Em Teerão brotam “ilhas de betão” da terra seca

O preço exorbitante das casas em Teerão "empurrou" as classes média e baixa para a periferia. E assim nasceram, em poucos anos, as 17 cidades-satélite que deveriam albergar 2,4 milhões de iranianos. O projecto falhou e grande parte destas cidades está ao abandono. A série fotográfica Bem-vindo ao Paraíso, do espanhol Manolo Espaliú, releva porquê.

©Manolo Espaliú
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“Bem-vindos ao paraíso”, apregoa o fotógrafo espanhol Manolo Espaliú, referindo-se à inóspita localidade de Pardis, a 17 quilómetros de Teerão. Pardis, que significa, “paradoxalmente, ‘paraíso’ em persa”, refere Espaliú em entrevista ao P3, é uma das 17 cidades que brotaram do solo árido dos arredores da capital do Irão, fruto de parceria público-privada, com o objectivo de alojar 2,4 milhões de famílias de classes média e baixa que deixaram de suportar o preço das casas na capital.

O programa habitacional Mehr, que arrancou em 2007, era um dos grandes projectos do presidente Mahmoud Ahmadinejad e tinha como principal objectivo inverter a tendência do fluxo de migração da população dos grandes centros urbanos para a periferia. “Teerão e arredores concentram 20 milhões de pessoas [num universo de 84 milhões no país] e o problema repete-se noutras grandes cidades”, salienta o fotógrafo. “Para criar as 17 novos centros urbanos, o Governo cedeu aos promotores terrenos para a construção de habitação acessível – cujos primeiros proprietários foram também ajudados pelo Estado.”

Embora plantadas em zonas profundamente áridas e isoladas, as novas casas prometiam ser acessíveis, confortáveis e estarem rodeadas de uma ampla gama de serviços, como transportes públicos, parques, hospitais, escolas, mesquitas. “Os apartamentos, aparentemente cómodos, foram construídos com materiais baratos, de fraca qualidade e apresentam inúmeros problemas. É uma cidade dormitório que tem pobre comunicação com Teerão.”

Apesar dos problemas e inconvenientes associados a estas moradas, de acordo com os censos realizados pelo país em 2016, mais de 77 mil pessoas residem em Pardis – muito aquém das 600 mil que lhe estavam, inicialmente, destinadas. Muitas das torres erigidas ainda permanecem vazias. “Este tipo de cidades são núcleos que se vão preenchendo, pouco a pouco, e que acabam por conseguir alcançar algum tipo de normalidade com o surgimento de mercados, mesquitas, lojas, escolas, etc.”, refere Espaliú. “Continuam a ser muito baratas e muita gente só consegue comprar casa ali devido aos preços exorbitantes que se praticam nas cidades.”

Pardis é um “paraíso” incompleto, no entanto, uma vez que praticamente metade dos edifícios ficou por terminar. “A altíssima taxa de inflação no Irão nos últimos anos, resultado do endurecimento das sanções internacionais [que resultaram da crise com os EUA, em 2018], transformaram essas construções em investimentos não rentáveis para os promotores, que abandonaram as construções a meio.” O mesmo acontece noutras cidades baseadas neste modelo, motivo pelo qual cerca de 200 mil habitações ficaram sem acesso a água, aquecimento ou saneamento básico.

As incursões do fotógrafo de 51 anos por território iraniano são frequentes. “Pouco depois dos atentados em Nova Iorque e em Madrid, comecei a visitar países muçulmanos porque o meu desconhecimento era total”, conta. “Queria perceber o que existia por detrás de tudo o que estava a acontecer. O Irão surpreendeu-me especialmente, e positivamente, porque se revelou completamente diferente daquilo que é dado a conhecer no exterior.” Apaixonou-se pelo país, pela cultura, pelas pessoas. “É fascinante, as pessoas que lá vivem transformam-no num destino surpreendente.” Além de fotografar arquitectura, Manolo Espaliú fotografa também património histórico. “E nesse sentido, o Irão é uma maravilha: há sempre algo para fotografar.”

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