Igreja francesa vai vender bens ou recorrer a empréstimos para indemnizar vítimas de abusos sexuais

Comissão independente estima que mais de dois mil padres e outros membros do clero francês abusaram sexualmente de 200 mil menores entre 1950 e 2020. Incluindo leigos, o número ascende a mais de três mil abusadores e 300 mil vítimas.

Foto
Igreja francesa vai vender bens ou recorrer a empréstimos para indemnizar vítimas de abusos sexuais SARAH MEYSSONNIER/Reuters

Os bispos da Igreja Católica de França concordaram em vender bens imobiliários das dioceses ou em recorrer a “reservas de segurança” e empréstimos para indemnizar os milhares de vítimas de abusos sexuais perpetuados pelo clero. Nas compensações, a Conferência Episcopal de França (CEF) não vai usar dinheiro doado por fiéis.

 Os membros da Igreja estão sob crescente pressão para indemnizar as vítimas, depois de uma investigação ter confirmado a existência de milhares de casos de abusos de menores entre 1950 e 2020.

Segundo o diário Le Monde, será criado um organismo nacional independente para avaliar as queixas e acompanhar os processos, presidido pela advogada Marie Derain de Vaucresson, especializada na defesa dos direitos das crianças. Hugues de Woillemont, porta-voz da Conferência Episcopal de França (CEF), afirmou que todas as queixas e pedidos de indemnização serão analisados pelo novo organismo, incluindo os casos que remontam há várias décadas e que possam já ter prescrito.

“Vamos fornecer os meios financeiros [necessários] para cumprir esta missão (…) de indemnizar individualmente as vítimas”, disse Éric de Moulins-Beaufort, presidente da CEF, citado pela agência France-Presse (AFP), no final das reuniões entre os 120 membros da CEF para delinear uma acção de resposta aos resultados da investigação que, segundo Moulins-Beaufort, denunciou um “fenómeno em massa” de abusos sexuais a menores, muitas vezes encobertos por um “véu de sigilo”. As reuniões decorreram em Lourdes, no sul de França.

Éric de Moulins-Beaufort afirmou ainda que as decisões tomadas, esta segunda-feira, pela CEF são um marco “decisivo” e fazem parte de “um vasto programa para a renovação das práticas de governança ao nível das dioceses e da Igreja [Católica] em França”.

A comissão responsável pela investigação exortou a Igreja Católica francesa a indemnizar as vítimas com os seus próprios bens, em vez de solicitar aos paroquianos que fizessem doações para compensar as vítimas de crimes cometidos pelo clero.

A Igreja Católica tinha já prometido criar um fundo para começar a indemnizar as vítimas no próximo ano. Este fundo será agora reforçado através da venda de bens imóveis pertencentes à CEF e às dioceses, explicou Moulins-Beaufort. O presidente da CEF garantiu também que, caso seja necessário, será pedido um empréstimo aos bancos para proceder às indemnizações e que será solicitado ao Vaticano que envie um observador para acompanhar este processo.

Dezenas de milhões de euros

O relatório da comissão independente estima que mais de dois mil padres e outros membros do clero francês abusaram sexualmente de 200 mil menores entre 1950 e 2020. Incluindo leigos, o número ascende a mais de três mil abusadores e 300 mil vítimas.

Na sexta-feira, os bispos franceses reconheceram formalmente, pela primeira vez, que a Igreja tinha uma “responsabilidade institucional” pelos abusos e alguns membros do clero ajoelharam-se durante uma oração, no sábado, numa demonstração de penitência. Porém, segundo a AFP, as associações de defesa dos direitos das vítimas afirmaram que as palavras de arrependimento não são suficientes e exigem indemnizações que poderão custar à Igreja Católica dezenas de milhões de euros.

A CEF também pretende levar a cabo outras medidas para prevenir os abusos sexuais na Igreja e garantir que os padres infractores são julgados, embora possa ser necessária uma autorização do Vaticano para implementar algumas destas medidas.

Sugerir correcção
Comentar