Putin na Índia para assinar contratos de armamento e fortalecer laços

A venda dos sistemas de defesa antimísseis S-400 está a avançar, apesar da oposição dos EUA e do risco de sanções para Nova Deli. Viagem saldou-se na assinatura de 28 pactos de investimento.

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Putin viajou até à Índia para garantir que relação não esmorece HARISH TYAGI/EPA

Vladimir Putin esteve esta segunda-feira em Nova Deli e isso só por si é notícia: trata-se apenas da segunda viagem ao estrangeiro do dirigente russo desde o início da pandemia de covid-19 e depois da cimeira de Junho com Joe Biden, em Genebra. Putin faltou às cimeiras do G20 e à cimeira do clima da Escócia, mas viajou até Nova Deli para reatar as suas cimeiras anuais com o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, e reforçar laços militares e energéticos com um aliado tradicional de Washington.

“O seu amor pela Índia é evidente; apesar da covid e de outros desafios, as relações entre a Índia e a Rússia têm-se fortalecido” e “são verdadeiramente um modelo único e confiável”, afirmou Modi ao dar início ao encontro em Nova Deli. Para a Rússia, a Índia é “uma grande potência”, disse, por seu turno, Putin, no arranque da cimeira.

Trata-se de um encontro “extremamente simbólico”, disse à AFP Nandan Unnikrishnan, do think tank Observer Research Foundation, de Nova Deli. “Indica até que ponto eles [russos] não querem que as relações estagnem ou desacelerem por falhas russas.”

Esta viagem, especialmente pela sua raridade, não pode ser lida sem ter em conta as tensões crescentes entre a Rússia e os Estados Unidos. A Índia é um aliado fundamental dos EUA, mas é também um importante parceiro da Rússia e, apesar do esforço para diversificar as suas compras, Moscovo continua a ser de longe o seu principal fornecedor de armamento. Ainda assim, com os norte-americanos e os europeus a entrarem na corrida, Moscovo passou de vender mais de 70% do armamento comprado pela Índia para menos de 50%. “Vemos a Índia como uma grande potência e os nosso laços militares não têm paralelo”, sublinhou Putin.

A cimeira começou na véspera, ainda sem Putin, com a chegada à capital indiana dos ministros russos dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, e da Defesa, Serguei Shoigu. De acordo com Lavrov, o acordo para fornecer à Índia o sistema de defesa antimísseis S-400 “foi implementado”, apesar do que descreveu como esforços norte-americanos para o travar – o Governo indiano confirmou que as entregas já começaram este mês.

“Testemunhámos tentativas por parte dos EUA para minar esta cooperação e para fazer a Índia obedecer às ordens americanas, para seguir a visão americana sobre como é que esta região deve ser desenvolvida”, afirmou Lavrov, depois do encontro inaugural de um fórum que passará a juntar regulamente os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa dos dois países. “Os nossos amigos indianos explicaram com firmeza e clareza que são um país soberano e que decidem que armas comprar e quem vai ser o seu parceiro nesta e outras áreas”, acrescentou.

Segundo escreve a agência russa Interfax, Moscovo espera ainda vender mais sistemas S-400 à Índia, para além dos cinco previstos neste contrato.

Cooperação até 2031

A venda dos S-400, um negócio no valor de mais de 5 mil milhões de dólares, assinado em 2018, deixa a Índia sob risco de sanções ao abrigo de uma lei que pune as transacções com os sectores de defesa e serviços secretos russos. Segundo o Departamento de Estado norte-americano, até à semana passada não tinha sido tomada nenhuma decisão sobre a possibilidade de a Índia beneficiar de uma excepção. “É extraordinário que a Índia tenha decidido prosseguir com o negócio apesar da desaprovação dos EUA”, nota a analista Tatiana Belousova, da Universidade OP Jindal Global no estado indiano de Haryana, ouvida pela Al-Jazeera,

A visita serviu ainda para fechar outro importante contrato que envolve o lançamento da produção de mais de 600 mil espingardas automáticas Kalashnikov AK-203 através de uma transferência de tecnologia.

Os dois países assinaram em paralelo um acordo de cooperação técnico-militar que vai vigorar até 2031 e comprometeram-se a aumentar as suas trocas comerciais anuais para 30 mil milhões de dólares até 2025. Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Nova Deli, os dois países assinaram 28 pactos de investimento, incluindo acordos nas áreas do aço, construção naval, carvão e energia, e manifestaram interesse em aprofundar os investimentos de petróleo e gás.

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