Tribunal liberta 37 arguidos do caso Hells Angels

Juízes consideraram não ser possível terminar o julgamento antes de ser atingido o prazo máximo da prisão domiciliária.

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Processo conta com 88 arguidos Reuters/Kai Pfaffenbach

O Tribunal de Loures decidiu esta segunda-feira libertar 37 arguidos implicados no caso Hells Angels que ainda estavam sujeitos à medida de coacção de prisão domiciliária à ordem do processo. Em causa está o facto de não ser possível terminar o julgamento antes de ser atingido o prazo máximo legal previsto para a duração desta medida de coacção, noticiou o Jornal de Notícias e confirmou o PÚBLICO junto de fonte judicial.

Estes arguidos passam assim a ficar sujeitos a apresentações semanais obrigatórias no posto de polícia da área da residência. Fora deste leque de suspeitos há dois que nunca estiveram em prisão domiciliária por terem residência no estrangeiro e um terceiro está sujeito a obrigação de permanência na habitação com pulseira electrónica à ordem de outro processo.

Neste caso, 88 arguidos respondem por tentativa de homicídio, associação criminosa, detenção de armas proibidas, extorsão e tráfico de droga. O processo teve origem num episódio de violência levada a cabo por dois grupos rivais em Março de 2018. Na sequência da criação em Portugal de uma filial da sua grande rival a nível internacional, a Los Bandidos, ligada a Mário Machado, os membros do ramo português dos Hells Angels muniram-se de martelos, tubos e bastões de ferro e madeira, correntes, machadas, soqueiras, bastões extensíveis e facas antes de rumarem ao restaurante Mesa do Prior, no Prior Velho. Do incidente resultaram seis feridos, três dos quais graves.

Durante a fase de instrução do processo, o Ministério Público pediu a ida a julgamento de todos os arguidos e deu como provado o ataque levado a cabo pelos arguidos no restaurante, bem como a perseguição movida por estes a Mário Machado, líder do movimento de extrema-direita Nova Ordem Social e que pertencia a um grupo motard rival.

A instrução do processo coube ao juiz Carlos Alexandre, que, em Outubro de 2020, confirmou em toda a linha a acusação do Ministério Público. Aliás, o magistrado judicial do Tribunal Central de Instrução Criminal sublinhou que “este conjunto de elementos assim agrupados não é um simples clube recreativo motard, mas um conjunto de pessoas que se organizam em moldes paramilitares ou semelhantes ao modo de actuação de uma milícia”.

“Qualquer pessoa pode ser motard ou não (...), mas para se fazer parte desta associação tem de se obedecer aos estatutos, o que implica obedecer às decisões do chapter ou charter, o que for, e mesmo que isso inclua, pasme-se, agressões/castigos (...), dos quais ninguém está a salvo”, acrescentou Carlos Alexandre no despacho de pronúncia.

Grupo liderado por mestre de artes marciais

Para o juiz ficou ainda claro quanto ao ataque em causa, que “a actuação de todos os arguidos, membros dos HAMC [Hells Angels Motorcycle Club] obedeceu a um processo de tomada de decisão e planeamento operacional, designadamente de recrutamento/convocatória dos membros e supporters [apoiantes] disponíveis, obtenção de armamento, vestuário de ‘camuflagem’, meios de transporte, definição de pontos de concentração e de tarefas durante o ataque, bem como de planeamento de fuga”.

O ramo português dos Hells Angels era na altura liderado por um mestre de artes marciais, que no ano passado já tinha ultrapassado os 70 anos, e que também é arguido no processo. Outro arguido é um antigo skinhead, conhecido pela alcunha de “Rambo”, que esteve envolvido nas agressões racistas ocorridas na noite em que morreu o cabo-verdiano Alcindo Monteiro em 1995, e alegadamente chefiava a filial da Margem Sul da mesma organização.

A operação policial que desmantelou este grupo ocorreu em Julho de 2018, a uma semana do habitual encontro anual de motociclistas em Faro. As autoridades temiam que aquele que é um dos maiores eventos do género da Europa, atraindo muitos milhares de pessoas, pudesse vir a servir de palco a novos confrontos entre os Hells Angels e o grupo de Mário Machado, que assumiu o nome de Red & Gold. Na operação visou as cinco filiais dos Hells Angels que existem de norte a sul do país, a Polícia Judiciária contou então com a colaboração da PSP, da GNR e ainda dos serviços secretos.

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