“Caso EDP”: um novelo de casos que se cruzam

Há quase dez anos na mira da justiça, a investigação a alegados casos de corrupção na EDP permanece sem fim à vista.

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Manuel Pinho foi ouvido na comissão parlamentar de inquérito às rendas da energia em 2018 Daniel Rocha

Nascida de uma denúncia que chegou ao Ministério Público em 2012, a investigação a alegados crimes de corrupção de antigos líderes da EDP, António Mexia e João Manso Neto, depressa se estendeu a Manuel Pinho, o governante a quem coube tutelar o sector da energia no primeiro governo de José Sócrates e que, nessa condição, interveio em dossiês que nos anos seguintes mantiveram a empresa como uma das mais poderosas e rentáveis do país.

Um dos casos mais famosos foi a definição dos termos dos contratos CMEC (custos para a manutenção do equilíbrio contratual) dos vários centros electroprodutores da EDP, que durante anos representaram para a eléctrica uma importante fonte de proveitos garantidos (suportados pelos consumidores de electricidade). Nos primeiros dez anos, o cumprimento destes contratos traduziu-se em 2500 milhões de euros de receitas para a EDP.

Também está na berlinda o processo de extensão das concessões de mais de duas dezenas de barragens da EDP, em 2008, sem concurso público, que o Ministério Público considera ter sido feito em prejuízo do interesse público, num valor acima de mil milhões de euros.

Pela sua intervenção nestes dois processos, o ex-ministro terá alegadamente obtido como moeda de troca um patrocínio de 1,2 milhões de euros da EDP à prestigiada Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, para que lá pudesse dar aulas sobre energias renováveis em 2010.

Mas não só. Da investigação à EDP – que apenas se tornou pública em 2017 – também nasceram ramificações que a ligam às investigações que envolvem o antigo líder do BES (ex-accionista de referência da EDP), Ricardo Salgado, e aos pagamentos por si ordenados através da ES Enterprises, o chamado “saco azul” do Grupo Espírito Santo (GES), entre 2006 e 2012.

Foi daqui que Manuel Pinho recebeu, por intermédio de uma sociedade offshore (a Tartaruga Foundation, com sede no Panamá), cerca de um milhão de euros (dos quais 500 mil euros enquanto era ministro da Economia, cargo que desempenhou até Julho de 2009). Entretanto, a investigação descobriu mais pagamentos suspeitos feitos a Manuel Pinho e à mulher, Alexandra, que passou a estar na lista de arguidos no processo.

Segundo os procuradores do caso EDP, Carlos Casimiro Nunes e Hugo Neto, os ex-presidente e ex-administrador executivo da EDP, António Mexia e João Manso Neto, não terão corrompido apenas o ex-ministro Pinho, mas também um seu ex-assessor, João Conceição, que foi consultor do Boston Consulting Group (BCG) e desde 2009 é administrador executivo da REN.

O antigo director-geral da Energia e Geologia, Miguel Barreto, é outro dos visados no inquérito, tendo alegadamente favorecido a eléctrica enquanto esteve no cargo (de 2004 a 2008). O foco dos investigadores está na atribuição de uma licença de exploração sem prazo à central a carvão de Sines (desactivada no início deste ano) e na venda de uma empresa de eficiência energética à eléctrica, dois anos depois, por 1,4 milhões de euros.

Mais recentemente, as atenções viraram-se para as relações estabelecidas entre os ex-gestores da EDP e o antigo secretário de Estado da Energia do governo de Passos Coelho, Artur Trindade, cujo pai (já falecido) foi consultor da EDP para as relações com as autarquias.

Outra frente da investigação diz respeito à construção da barragem do Baixo Sabor, já que os ex-gestores da EDP, que deixaram definitivamente a empresa no final de 2020, também são suspeitos de terem lesado a companhia com o pagamento de bónus às construtoras envolvidas no projecto, Lena e Odebrecht, também elas acusadas de crimes de corrupção.

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