Casa onde nasceu Almeida Garrett continua destruída dois anos após incêndio

Autarquia queria comprar o prédio, mas voltou atrás no negócio por achar preço de venda elevado. O edifício está classificado, mas desconhece-se a existência de planos para a sua recuperação.

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Casa sofreu um incêndio em 2019 e continua por recuperar Manuel Roberto

O piso térreo está entaipado, mas as janelas continuam abertas, expondo as feridas das chamas que há mais de dois anos consumiram o interior do prédio do Centro Histórico do Porto onde o escritor e político Almeida Garrett nasceu em 1799 e viveu até 1804. Sobra a fachada onde está, intacto, o brasão que a autarquia mandou gravar em 1862 em “memória do grande poeta”, como lá se lê. 

Hoje, o cenário não é muito diferente do que existia um dia após o incêndio, com a agravante das circunstâncias do tempo contribuírem para a deterioração do edifício. Desde Abril de 2019, nada foi feito para recuperar esta peça que faz parte do património histórico da cidade e do país.

A câmara chegou a mostrar interesse em comprar a casa que foi berço de Garrett. Na semana em que ardeu, após proposta da CDU que passou por unanimidade, a autarquia tinha anunciado querer adquirir o imóvel, propriedade de um privado, para ali criar um pólo do Museu do Liberalismo. Depois do incêndio essa intenção foi reforçada.

Só que alguns meses depois, esta proposta caiu por terra. Ao PÚBLICO, a câmara diz ter voltado atrás no negócio por não ter conseguido chegar a acordo com o proprietário, que pedia um valor acima da avaliação feita a pedido dos serviços camarários. Em causa estava a compra do edifício com o número 37 da Rua Doutor Barbosa de Castro e outros dois contíguos. A câmara diz que o resultado da avaliação atribuiu aos imóveis um valor a rondar 1,5 milhões de euros. O dono pedia 4 milhões pelos três prédios. Ficou sem efeito.

O prédio tem quatro andares e duas fachadas - uma está virada para a rua das Virtudes e a outra para a rua Doutor Barbosa de Castro. Em 2019, o incêndio que deixou dois bombeiros feridos, não afectou nenhum dos prédios vizinhos.

Sobra agora uma ferida aberta em pleno Centro Histórico. Numa rua de passagem para quem da antiga Cadeia da Relação, na Cordoaria - onde esteve preso Camilo Castelo Branco - quer chegar às Virtudes ou descer pelas Taipas para chegar ao mercado Ferreira Borges ou ao Palácio da Bolsa está agora mais um edifício devoluto sem qualquer sinal de uma recuperação para breve. 

Com a desistência deste negócio por parte da câmara surge uma incógnita relativamente ao futuro do edifício, sendo certo que o pólo do Museu do Liberalismo deixa de ser uma hipótese. Em 2019 especulava-se existir uma agência imobiliária interessada em transformar o edifício numa unidade hoteleira.

Contudo, a autarquia tem direito de preferência de compra no caso de venda e assegura existirem mecanismos para impedirem a sua destruição ou descaracterização. Isto porque a casa está em “zona de protecção de património”, uma protecção base que garante a configuração do mesmo ao nível da sua arquitectura e estética. Porém, a sua utilização fica à mercê dos interesses do proprietário. 

Este prédio está integrado no Conjunto e Imóvel de Valor Patrimonial correspondente ao Centro Histórico do Porto, Ponte Luiz I e Mosteiro da Serra do Pilar (classificado como Interesse Nacional ) e na Zona Histórica do Porto (classificado como Interesse Público). Mais de dois anos depois de a casa arder, para pouco ou nada tem servido esta protecção. Entretanto, o berço de Almeida Garrett continua entregue ao abandono e à espera de ser recuperado antes que o tempo ganhe terreno numa corrida que também tem o sector imobiliário a disputar a prova.

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