Uma Volta a França para gregos e troianos

A organização do Tour desvendou nesta quinta-feira o percurso oficial da corrida gaulesa, voltando a desenhar uma rota bastante equilibrada, entre a Dinamarca e Paris, de 1 a 24 de Julho.

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Mark Cavendish e Julian Alaphilippe na apresentação do percurso Reuters/GONZALO FUENTES

A Volta a França 2022 não vai, no plano teórico, excluir ciclistas com base no percurso. Trocado por miúdos, quer isto dizer que a rota é muito variada e que pode agradar a gregos e troianos – ou, na gíria do ciclismo, a trepadores, contra-relogistas e sprinters.

A organização do Tour desvendou nesta quinta-feira o percurso oficial da corrida gaulesa, voltando a desenhar uma rota muito dura, mas até bastante equilibrada, entre a Dinamarca e Paris, de 1 a 24 de Julho.

Os trepadores puros poderão esfregar as mãos por terem cinco chegadas em alto, mais três do que em 2021 – bem como o regresso da mítica subida ao Alpe d’Huez, quatro anos depois –, mas ficarão de “sorriso amarelo” ao verem que terão de correr 53 quilómetros de contra-relógio, divididos por duas etapas (a primeira e a penúltima).

Por outras palavras, quer isto dizer que os mais satisfeitos serão, como sempre, os voltistas versáteis, que prosperam nos “cronos” e seguem confortáveis nas montanhas. 

Está desenhada, portanto, uma rota que proporciona mais um duelo entre Tadej Pogacar e Primoz Roglic, um confronto esloveno que deu espectáculo em 2019, mas que ficou “na gaveta” em 2020, com o abandono de Roglic. Também ciclistas como Remco Evenepoel ou Geraint Thomas, assim permitam a juventude de um e a veterania do outro, poderão sorrir com este percurso.

Já quem só gosta de subir ou quem só gosta de correr contra o relógio terá muitas dificuldades – falamos de nomes como Carapaz, Yates ou Landa, mas também do próprio Egan Bernal, com altos e baixos em matéria de contra-relógio. E todos eles terão de atacar muito entre as etapas 2 e 19, já que a organização, de forma astuta, não colocou o contra-relógio mais longo, o de 40 quilómetros, numa fase precoce da corrida, podendo “matá-la” muito cedo.

Também os sprinters poderão estar satisfeitos, já que terão cinco ou mesmo seis oportunidades para ganharem em etapas planas, ainda que algumas delas sejam traiçoeiras, pelo vento.

Almeida gostaria deste Tour

Há, depois, dois detalhes interessantes. Um deles remete para a existência de três dias de descanso, algo que não acontecia há quase 30 anos. Na altura, em 1993, houve um primeiro dia de descanso e, mais tarde, um período de dois dias consecutivos sem corrida. Para encontrar três dias de pausa em fases diferentes da corrida é preciso ir ainda mais atrás, até 1987. Quem pior reage aos dias sem etapa tem, portanto, um desafio a mais para superar.

O outro detalhe curioso – e este com impacto claro na corrida – é o regresso do pavé, numa etapa ao estilo Paris-Roubaix. Ao quinto dia, serão 11 sectores de empedrado em estradas com piso irregular e zonas de terra batida, um desenho que provocará, por certo, muito caos no pelotão.

E esta primeira semana de prova, com etapas ventosas junto à costa, na Dinamarca, e com o dia do pavé, poderá definir-se como uma semana em que ninguém ganhará o Tour, mas muitos poderão perdê-lo.

Para o grande nome do ciclismo nacional este seria um percurso interessante. João Almeida, sempre sedento de muito contra-relógio, teria vários quilómetros para fazer valer essa força, dispondo, depois, de várias subidas longas e constantes – ao contrário da Volta a Itália, que por norma tem escaladas mais explosivas, que vão menos ao encontro dos predicados do português.

Este Tour tem, ainda, muitas etapas para os chamados puncheurs, com subidas não muito duras e indicadas para ciclistas ofensivos no final das etapas, como é Almeida.

Acontece, porém, que é improvável vermos o português no Tour, já que a mudança para a equipa Emirates o colocará atrás do bicampeão Pogacar na hierarquia para a prova francesa.

Resta a Almeida esperar pelo anúncio do percurso do Giro e rezar para que seja uma corrida mais à imagem de 2020 (65 quilómetros de “crono”) do que 2021 (apenas 38 quilómetros).

Primeira edição feminina

A cerimónia de anúncio do percurso do Tour teve também um peso considerável da prova feminina. A primeira edição da corrida do sector feminino foi tratada com a mesma relevância da masculina e terá o simbolismo de ter a primeira etapa a partir da Torre Eiffel e a ser corrida num circuito nos Campos Elísios, onde terminará, como é tradição, a prova masculina.

O Tour feminino, mais curto do que o masculino, com oito etapas, será corrido de 24 a 31 de Julho, com alguma montanha e, para este primeiro ano, sem contra-relógio.

Haverá duas etapas de montanha pura, outras duas de média-montanha – uma com sectores de gravilha e terra batida – e quatro dias mais planos, para finais ao sprint ou fugas.

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