Comissão relança consulta pública para a revisão das regras orçamentais

Executivo pede aos Estados-membros e outros actores institucionais que avancem sugestões e propostas para a quadratura do círculo da governação económica: reduzir o défice a dívida sem cortar no investimento ou comprometer o crescimento.

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Paolo Gentiloni e Valdis Dombrovskis na conferência de imprensa desta terça-feira Reuters/POOL

A Comissão Europeia deu esta terça-feira o tiro de partida para a revisão das regras de governação económica da UE, com a apresentação de uma comunicação que identifica uma dezena de questões a que os Estados-membros e outros actores institucionais devem responder até ao próximo dia 31 de Dezembro, para que no início do próximo ano o executivo possa estar em condições de avançar uma “proposta de consenso” para eventuais mudanças no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC).

Recorde-se que está previsto que a cláusula geral de escape do PEC, que suspendeu a aplicação das metas quantitativas para o défice e a dívida, deixe de vigorar a partir de 2023. Mas a Comissão reconhece que dificilmente poderá aplicar as regras da disciplina orçamental tal como antes da pandemia: a crise da covid-19 levou a uma contracção sem precedentes da actividade económica, que interrompeu a trajectória de correcção dos desequilíbrios macroeconómicos e acentuou as divergências entre os Estados-membros.

O objectivo da Comissão, com o relançamento do debate público para a revisão das regras que enquadram os exercícios orçamentais dos Estados-membros nesta altura, é recolher informação para poder orientar os países na preparação dos seus exercícios, bem como dos respectivos programas nacionais de estabilidade e crescimento de 2023, antes da desactivação da cláusula de escape.

“Estas orientações reflectirão a situação económica mundial, a situação específica de cada Estado-membro e o debate sobre a coordenação das políticas orçamentais e a eficácia e transparência do quadro de governação e supervisão económica da UE”, explicou o vice-presidente executivo da Comissão responsável pela pasta da “Economia ao serviço das pessoas”, Valdis Dombrovskis.

Bruxelas também quer perceber qual é o mínimo denominador comum para as modificações do PEC. “As mudanças são precisas”, sublinhou o comissário da Economia, Paolo Gentiloni, salientando que, não só as questões que justificaram a abertura de uma consulta pública para revisão do pacto, em Fevereiro 2020, “não se tornaram irrelevantes”, como “os novos desafios” resultantes da crise da covid-19 tornaram esse processo “mais exigente”. “Após o choque sem precedentes do ano passado, precisamos agora de garantir que o nosso crescimento futuro é sustentado e sustentável”, vincou.

Numa conferência de imprensa após a reunião do colégio de comissários, no Parlamento Europeu de Estrasburgo, tanto Gentiloni como Dombrovskis apontaram o aumento dos défices e da dívida como o grande desafio. Mas nenhum dos dois quis oferecer soluções para atacar o problema: por enquanto, o propósito da Comissão é “ouvir opiniões e ideias”, a fim de “criar consensos”.

Não será tarefa fácil: os Estados-membros continuam profundamente divididos, com alguns governos a avisar que não aceitam mexer numa vírgula que seja do PEC, e outros a prever que as regras que não funcionaram no passado também não funcionarão no futuro.

“Estamos a relançar a análise sobre a nossa governação económica num contexto de enormes necessidades de investimento, à medida que a emergência climática se vai agravando, e também de elevado nível de endividamento, por causa do forte apoio orçamental prestado durante a pandemia. Estas dificuldades fazem com que seja ainda mais essencial dispor de um quadro orçamental transparente e eficaz”, justificou Gentiloni.

Apesar de não terem propostas concretas para anunciar, os dois responsáveis deixaram algumas pistas sobre a direcção do debate (e da acção da Comissão) nos próximos meses. Na sua comunicação, o executivo identifica e enquadra os desafios que se vão colocar quando o PEC voltar a ser aplicado, desde logo a dificuldade de conjugar a necessidade de redução da dívida com a promoção do crescimento e a sustentabilidade das contas públicas.

Mas em vez de uma alteração das metas quantitativas — que limitam o défice a 3% do valor do PIB e a dívida a 60% — é de esperar que Bruxelas concentre a atenção numa revisão dos mecanismos que permitem apoiar o investimento público, ou que determinam o ritmo para a redução do nível de endividamento ou o esforço de consolidação orçamental anual de cada Estado-membro.

De resto, a Comissão quer reflectir sobre a simplificação das regras orçamentais. Segundo uma fonte do executivo, há duas abordagens possíveis: deixar toda a regulamentação no nível da UE, ou delegar alguma responsabilidade aos Estados-membros.

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