Refugiados LGBT afegãos: o desespero de uns e a inacção de outros

A Human Rights Campaign estima que existam no Afeganistão meio milhão de pessoas LGBTQI+, mas alerta também que este número não é de todo preciso porque são muitos os que escondem a sua identidade de género e a sua sexualidade. Estas pessoas irão tentar procurar refúgio noutros países.

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Após 20 anos de intervenção estrangeira no território afegão, os taliban tomaram de novo o controlo sobre o território. Nos dias que se seguiram foram várias as imagens que circularam alertando para um retrocesso civilizacional de 20 anos na questão de direitos humanos. Ora, os direitos das pessoas LGBTQI+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero, queer, intersexo e outras identidades) não foram excepção.

Apesar de ainda não ter sido anunciada a punição que o novo Governo taliban irá impor sobre a homossexualidade, o juiz taliban Gul Rahim veio dizer que “só existem duas punições possíveis: ou apedrejamento, ou ele deve ficar em pé atrás de um muro que irá cair em cima dele.”

A Human Rights Campaign estima que existam no Afeganistão meio milhão de pessoas LGBTQI+, mas alerta também que este número não é de todo preciso porque são muitos os que escondem a sua identidade de género e a sua sexualidade

Considerando as rotas terrestres, estas pessoas irão tentar procurar refúgio nos países vizinhos do Afeganistão. De acordo com o site Statista, os países vizinhos do Afeganistão que mais recebem refugiados afegãos são o Paquistão (1.438.000) e o Irão (780.000). Contudo, devemos também considerar a situação das pessoas LGBTQI+ nesses países. De acordo com a legislação em vigor, nenhum dos estados vizinhos do Afeganistão respeita completamente os seus direitos, sendo que no Paquistão e no Irão ainda se aplica a pena de morte aos homossexuais. Logo, a única fuga possível são as rotas aéreas.

Para um refugiado afegão viajar para outro país por via aérea, tem de requerer um visto. Deve-se também notar que cada país estabelece os critérios para aceitação e recusa de determinadas características como “motivos” para se ser considerado refugiado no país de destino.

Aquando da euforia e desespero da população afegã e da comunidade internacional, vários países ocidentais criaram critérios específicos para a aceitação de determinadas pessoas como refugiados afegãos com “vulnerabilidade especial” - as chamadas protected persons -, das quais se destacam ex-colaboradores da NATO e mulheres. Seguindo a definição de “vulnerabilidade especial” que estes países aplicam, estas pessoas devem ter uma forte possibilidade de verem os seus direitos violados e de serem vítimas de perseguição. Ora, considerando todas as indicações dadas pelos taliban, também as pessoas LGBTQI+ deveriam ser incluídas nesta categoria de protected persons.

Quanto à União Europeia, a situação é mais delicada, mas não menos preocupante. Por um lado, temos uma UE em crise. Uma “crise de valores”, que se compreende pelas violações de direitos fundamentais e do Estado de Direito na Polónia e na Hungria, e uma crise de refugiados, que se perpetua desde 2015.

Por outro lado, temos uma UE na vanguarda da defesa dos direitos LGBTQI+ que se constata pela declaração da União Europeia como uma “LGBT freedom zone. Temos assim uma UE com um conflito interno que acaba por prejudicar ainda mais uma situação frágil como a da comunidade LGBTQI+ que busca uma forma de fugir à opressão e ao risco de morte que vive no Afeganistão.

Em suma, apesar dos desafios internos, e tendo em conta que durante 20 anos os países da UE e da NATO tiveram a defender a construção de uma sociedade democrática no Afeganistão, a União Europeia deveria continuar a zelar pelos direitos das pessoas à volta do mundo, em particular das pessoas mais marginalizadas como as pessoas LGBTQI+ no Afeganistão.

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