Áreas marinhas protegidas ou parques de papel?

Até ao momento, relativamente poucos dos fundos comunitários disponíveis foram utilizados para medidas de conservação.

A perda de biodiversidade marinha e a destruição dos ecossistemas conexos representam um desafio permanente para os mares europeus. As áreas marinhas protegidas (AMP) são instrumentos globalmente reconhecidos para a conservação e o reforço da biodiversidade marinha, bem como para a promoção da pesca sustentável.

Porém, em Portugal, apenas 7% do mar territorial tem AMP definidas e, na realidade, quase todas elas são áreas protegidas unicamente no papel. Na Europa, a situação não é melhor: em praticamente 90% das AMP classificadas continua a praticar-se, por exemplo, a pesca de arrasto. Em novembro deste ano, coloquei uma pergunta à Comissão Europeia sobre este problema, questionando se a mesma irá propor uma proibição da pesca com redes de arrasto pelo fundo, em todas as AMP da União, no próximo plano de ação sobre os oceanos, tendo em conta também os compromissos assumidos na Estratégia de Biodiversidade.

Um estudo publicado recentemente na revista “Science”, por dezenas de cientistas (entre os quais dois portugueses), intitulado “Guia de Áreas Marinhas Protegidas: um enquadramento para alcançar metas globais para o Oceano” tem por objetivo de alertar para a efetiva aplicação destes instrumentos que permitem conservar a biodiversidade e os ecossistemas marinhos.

O guia apresentado neste estudo sintetiza assim toda a informação necessária para planear, avaliar e monitorizar atuais e futuras AMP, a fim de alcançar os objetivos de conservação, recorrendo a práticas com fundamento científico.

Áreas efetivamente e plenamente protegidas também beneficiam naturalmente os pescadores, uma vez que permitem a regeneração dos ecossistemas e o regresso das unidades populacionais de peixes para níveis saudáveis. Similarmente, os pescadores devem fazer parte da solução e podem apoiar nas medidas de proteção das AMP. Os nossos pescadores de pequena escala (cerca de 90% em Portugal) pouco seriam afetados por áreas onde não se efetuem capturas e beneficiariam pelo contrário de um oceano mais saudável a longo prazo.

Um relatório muito crítico, publicado no ano passado pelo Tribunal de Contas Europeu, concluiu que as regras de proteção estabelecidas pela União Europeia não resultaram numa recuperação significativa dos ecossistemas e habitats, nem na pesca sustentável. Na prática, as AMP proporcionaram uma proteção limitada porque as disposições de coordenação da política das pescas com a política de proteção marinha são pouco usadas pelos Estados Membros. Até ao momento, relativamente poucos dos fundos comunitários disponíveis foram utilizados para medidas de conservação. Os auditores europeus recomendam, portanto, que os Estados-membros recorram a esses fundos para implementarem e gerirem efetivamente as suas áreas marinhas protegidas.

No âmbito do exercício de programação do novo FEAMPA (2021-2027), os Estados-membros são encorajados a aumentar as suas despesas em medidas de conservação do meio marinho. No entanto, o uso acrescido deste fundo em medidas de proteção e restauração dos oceanos não é obrigatório, apesar dos meus esforços, enquanto relator-sombra pelo grupo dos Verdes/ALE, de fazer com que 20% do fundo se destine exclusivamente a tais medidas. Espero que o Governo português entenda finalmente o que está em causa e defina medidas concretas no seu programa operacional para este tipo de projetos e para a monitorização das AMP nacionais, e seja assim um exemplo na UE.

Finalmente, quero destacar uma notícia positiva: o governo regional da Madeira anunciou no mês passado a criação da maior área marinha protegida da Europa através da aprovação de um novo regime jurídico para a reserva natural das Ilhas Selvagens. É de saudar que a Madeira esteja a reforçar a sua posição em termos de conservação e valorização do oceano. Espero que esta área não se revele ser mais um parque de papel, mas que se torne antes num exemplo a seguir para o continente.

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