluir qualquer hipótese.

A número dois da bancada parlamentar dos Verdes e responsável pela política de Defesa, Agnieszka Brugger, também disse ao diário Tagesspiegel que é um erro afastar desde já potenciais consequências para o funcionamento do Nord Stream 2 no caso de um ataque russo à Ucrânia. Brugger também diz que no acordo de coligação entre os sociais-democratas, Verdes e liberais há espaço para uma decisão, já que está estipulado que o gasoduto funcionará se respeitar todos os requisitos alemães e europeus, o que até agora não aconteceu.

Do lado do SPD, que é tradicionalmente mais próximo da Rússia (o ex-chanceler Gerhard Schröder ocupa vários cargos em empresas de energia russas e está no conselho de direcção do Nord Stream 2), a ministra da Defesa, Christine Lambrecht, defendeu numa entrevista ao jornal Bild am Sonntag que se deve endurecer as sanções à Rússia face à deslocação de tropas para a fronteira com a Ucrânia: O próprio Presidente, Vladimir Putin, e o seu círculo próximo devem “sentir pessoalmente as consequências”, afirmou, “por exemplo, não devem continuar a poder ir às compras aos Campos Elísios em Paris”.

Lambrecht escusou-se a fazer comentários sobre o gasoduto, repetindo as afirmações que saíram do último Conselho Europeu, na semana passada, de que a Rússia enfrentará enormes consequências caso decida dar o passo de invadir a Ucrânia.

A ministra da Defesa deu esta entrevista antes da sua primeira viagem ao estrangeiro, à Lituânia, onde se encontrou com o seu homólogo e visitou soldados alemães da missão da NATO, garantindo que apesar da vontade de diálogo, é claro que “não pode ser a Rússia a ditar a política da NATO”.

A Rússia fez várias exigências à NATO, como o fim do seu alargamento a Leste e ou a promessa de que a Ucrânia não integrará a Aliança Atlântica, exigências que um responsável da Administração Biden classificou como “inaceitáveis” ao diário norte-americano The Washington Post, acrescentando que Moscovo “sabe disso”.

A Rússia deslocou perto de cem mil soldados para perto da fronteira com a Ucrânia, numa acção que levou os EUA a acusar Moscovo de estar a preparar-se para invadir o país, e ninguém arrisca dizer qual a intenção de Putin, se ameaçar com uma invasão para pressionar a NATO, se levá-la mesmo a cabo.

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