A Europa face ao muro

O que a Polónia pretende não é muito diferente daquilo que Trump mais ansiava. A Polónia pretende que Bruxelas pague a construção de um muro; Trump queria que o México fizesse o mesmo.

“A Europa está em perigo”, diz Joseph Borrell, alto-representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança da União Europeia (UE). A Europa está em perigo quer porque países como a Polónia e a Hungria são constantes ameaças à solidez do projecto europeu, quer porque os ciberataques, a desinformação e a pressão migratória se transformaram em persistentes tentativas de desagregar a união de 27 Estados-membros na sequência do pós-“Brexit”.

O que a Bielorrússia está a fazer, em retaliação pela União Europeia ter condenado o regime antidemocrático de Lukashenko, após a sua duvidosa reeleição e escandalosa detenção de um opositor, é o mesmo expediente escolhido por Marrocos ou pela Turquia para intimidar uma UE que tem nas suas fronteiras uma enorme fragilidade, que trata os migrantes como invasores, mas não como refugiados, e incapaz de responder a um problema humanitário.

Putin conseguiu destabilizar a Ucrânia, quando esta se quis aproximar da UE e da NATO. A fronteira da Bielorrússia com o território da UE é um pretexto eficaz para incomodar cirurgicamente países como a Polónia ou a Lituânia, com o recurso a um fluxo aéreo organizado a partir do Afeganistão, Iraque ou Síria.

Isso não passa de uma tentativa simultânea de minar a coesão europeia, aproveitando as divergências com a Polónia, e de incentivar a xenofobia mais básica com o desapego pelos valores mais humanistas. Minsk age como marioneta de Moscovo. Este é o jogo de Putin. É a táctica de quem não tem escrúpulos em explorar o desespero humano como arma de geopolítica.

O que a Polónia pretende não é muito diferente daquilo que Trump mais ansiava. A Polónia pretende que Bruxelas pague a construção de um muro; Trump queria que o México fizesse o mesmo. Não são os muros que travam o desespero de quem abandona tudo, dirigindo-se aos países ocidentais que recentemente andaram por Estados, como a Líbia ou a Síria, de onde fogem estas pessoas. Essa é a Europa de Salvini ou a de Morawiecki.

O problema da fronteira da Polónia não diz respeito só à Polónia, assim como os fluxos migratórios oriundos do Mediterrâneo não são um problema grego ou italiano. Borrell fala na criação de uma força militar de actuação rápida, Ursula von der Leyen na aplicação de mais uma dose de sanções, coordenada com a Administração Biden, e Charles Michel em actuar na origem para travar os motivos desta pressão migratória. Falta saber como. Esta Europa construiu-se a derrubar muros.

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