O seu filho urina na cama? Não lhe chame bebé!

Para haver um diagnóstico de enurese, os episódios não podem ser explicados pelo uso de uma substância diurética ou devido a uma condição médica. A enurese diurna é mais prevalecente nas raparigas e a nocturna é mais prevalecente nos rapazes.

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Algumas crianças com esta perturbação apresentam outras associadas, como os atrasos do desenvolvimento, da fala, da linguagem e da aprendizagem @petercalheiros

Para algumas crianças, controlar os esfíncteres pode revelar-se um processo demorado. Não obstante, há um impacto significativo no bem-estar, na vida social, no comportamento e na relação da criança com os seus pais que pode culminar em forte irritação e agressão física e verbal, sendo urgente quebrar o ciclo negativo que daí advém.

A enurese é classificada em três tipos — nocturna, diurna ou mista —, e definida como a emissão repetida de urina pela criança na cama ou na roupa, na maior parte das vezes de forma involuntária. Estes episódios acontecem pelo menos duas vezes por semana, durante, no mínimo, três meses consecutivos, numa idade em que já não é esperado, ou seja, a partir dos cinco anos, podendo prolongar-se até ao início da adolescência. Para haver um diagnóstico de enurese, os episódios não podem ser explicados pelo uso de uma substância diurética ou devido a uma condição médica. A enurese diurna é mais prevalecente nas raparigas e a nocturna é mais prevalecente nos rapazes.

A enurese resulta, geralmente, de diversos factores isolados ou em combinação, de natureza ambiental, genética e fisiológica, como uma capacidade funcional da bexiga reduzida, a imaturidade da criança, o adiar da micção e um atraso ou negligência no treino do controlo dos esfíncteres.

Algumas crianças que apresentam enurese diurna podem ser sensíveis a aspectos relacionados com as casas de banho, como os sons e os odores, e à privacidade, interferindo com a micção. Ou seja, sentem-se envergonhadas por usarem a casa de banho da escola ou querem despachar-se rapidamente e acabam por não esvaziar totalmente a bexiga.

Importa referir que algumas crianças com esta perturbação apresentam outras associadas, como os atrasos do desenvolvimento, da fala, da linguagem e da aprendizagem.

Como consequência da enurese, pode surgir na criança ansiedade, insónia e isolamento social, dado que deixa de querer dormir fora de casa e, quando os incidentes acontecem durante o dia, os colegas podem tornar-se críticos e afastarem-se. A acrescentar a estas dificuldades com os colegas, a presença de enurese acarreta também mudanças na rotina da família, apresentando-se como um factor de conflito em casa. Num misto de irritação extrema e da tentativa de resolver o problema, podem surgir comportamentos agressivos e críticas pelos pais que incluem palavrões ou alcunhas menos apropriadas, como “porco” ou “bebé”, que, naturalmente, causam humilhação e afectam o bem-estar emocional da criança. Não raras vezes, as crianças escondem sintomas e/ou roupas sujas para evitar o confronto, mas quando são descobertas são alvo de críticas ainda maiores.

Muitos profissionais de saúde e professores, mesmo que bem-intencionados, não têm conhecimento suficiente para perceber os sintomas e as mudanças comportamentais na criança e não sabem como lidar com eles, podendo revelar-se críticos também. Infelizmente, ainda existe a crença de que se a criança for exposta ao ridículo à frente dos outros vai ficar com vergonha e parar o comportamento, mas, naturalmente, esta ideia não só é absurda, mas também totalmente contraproducente, podendo causar na criança baixa auto-estima, insegurança, ansiedade e até dificuldades na aprendizagem.

O que é que os pais podem fazer?

O tratamento deve incluir medidas educativas comportamentais e, em alguns casos, farmacológicas. Uma abordagem multidisciplinar é importante, a fim de minorar o impacto negativo na vida familiar, escolar e na auto-estima da criança. Os pais devem consultar o pediatra e um psicólogo de modo a começar uma intervenção acompanhada.

Existem programas de treino específicos que envolvem a criança e os pais na sua prática como o treino de retenção da urina, as recompensas e o esvaziamento total da bexiga. Algumas das estratégias aqui indicadas poderão servir de ajuda numa fase inicial.

  • Não compare a criança com as outras; cada uma tem o seu ritmo que deve ser respeitado.
  • A atitude dos pais é fundamental. Mostre que confia no seu filho para resolver esta situação e cumpra o plano adequado à sua idade. Este deve ser claro sobre o que a criança deve fazer. Por exemplo, lavar-se, mudar de roupa, fazer o treino de esvaziamento da bexiga.
  • Para esvaziar totalmente a bexiga, a criança deverá: urinar, contar até dez e voltar a urinar. Este treino, feito de forma sistemática, tem-se revelado eficaz.
  • Não associe a ida à sanita com aparelhos e jogos electrónicos.
  • A criança deve ser reforçada verbalmente pelos seus esforços e envolvida na sua higiene e na arrumação das roupas sujas, sem acusações ou sermões.
  • Durante o dia, a criança deve aumentar a ingestão de água, mas à noite deverá ser feita a redução de líquidos uma hora antes de ir para a cama.
  • Estabeleça uma rotina regular de idas à casa de banho da criança, com duas horas de intervalo e com o esvaziamento total da bexiga. Se for preciso, use um lembrete.
  • Algumas crianças podem precisar de urinar a meio da noite, sendo definido o horário de acordar mediante a hora de deitar, geralmente, uma hora e meia depois. A opção de acordar ou não a criança para ir à casa de banho deve ser discutida com o especialista que a está a acompanhar, dado que poderá interferir com o seu sono.
  • O alarme de urina pode ser uma ferramenta útil para algumas crianças.

Lembre-se de que o seu filho nunca deve ser acusado ou humilhado. Caso sinta que está a perder a paciência, saia de perto da criança e peça a outra pessoa para resolver a situação. Quanto mais tranquilidade e confiança lhe transmitir, mais fácil será.

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