Como posso identificar e combater o greenwashing?

Perguntamos a quem sabe, para a série “Quem sabe responde”. Desta vez, e tendo como mote a COP26, questionamos especialistas acerca de mitos, conceitos ou ideias relacionados com o clima e o ambiente. Ricardo António espreita por detrás da camuflagem “verde”: o greenwashing.

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É a cor do momento: todos querem ser “verdes”. Mas, como todas as modas, não fica bem a toda a gente. Páginas de Instagram de petrolíferas com jovens sorridentes na natureza, anúncios que saem da equipa de marketing ou financiamentos esporádicos a organizações pelo clima são práticas consideradas greenwashing pelos investigadores e activistas que sabem os esforços necessários para se ser verdadeiramente eco” ou “amigo do ambiente”. Dica: não basta trocar o plástico descartável por um qualquer bioplástico. Falamos com o doutorando em Alterações Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável, Ricardo António, para saber quando é que é mesmo verde — ou uma perigosa camuflagem. Em resumo: frases demasiado eco-inspiracionais e falta de evidências? Foge. Ou, como Greta Thunberg começou a dizer nas vésperas da COP26, “chega de bla bla bla”.

O que é o greenwashing?

Greenwashing é quando uma empresa, uma entidade, uma organização, divulga ou promove práticas ambientais como sendo suas e positivas quando a sua actuação efectiva e a sua gestão é exactamente contrária e, na prática, é prejudicial aos interesses ambientais e ao desenvolvimento sustentável.

Há diferentes tipos de greenwashing. Nem todos têm uma perversidade subjacente normalmente têm. Gera-se um ruído quando uma empresa ou uma instituição comunica que é verde, mas não tem rigorosamente nada que suporte esta afirmação. Depois, há um greenwashing que não é ruído, mas que também não tem conteúdo. É uma empresa ou entidade que comunica que é verde e, à primeira vista, parece que as práticas estão em linha com isso, mas quando investigas verificas que não é verdade. Depois, tens greenwashing feito por má orientação, ou falta de conhecimento. Quando uma empresa que até está a fazer um caminho bom na busca de novos produtos, funções ou serviços mais verdes, não centra a sua comunicação nos benefícios reais que já consegue materializar, mas comunica no seu todo. Isto é comunicação gananciosa.”

Porque é que, além de enganador, também pode ser perigoso?

Primeiro, porque a actividade da empresa está realmente a contribuir para danos e é prejudicial ao ambiente. Depois, o verdadeiro e grande perigo é que descredibiliza​ não só aquela empresa, mas todo o sector ou a maioria das iniciativas feitas em linha de um meio ambiente mais protegido. Ou seja, as pessoas tendem a tomar essa pequena parte pelo todo. Esse esforço que o consumidor pensa que está a fazer, ao comprar um produto ambientalmente saudável, depois descobre que não o é e recuperar essa confiança é muito mais difícil. Também atrasa em muito o desenvolvimento e o investimento de empresas em produtos ou serviços ambientalmente correctos. Para além disso, o tempo que se gasta na fiscalização e na filtragem do greenwashing poderia ser muito melhor aplicado em actividades com um impacto mais proveitoso.”

Como saber quando um anúncio, medida ou publicidade é greenwashing e não acção climática? O que levanta suspeitas?

Utilização de uma linguagem demasiado ‘fofinha' —​ ou vaga, como eco friendly. Red flag número 1. Produtos verdes que são feitos por companhias não muito verdes. Dou exemplos: lâmpadas eficientes feitas em fábricas que poluem rios (e usam mão de obra mal paga). Imagens que tentam justificar o injustificável, como ter flores a sair de um tubo de escape de um veículo movido a gasóleo ou gasolina (só porque tem uma produção ligeiramente menos danosa). Afirmações que são mais ou menos irrelevantes e põem a ênfase num pequeno atributo verde do produto, quando a maior parte não o é (como a própria embalagem).

Empresas cujo lucro advém maioritariamente de actividades nocivas ao planeta devem divulgar práticas ambientais positivas?

“Eu diria que sim, mas não sendo a comunicação principal. Ou seja, o foco não deve ser nas práticas ambientais positivas, mas sim no seu propósito e compromisso de melhoria, até alterar as suas práticas de produção nocivas para formas de produção ambientalmente e socialmente (dois conceitos que não se podem dissociar) correctas. O foco deve estar nesse compromisso e esse compromisso materializado em evolução quantificável. E quando consegue atingir esse compromisso, então porque não comunicá-lo, juntamente com metas mais ambiciosas? Centrar a comunicação num pequeno ganho ambiental, quando tudo o resto é mau, é que é uma das red flags da pergunta anterior.”

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