Alterações climáticas

Os rostos de quem sofre com o clima não são só humanos: “Vivemos todos na mesma casa”

Alice, Stanley e Najin, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
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Alice, Stanley e Najin, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London

Ser fotógrafo de ambiente no planeta de hoje significa que é impossível “ignorar as alterações climáticas”. Nick Brandt já teve de “lidar com a destruição de habitats e perda de biodiversidade”. Ossos do ofício, podemos chamar-lhes. Mas, agora que “a destruição deste pequeno planeta rapidamente se torna mais e mais apocalíptica”, tornou-se obrigatório retratar, mais do que nunca, as alterações climáticas — ou, como prefere chamar-lhe, “o colapso climático, o caos climático”.

Foi com base nesta ideia de urgência que, antes da pandemia, decidiu começar um projecto na Califórnia, onde vive, relacionado “com fogos florestais e animais resgatados”. Por motivos logísticos, no entanto, o projecto acabou por não acontecer (mas não saiu da lista de desejos do fotógrafo). Não conformado, procurou terras mais distantes: “O Quénia e o Zimbabwe estavam abertos a visitantes na altura em que pretendia fotografar (em Novembro de 2020). A minha esperança é tentar de novo na Califórnia e na América do Sul na próxima Primavera”, escreve ao P3.

Foi, então, nos dois países africanos que investigadores procuraram “pessoas severamente afectadas pelas alterações climáticas”. E animais também. No Quénia, encontraram pessoas que tiveram se de mudar para outra cidade depois de “perderem as suas quintas, casas e locais onde cresceram, devido a secas severas e cheias intensificadas pelas alterações climáticas”. Passou cerca de dez dias com as pessoas que retratou, descobriu que “todos os dias precisava de experimentar e ver que pessoa funcionava melhor com cada animal” — uma vez que eram fotografados juntos, nos cinco santuários onde os animais habitam, depois de sofrido por “caça furtiva dos seus progenitores, destruição de habitats, envenenamento”. E ninguém tinha medo dos elefantes ou dos rinocerontes que surgem nas imagens: “As pessoas estavam sempre calmas, graciosas e pacientes ao serem fotografadas tão perto dos animais, porque os animais estão habituados e são bem tratados pelos tratadores — e também por nós”, refere.

Ainda que habituado a captar as alterações climáticas, esta foi a primeira vez em que “as pessoas foram o foco literal” das suas fotografias. “Senti obrigação de mostrar a sua tristeza, vidas impactadas pelas alterações climáticas — e, ainda assim, apresentá-las com dignidade”, afirma. Acima de tudo, conseguir mostrar que “ali existe esperança e possibilidade”. Para isso, deixou-as “ser elas próprias”: “Cada dia chegava ao local sabendo apenas quais os animais que ia fotografar nesse dia e, talvez, que acessório ia usar, como o escadote”, conta. Depois via, “instintivamente”, quem funcionava melhor com cada animal. A partir daí, só tinha de descobrir “como deixar as pessoas à vontade” e deixar rolar: “O que acontece inesperadamente, espontaneamente, é melhor do que o que eu imagino.”

O maior desafio foi o tempo, assegura. No Zimbabwe, passou por “três semanas de extremo calor e sol, baixa humidade e ventos secos”. Nessa altura, o trabalho dificultou: o nevoeiro que se vê em todas as imagens era quase inexistente, evaporava imediatamente. Apenas era possível fotografar 30 minutos antes de o Sol nascer e 30 minutos depois de se pôr. “Surpreendentemente, os animais eram tão calmos e cooperativos que isso era tempo suficiente.”

É precisamente o nevoeiro que une todas as imagens e que lhes dá sentido e significado: “Cada vez mais nos encontramos num limbo, num mundo que outrora conhecemos e agora desvanece rapidamente”, explica Nick. É também uma alusão aos “incêndios florestais, intensificados pelas alterações climáticas, que varrem o nosso planeta”. E é para mostrar que “vivemos todos na mesma casa”, estamos todos “ligados nesta crise sem precedentes”. “Partilhamos todos o mesmo destino.”

Fatuma, Ali e Bupa, Quénia
Fatuma, Ali e Bupa, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Halima, Abdul e Frida, Quénia
Halima, Abdul e Frida, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
James e Fatu, Quénia
James e Fatu, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
John e Mak, Zimbabwe
John e Mak, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Luckness, Winnie e Kura, Zimbabwe
Luckness, Winnie e Kura, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Najin e pessoas na névoa, Quénia
Najin e pessoas na névoa, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
James, Peter e Najin, Quénia
James, Peter e Najin, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Patrick e flamingos, Zimbabwe
Patrick e flamingos, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Regina, Jack Levi e Diesel, Zimbabwe
Regina, Jack Levi e Diesel, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Richard e Grace, Zimbabwe
Richard e Grace, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Richard e Sky, Zimbabwe
Richard e Sky, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Thomas e Vincent, Zimbabwe
Thomas e Vincent, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Zainab com a mãe, Miriam, e Najin, Quénia
Zainab com a mãe, Miriam, e Najin, Quénia © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Patrick e Harriet, Zimbabwe
Patrick e Harriet, Zimbabwe © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London
Making of das fotografias
Making of das fotografias © Nick Brandt, Courtesy of Atlas Gallery, London