Ministro libanês forçado a demitir-se para abrir caminho à resolução da crise com Riad

Sauditas e aliados do Golfo cortaram relações com Beirute. Presidente Macron pedira a demissão de Kordahi para discutir o alivar das tensões no seu encontro com o príncipe herdeiro saudita, este sábado.

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Kordahi esteve menos de três meses à frente do Ministério da Informação MOHAMED AZAKIR/Reuters

Na já longa sucessão de acontecimentos com potencial trágico de que o Líbano não parece conseguir livrar-se, a polémica com o ministro da Informação do novo Governo, acusado pelos sauditas de ter proferido em tempos comentários “insultuosos” para o reino, quase parecia de importância menor. Mas a reacção da Arábia Saudita e dos seus aliados do Golfo ganhou tais proporções que George Kordahi se viu mesmo obrigado a demitir-se.

Antes de ser ministro, Kordahi, ex-apresentador de televisão, disse numa entrevista que os rebeldes houthis, que Riad combate no Iémen, apenas se estavam “a defender […] contra uma agressão externa”. Excertos da entrevista começaram a circular online em Outubro, um mês depois de Kordahi ser nomeado para o Governo do primeiro-ministro, Najib Mikati, formado um ano depois da demissão do anterior, na sequência da gigantesca explosão no porto de Beirute que matou 218 pessoas e deixou 300 mil deslocadas. A resposta chegou com todo o peso regional da monarquia sunita.

O Kuwait deu ao embaixador libanês no emirado 48 horas para deixar o país, um dia depois de a Arábia Saudita ter feito o mesmo, o Bahrain expulsou o enviado de Beirute em Manama e os Emirados Árabes Unidos anunciaram que iam retirar os seus diplomatas do Líbano, apelando aos seus cidadãos para não visitarem o país. Riad também impôs uma proibição geral sobre todas as importações vindas do Líbano, um passo acima da proibição de produtos agrícolas em vigor desde Abril, quando descobriu cinco milhões de anfetaminas escondidas entre romãs num navio no porto de Jidá.

Industriais libaneses que exportavam com frequência para a Arábia Saudita disseram à Al-Jazeera que a decisão de Outubro tinha sido mais um golpe para os negócios, apelando às autoridades libanesas para tentarem resolver a crise.

Num país que parece uma panela de pressão, onde a moeda desvalorizou a níveis dramáticos, falta água, electricidade, combustível, medicamentos e alimentos, há muito deixou de haver espaço para novas crises.

Kordahi sobreviveu no cargo pouco mais de um mês desde que os sauditas se queixaram do “insulto”. Na altura, a Liga Árabe apelou aos países do Golfo Pérsico para “reflectirem nas medidas propostas para [se] evitar mais efeitos negativos no colapso da economia libanesa”. De nada serviu.

Numa conferência de imprensa esta sexta-feira, o ex-ministro explicou que o primeiro-ministro lhe disse que a sua demissão era uma exigência do Presidente francês, Emmanuel Macron, para discutir a crise diplomática no encontro que terá este sábado com o príncipe herdeiro, e líder de facto, da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman.

“Não vou aceitar ser usado como motivo para prejudicar o Líbano e os nossos irmãos libaneses na Arábia Saudita e noutros países do Golfo”, disse o antigo apresentador da versão árabe do Quem Quer Ser Milionário. “O Líbano é mais importante do que George Kordahi e os interesses libaneses são mais importantes do que um cargo ministerial.”

O ministro demissionário também criticou a “campanha intencional” de vários políticos e media libaneses de que diz ter sido alvo. “Descreviam o que eu disse como um crime contra a Arábia Saudita”, afirmou. Korhadi recusara várias vezes demitir-se, mesmo depois de Mikati defender em público que o devia fazer, pedindo-lhe que ouvisse “a sua consciência” e tomasse “a posição que dê prioridade aos interesses nacionais”.

Tanto o seu partido, o Movimento Marada, como o partido (e milícia) xiita libanês Hezbollah o apoiavam – o líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah criticou a Arábia Saudita por tentar provocar conflitos internos no Líbano e violar a soberania do país. É precisamente a crescente influência do Hezbollah no poder em Beirute (e através destes, do seu aliado, o Irão) que tem afastado os países do Golfo, antigos aliados políticos e económicos, do Líbano.

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