Na freguesia de Punhe, uma velha azenha renasceu das cinzas como forno comunitário

Uma azenha do séc. XIX sem recuperação possível está agora ao serviço da população como forno de todos. “Um espaço ligado à cultura das suas gentes, passando às novas gerações os saberes antigos”. E, no caso, também os sabores.

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JUNTA DE FREGUESIA DE VILA DE PUNHE

Uma azenha do século XIX, sem utilização há anos, foi transformada em forno para uso comunitário, na freguesia de Vila de Punhe, em Viana do Castelo, para manter vivos saberes antigos e transmiti-los às novas gerações.

Salete Lima não é do tempo em que se cozia a broa no forno de lenha, mas vai para mais de 30 anos que aprendeu aquele “saber antigo” que gostaria de ver passado aos mais novos.

“O forno vai ser muito útil, sobretudo para as crianças. Para as escolas levarem as crianças ao forno e mostrarem-lhes como se fazia a broa antigamente. Hoje os miúdos não sabem”, disse à agência Lusa, Salete Lima.

Aos 65 anos, Salete sabe bem da “importância” de “passar” aos mais novos os usos e costumes de outros tempos, não fosse também presidente da associação Cantadeiras do Vale do Neiva.

Um grupo que canta à capela músicas das antigas Terras do Neiva, outrora entoadas pelas populações das margens do rio com o mesmo nome.

Do forno a lenha que Salete Lima tem em casa, em Vila de Punhe, saem as suas “especialidades”, broas de milho e bolos de chouriço e toucinho, que o grupo vende nos feirões que vai realizando para angariar fundos. “O sabor é totalmente diferente. Não tem nada a ver com o que é feito em fornos eléctricos ou a gás”, frisou.

No início do mês, quando foi inaugurado o forno comunitário, junto ao Parque do Bonfim, emprestou a sua experiência e ajudou a cozer as suas “especialidades” aos convivas que se juntaram para ver a nova obra freguesia.

O segredo para uma boa broa, explica, “é o tempo de levedura e um bom forno, que arda lentamente”. É preciso evitar os “suspiros” do forno [deixar sair calor] para que a broa não saia “tomada, parecida com a boroa de Avintes”.

Antigamente, os buracos entre a porta e a pedra do forno, que permitem os tais “suspiros” eram vedados “com bosta de animal”, mas Salete Lima isola as fugas “com cinzas ou massa do farelo”.

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Junta de Freguesia de Vila de Punhe

“Para a broa ficar boa é preciso ter o forno a arder mais de hora e meia, cozendo lentamente”, conta, satisfeita com a “ideia” que a junta de freguesia teve em transformar “um espaço morto”, num local com história para contar.

“As antigas azenhas não tinham recuperação possível. Agora o forno comunitário vai ganhar vida, transmitindo saberes e proporcionando o convívio porque tem um bom parque de merendas”, referiu.

O presidente da junta, António Costa, explicou que o objectivo da transformação da antiga azenha em forno comunitário foi o de criar “um espaço ligado à cultura das suas gentes, passando às novas gerações os saberes antigos”.

“Tal como já acontece com o moinho do Inácio, que também recuperamos, o forno comunitário também irá receber a visita das escolas. Ainda recentemente, numa dessas visitas ao moinho do Inácio, os miúdos queriam levar a farinha que viram a ser moída para mostrarem aos pais que o pão vem da farinha”, contou.

O autarca socialista disse que a construção do forno foi o “destino” escolhido pelo executivo face à impossibilidade de recuperação da antiga azenha, doada à autarquia.

“A azenha foi descaracterizada nos anos 80, o que tornou inviável a sua recuperação. O edifício todo em pedra tinha sido todo revestido com cimento. Com a intervenção que fizemos, o cimento foi todo retirado, a pedra original ficou à vista e a parte que tinha tijolo foi revestida com madeira”, especificou.

António Costa adiantou que, este mês, vai ser aprovado em assembleia de freguesia um regulamento para definir as condições de utilização do forno, pela comunidade.

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Forno Comunitário na Azenha do Bonfim Junta de Freguesia de Vila de Punhe

“A utilização terá se ser feita mediante inscrição prévia. A junta de freguesia vai disponibilizar a lenha, luz e água e a limpeza do espaço. Iremos estabelecer uma taxa simbólica para garantir “responsabilidade” a quem usar o equipamento”, explicou.

A intervenção, de 20 mil euros, além do forno comunitário, “todo equipado com loiças e talhares”, incluiu a construção, no exterior de um parque de merendas, com grelhador e mesas de pedra, e instalações sanitárias.

“A freguesia ganha mais um espaço para convívios familiares, entre amigos”, apontou, acrescentando que a junta está a preparar um livro para contar a história da azenha e distribuir a quem visitar o forno comunitário.

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